Desapego (publicado originalmente em 10/1/2012)

Uma das características mais provocantes da profissão de ator é a de poder mexer com o seu corpo em favor de um personagem. Se a história exigir, os cabelos ficam vermelhos, a barba não é podada, faz-se o regime de anorexia ou se ganha músculos feito Super-Homem. Afinal, se até Clark Gable e Cesar Romero toparam esconder seus respectivos bigodes lendários somente com a finalidade de contribuir com a arte, todo o mundo tem o dever de, no mínimo, imitá-los.

Em ‘Compramos um Zoológico’, que estreou por estes dias, a transformação não é aquela imaginada, porém paga os ingressos. Na trama real da família Mee sobre a compra de uma casa dentro de um zôo, após a morte da matriarca, o espectador tem a chance de conferir como estão dois pupilos de Hollywood cujas figuras remetem à beleza e perfeição enfronhados em situações de estética, diferentes. Matt Damon e Scarlett Johansson. Ele está gordo. Ela, sem maquiagem.

No caso da atriz, ela garantiu ter rodado as cenas sem qualquer produto no rosto. Nota-se. Está sem batom, rímel, sombra ou coisa do tipo. Todavia, os truques de câmera e efeitos de computador têm como alterar semblantes. Vamos confiar em Scarlett. Já Damon surge bastante diferente da trilogia ‘Bourne’. Está rechonchudo. Em ‘Além da Vida’ e ‘Bravura Indômita’ (os 2 de 2010), idem. O ator talvez não tenha entrado no ritmo de mudança. Estava assim há tempos.

‘Compramos um Zoológico’ é o oitavo longa de Cameron Crowe, diretor consagrado em 1996 por ‘Jerry Maguire: A Grande Virada’, e muito elogiado depois por ‘Quase Famosos’ (2000) e ‘Vannila Sky’ (2001), e o trio foi rodado nesta sequência, sem ter outra obra no meio. Este seu trabalho recente não figurará na lista destes três. Nem poderia. O script escrito a quatro mãos – Aline Brosh McKenna (do bom ‘O Diabo Veste Prada’, 2006, e dos ruins ‘Uma Manhã Gloriosa’, 2010, e ‘Não sei Como Ela Consegue’, 2011) e C. Crowe – tornou a produção maçante. Em certos instantes o elenco é tomado por uma catatonia e o filme parece não saber para que lado andar.

M. Damon e Scarlett – que ela me perdoe – nos passam a impressão de quererem dividir o ‘protagonismo’ com os outros atores, sendo que a dupla está ali exatamente para ser o centro das atenções. Falando nisso, o elenco de apoio, que conta com a carismática Elle Fanning (mais talentosa e bonita que a irmã Dakota), além de Patrick Fugit, Thomas Haden Church, Colin Ford e Maggie Elizabeth Jones, soa ter compreendido o recado do casal principal e rouba as cenas em alguns takes. A pequena Maggie, sobretudo, mostra para que veio e esbanja extroversão no set.

Colin, como irmão dela, não vai tão bem. A culpa é do roteiro, que não o valorizou. Como Dylan, o filho revoltado com o pai, o ator mirim ficou encostado e na maioria das vezes aparece desenhando. Com Fugit e T. Church se dá o mesmo. Mas têm boas sacadas que tiram dos bolsos.

‘Compramos um Zoológico’ tem seu lado bom. Toca-nos como o conto de fadas. Às vezes esqueci que se tratava de história verídica, pois o enredo é de uma meiguice atroz – a ameaça de se fechar o zoológico, bichos carentes, os amigos que querem ajudar a erguer o local –, tudo isto ocorreu mesmo. E, evidente, ver Scarlett Johansson é muito bom, com ou sem sua maquiagem.

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Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 14/01/2012
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