A Lenda de Kafra

A Lenda de Kafra do Fim do Século 17

Esta é uma lenda transmitida entre as funcionárias da Corporação Kafra desde tempos remotos.

A vila montanhosa de Payon estava sendo assolada por terríveis ataques de monstros

desde que o escudo mágico que a protegia foi quebrado, depois que a Corporação Kafra fechou

sua filial na cidade. A maior parte das casas e campos foram arruinados, e

somente alguns idosos fracos demais para fugirem permaneceram ali. Eles perderam a vontade de

viver, e simplesmente ficaram sentados no chão, esperando a morte com olhos

vidrados e semicerrados.

Uma senhora acordou de seu sono com o som de passos se aproximando.

Ela esfregou os olhos, não acreditando no primeiro sinal de vida que via em meses:

um homem grande coberto por uma túnica preta. A bainha de um avental branco

por baixo de seus trajes pretos chamou sua atenção.

"Pensei... Pensei que todas as Kafras já haviam ido embora.

Você... Veio mesmo nos salvar?"

Em silêncio, o homem de túnica preta apenas acenou para a senhora, que sorriu enquanto

fechava os olhos para sonhar com um futuro melhor. O homem de túnica preta ficou vendo-a sonhar

por um instante, e então se dirigiu a passos largos até a taverna.

O taverneiro bêbado estava encostado em um canto quando o rangido da porta se abrindo

chamou sua atenção. Ele resmungou em uma voz fraca:

"Não tenho nada a lhe oferecer, a menos que só queira um copo d'água."

O homem de vestes pretas não respondeu a princípio, e tomou seu assento no bar, calmamente.

Sua voz, quase acusadora, doía nos ouvidos do taverneiro.

"Você não é o dono daqui?"

O taverneiro fechou os olhos, resignado, e apontou para a prateleira de bebidas.

Ele estava totalmente exaurido, sem vontade de resistir.

"Se quiser álcool, isso é tudo o que tenho. Que seja. É só pegar."

O homem de vestes pretas alcançou a garrafa com mais bebida, se sentou em frente

ao taverneiro sonolento, e tragou rapidamente

o conteúdo da garrafa. Os ouvidos do taverneiro se arrepiaram ao ouvir o homem

suspirar de alívio.

"O que diabos está fazendo neste lugar esquecido por Deus?"

"Não sabe o que aconteceu? Acho que você não sabe o que está acontecendo no mundo."

O taverneiro espiou curioso o homem de vestes pretas, e se endireitou.

"Parece que você tem alguma história para contar, se está cobrindo o rosto com um

capuz. Sabe, não é boa idéia beber tanto de estômago vazio.

Não quer um pouco de queijo, ou algo assim, para acompanhar?"

"Seria ótimo, obrigado."

A porta da despensa balançou, e o taverneiro entregou ao homem um prato com fatias

de queijo. Ele notou que as mãos do homem de preto eram calejadas e endurecidas quando ele pegou

as fatias.

"Desde que todas as Kafras foram embora, o escudo mágico que nos protegia dos

monstros foi destruído. Agora sofremos ataques de monstros toda noite. Perdemos mais uma

senhora ontem à noite. Você... Não devia se demorar por aqui também."

"Está dizendo que não há nenhuma funcionária Kafra na vila?"

"E isso não é tudo. Parece que as Kafras deixaram todas as cidades. Prontera, Morroc,

Geffen, Alberta... diacho, até mesmo Al De Baran. Quero dizer, ainda temos aquela máquina

Kafra GT infernal, mas não serve pra nada. Ela está mais interessada em nos arrancar impostos,

como se fosse uma 'proteção', do que nos proteger dos monstros. Esse robô é ainda pior

do que os monstros, é o que digo."

O homem de preto ficou sem falar por um instante, pensando nas palavras do

taverneiro.

"Suponho que... se as funcionárias Kafra voltassem, não faria muita

diferença. Faria?"

"Viu os idosos fazendo vigília na entrada da vila? É triste, mas eles realmente

acreditam que as Kafras virão salvá-los. É a única esperança que

os mantém vivos. E sim, não acho que as funcionárias Kafra possam mudar qualquer coisa.

Tudo o que temos aqui são idosos! Mas em breve, aquele robô também vai me matar!"

O rosto do taverneiro estava vermelho de raiva e desespero, e ele teve que tomar

fôlego antes de continuar.

"Diga-me: o que vai mudar se as Kafras voltarem?! Será que vale a pena

ter fé nelas?!"

O homem de preto não respondeu, e tomou mais um gole de bebida enquanto o taverneiro

deixou cair a cabeça, derrotado.

Então, uma voz digitalizada e controladora quebrou o silêncio na taverna.

"*Bip* Karl Vasten, homem de 76 anos. Ele deve ser levado sob custódia por não pagar seus impostos."

O taverneiro retorceu o rosto ao reconhecer a unidade Kafra GT.

"Como ele pode pagar os impostos se nem estamos ganhando dinheiro?!

Os monstros mataram todos os clientes! Como é que podemos

fazer nosso trabalho se você não faz o seu, hein?"

O homem de preto serviu-se de bebida mais uma vez e perguntou,

"O que acontece se você não paga os impostos?"

"V-você não sabe? Você é preso, e acaba indo trabalhar como escravo,

ou eles tomam sua casa."

O Kafra GT alertou mais uma vez.

"Se Karl Vasten se recusar a cooperar, usarei a força. Onde ele está?"

