"Autopsicografia" é um poema de Fernando Pessoa que aborda a natureza da poesia e a relação entre o poeta, sua obra e os leitores. A análise do poema revela sua complexidade e profundidade:

O poeta é um fingidor,

Finge tão completamente

Que chega a fingir que é dor

A dor que deveras sente.

 

E os que lêem o que escreve,

Na dor lida sentem bem,

Não as duas que ele teve,

Mas só a que eles não têm.

 

E assim nas calhas de roda Gira,

a entreter a razão,

Esse comboio de corda

Que se chama coração.

 

a)  A dualidade do poeta: O poema começa com a afirmação de que "O poeta é um fingidor." Isso estabelece imediatamente a ideia de que o poeta não é necessariamente alguém que expressa suas emoções genuínas, mas alguém que cria, inventa e finge. Essa dualidade entre a verdadeira emoção e a representação artística é fundamental para o entendimento do poema.

b) A arte como representação: O poema sugere que o poeta finge tão completamente que até chega a fingir a dor que ele realmente sente. Isso aponta para a capacidade da poesia de criar uma representação artística da experiência, muitas vezes distorcendo ou ampliando as emoções para criar impacto no leitor.

c) A reação dos leitores: O poema observa que os leitores que lêem o que o poeta escreve sentem a dor que ele fingiu, mas não as duas dores que ele realmente teve. Isso ressalta a natureza subjetiva da leitura e da interpretação da poesia, onde cada leitor traz suas próprias experiências e emoções para a obra, atribuindo-lhe significados pessoais.

d) A dualidade da experiência: O poema explora a dualidade entre a experiência pessoal do poeta (suas dores verdadeiras) e a experiência do leitor (a dor fingida pelo poeta). Isso levanta questões sobre a autenticidade da expressão artística e a capacidade da arte de criar empatia e conexão entre diferentes pessoas.

e) A metáfora do coração: O poema encerra com a imagem do "comboio de corda" que se chama "coração". Essa metáfora sugere que o coração é uma máquina que gira nas calhas de uma pista, como se a vida emocional fosse controlada por engrenagens e mecanismos, em contraste com a ideia romântica de um coração como o centro das emoções.

 

"Autopsicografia" é um poema que reflete sobre a natureza da poesia e da arte, destacando a dualidade entre a emoção real do poeta e a representação artística que ele cria. Ele também examina a reação dos leitores e como a poesia pode evocar emoções autênticas, mesmo quando baseadas em uma falsificação artística. É um poema que convida à reflexão sobre a relação entre o artista, a obra e o público.