Duas obras de Annie Ernaux – La Place – Une Femme

Duas obras de Annie Ernaux

– La Place

– Une Femme

Entre as inúmeras obras de Annie Ernaux, figuram “La Place” e “Une Femme”.

Trata-se de duas obras de interesse muito particular. São duas obras breves, publicadas respectivamente em 1983 e 1987, onde a Autora faz os retratos de seu pai, e de sua mãe.

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Poderíamos perguntar-nos qual o interesse de apresentar assim o retrato de cada um dos progenitores...

Enfim, a autora revela partilhar a teoria de que o ser humano é um produto da época em que nasceu e do seu meio social. Através destas duas obras, ela diz-nos que esses dois seres eram tal como eram – inevitavelmente! Nascidos após a I Guerra Mundial, viveram o horror da Segunda Guerra. E viveram depois os anos difíceis da reconstrução da Europa...

Naturais da Normandia, oriundos de famílias de camponeses, o casal opta por se instalar na cidade e aí monta um pequeno comércio. Aí, igualmente, o casal educa a filha.

Annie Ernaux traça um retrato psicológico exaustivo dessas duas pessoas que ela conheceu tão bem, e que analisa de um ponto de vista não só psicológico mas acima de tudo, de um ponto de vista sociológico. Nas circunstâncias em que as suas vidas decorreram, eles só podiam ter sido tal qual aquilo que foram.

São retratos fiéis, de análise subtil, onde não escapam os matizes das intenções, dos momentos, das atitudes, dos sonhos... Do esforço constante de sobreviver e realizar o sonho que une o casal – o sonho comum de elevarem a filha acima do seu meio de origem! Lá como cá, assistimos ao desenrolar da evolução das classes menos favorecidas, e do esforço de realização pessoal através dos filhos – Dar aos filhos uma vida melhor do que a que tiveram a oportunidade de viver – Há a constatação de que o casal não dispõe dos meios de passar ao patamar social considerado superior, mas há a consciência dessa forma diferida de realização social!

Annie Ernaux não foge à dificuldade de se retratar a si própria como personagem, como parte necessária e integrante da equação familiar, retratando e analisando o desencontro entre a adolescente em formação e os pais que ela considera que “ficaram para trás”... Posição que vai mudando com a “escola da vida” e com o amadurecimento próprio do avançar da idade!

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A editora portuguesa, Livros do Brasil, publicou estas duas obras em edição de bolso, reunindo ambas num só volume. Desse modo, as duas obras formam um todo muitíssimo coerente!

Há um certo paralelismo formal no modo como a autora organiza as duas narrativas. Dir-se-ia que ambas começam pelo fim... Ambas começam com a morte de cada um desses dois entes queridos. Mas o retrato que de cada um deles é traçado, não condescende com sentimentalismos! Ela diz-nos – eles eram assim, tal e qual, porque e porquê!

No entanto, apesar desse rigoroso retrato psico-sociológico, nós, leitores, sentimos a homenagem de amor e gratidão que lhes é prestada.

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Annie Ernaux nasceu em 1940. A sua carreira literária começou em 1974, com a publicação de “Les Armoires Vides”, uma obra de fundo autobiográfico. Aliás, essa é uma característica da sua obra. Ela trata os seus temas de forma autobiográfica, o que lhes confere o seu tom de testemunho histórico, com a análise social indispensável, que lhes dá a necessária profundidade, e a nós, leitores, amplia a compreensão do enredo.

Várias das obras desta autora têm recebido vários prémios literários, e a sua carreira foi agora valorizada com o Prémio Nobel da Literatura. Três dos seus romances foram adaptados ao cinema!

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“Um Lugar Ao Sol seguido de Uma Mulher” – de Annie Ernaux,

Editora Livros do Brasil, Lx, Colecção Miniatura nova série; Área: LITERATURA,

Lisboa, 1ª edição, 2001.

A primeira edição francesa foi na Éditions Gallimard.

Myriam

16 de Novembro de 2022

Myriam Jubilot de Carvalho
Enviado por Myriam Jubilot de Carvalho em 16/11/2022
Reeditado em 16/11/2022
Código do texto: T7651154
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