"Não temos o dinheiro! Tome, é tudo que tenho!"

O taverneiro pegou algumas moedas de zeny na mão, e as atirou contra

a máquina.

"Atacar um Kafra GT é considerado um ataque contra um oficial do governo, e um crime

grave."

O taverneiro bateu um copo no balcão quando a máquina terminou de falar, e

gritou,

"Já chega! Me cansei de você, sua máquina maluca!"

O taverneiro pegou uma espingarda pendurada na parede, e correu para fora da taverna.

O homem de preto permanecia sem se perturbar com a confusão, bebendo.

O taverneiro carregou as balas na espingarda, e mirou contra o Kafra GT.

"Quem é você para dizer que é oficial do governo?! Quem pediu para você vir perturbar

gente inocente?"

"*Bip* Charles Raven, homem de 38 anos. Identidade confirmada. Avaliando ameaça...

Espingarda de 27 mm. 0,001% de chance de danificar a armadura. Charles Raven, largue a arma.

Não resista ao seu governo."

"Máquina maldita! Vai pro inferno!"

O taverneiro atirou com sua espingarda, mas o balaço ricocheteou sem causar danos à

blindagem pesada do Kafra GT. Os olhos do robô brilharam em uma cor vermelha, como resposta.

"Modo de ataque iniciado."

O braço do Kafra GT se transformou em uma enorme Metralhadora Gatling que começou a disparar indiscriminadamente

contra a taverna. O taverneiro saltou para se desviar das balas enquanto

continuava a atirar com a espingarda contra o Kafra GT.

"Alto nível de resistência detectado. Solicitando autorização para incendiar Payon."

"Mas que diabos?! Só por cima do meu cadáver! Não vou deixar você destruir a minha vila!"

A unidade Kafra GT não se incomodou em responder ao taverneiro, e tirou

de trás da metralhadora um lança-chamas.

"Pare, sua máquina louca! Tem gente velha dentro dessas casas!"

"Autorização... Concedida. Primeiro alvo: a residência de Karl Vasten."

"Não! Por favor! Pare!"

"Parado, Charles Raven. Qualquer ação será considerada obstrução da justiça,

e as ações apropriadas serão tomadas."

"Como chama isso de ação apropriada?!"

O taverneiro corria em direção à casa, na esperança de salvar o velho Karl Vasten,

que estava lá dentro. Mas ele não foi rápido o bastante: uma enorme chama se acendeu no telhado,

e a casa foi incinerada em segundos.

"Oh, Deus! Não acredito nisso! Isso é... Isso é loucura!"

"Bem, Charles Raven. Entregue-se, ou usarei força letal."

O taverneiro só conseguia olhar para o chão, sem emoção alguma. Ele não tinha sequer

força para chorar. Ele sentiu seus joelhos se curvando ao chão, enquanto aceitava a morte.

Mas então, do canto do seu olho, ele viu o esvoaçar de uma túnica preta.

"Não se preocupe. O velho está seguro."

O homem de preto colocou Karl Vasten cuidadosamente no chão, e encarou a unidade Kafra GT.

"*Bip* Alvo não identificado. Nenhum registro no banco de dados.

Altura: aproximadamente 210 centímetros. Peso: aproximadamente 109 quilogramas."

"Ei, você, tire o velho daqui."

"Identifique-se com seu nome, idade e ocupação." Se recusar, será

considerado inimigo do estado, e serei autorizado a usar força letal."

"Certo, tudo bem. Primeiro, tenho vinte e quatro anos."

"*Bip* Informação aceita."

"E meu nome..."

O homem de preto puxou o capuz, e atirou sua túnica para longe. Era uma mulher!

"Meu nome é Blossom! Ocupação: Funcionária Kafra!"

Nesse momento, a casa em chama já havia atraído uma multidão de aldeões que agora

aclamava sua salvadora.

"Kafra? Ela disse que é uma...?"

"Elas voltaram! Elas... Vão salvar todos nós!"

O Kafra GT prosseguia com a análise do seu alvo.

"Avaliando... Nível de Risco 10. Requisitando... Reforç--"

Como um raio, a Kafra Blossom atingiu a cabeça da unidade Kafra GT com

um gancho de direita que fez o gigante metálico voar pelos ares.

Ele caiu no chão, enquanto seus circuitos estalavam e explodiam.

"Não é possível calcular... Poder... Requisitando reforços imediatamente!..."

A funcionária Kafra olhou para seu oponente caído e cuspiu no chão com desgosto.

"Como ousa sujar o bom nome das Kafras? Nosso destino é servir... e não dominar."

Com uma série de chutes furiosos, mais rápidos do que o olho consegue enxergar,

o Kafra GT explodiu em um enorme clarão. O silêncio voltou, só deixando

pedaços de metal queimado no chão.

"Estamos chegando. Os Serviços Kafra... Estamos aqui para ajudar."

Blossom se virou para o taverneiro.

"Para que lado fica Al De Baran?"

O taverneiro não encontrava palavras. Por muito tempo, ele viveu com medo. Finalmente,

a esperança havia retornado. Ele podia voltar a viver, e seria eternamente

grato à bela e mortal mulher diante dele. Enxugando as lágrimas,

ele apontou para o nordeste, estremecido.

"Irmãs. Logo me encontrarei com vocês."

- Continua ...

Maita
Enviado por Maita em 30/04/2010
Código do texto: T2228683