O INFERNO CONTEMPORÂNEO

O inferno são os outros que não veem o que está "Submerso nas águas vermelhas como sangue da lagoa que não reflete as estrelas." Para não cair no inferno da ignorância, as pessoas, à semelhança dos Antigos pescadores que aprenderam a navegar no encontro das águas frias e quentes ode os peixes pequenos são presas fáceis para os grandes e onde os pescadores podem apanhar todas as espécies, devem mergulhar para ver sob a superfície das águas, a pequena bolsa de Pandora , a caixa de acrílico onde o vírus letal que pode destruir mais da metade da vida do planeta acha-se contido.

Lasciate ogne speranza, voi ch'intrate. Quem pela porta da leitura ingressa para renegar o inferno da ignorância, sabe que deve jogar fora tudo em que confia, pois o principio e o fim é desconfiar, desconfiar, desconfiar. Subir a ladeira da caverna em busca de luz.

Reneguemos o inferno. Dan Brown é um desses autores de best-sellers de estilo próprio que assina as obras com uma caligrafia que se mantém e influencia embora se torne refém do próprio sucesso, já que a cada nova história replica a velha fórmula - o que, inevitavelmente, provoca um certo desgaste. É o que acontece com Inferno, quarta aventura literária estrelada pelo simbologista Robert Langdon e terceira a ser adaptada para as telonas. Inferno é irmão siamês de O Código Da Vinci, também envolto numa intrincada trama envolvendo mistérios históricos e obras de arte. Desta vez o pano de fundo é A Divina Comédia, de Dante Alighieri. Aproximando o enredo do mundo real, o inferno é um vírus indutor de letal epidemia, tipo peste negra, com capacidade, a partir da propagação em poucas horas, de diminuir drasticamente a população na Terra.

Minha surpresa inicial, diante do filme, foi ter revelado que o trabalho de Dante mudou a estrutura de crenças em torno do que seja céu e inferno e que os diferentes "reinos" delineados por Dante já estavam presentes em tradições anteriores. Mas desvendar o inferno da teologia rabínica judaica ou cristão nunca fez parte de minhas obsessões, mesmo porque o Google, ao modo dos blockbusters americanos, entrega todas as versões do reino do mal mastigadas ao interessado, de forma que ele não tenha sequer trabalho de raciocinar.

A comparação que me interessa depreendida da assistência ao filme foi a do interesse do bilionário americano Bertram Zobrist, de fazer desaparecer metade da população da terra para que a outra metade sobreviva usufruindo o bem estar que a natureza produz e o sistema capitalista. Para ele Todas as doenças que assolam a Terra podem ser associadas à superpopulação humana. E não seria essa a justificação capitalista para os desmazelos atuais da humanidade?

Pois é. Se você também percebeu que a situação retratada por Dan Brown e levada às telonas por Ron Howard com Tom Hanks fundamenta o modelo neoliberal da economia mundial e também no Brasil, sua cabeça tem por ornamento uma auréola de compreensão que o afasta dos nove ciclos do inferno dantesco da ignorância.

O inferno moderno, contemporâneo é o capitalismo e o vírus, as medidas econômicas neoliberais que, para permitir que o capitalismo triunfe e os sectários usufruam das benesses, é necessário que se mantenha à margem do consumo e, portanto mortos em vida, um terço da população mundial. Por que não fazemos alguma coisa? E encarnando o espírito do Dr. Robert Langdon não salvamos a humanidade eo país desse maquiavélico plano elaborado pelos Estados Unidos que se representam no vilão da história, a besta capitalista Bertram Zobrist?

Não concorda? Mesmo assim, não me mande para o inferno, o teológico, pois lá o ferrabrás não gosta de pensadores, por temer a concorrência. E do inferno da ignorância todos os dias procuro afastar-me com o credo do aprimoramento de conhecimentos para poder desvendar que o inferno da sentença de Paul Sartre é o ambiente e as situações que não entendemos. Situações, uma delas bem igual à provocada pelo capitalismo e pelo neoliberalismo, força letal capaz de dizimar populações inteiras.