Queridinhos da América (publicado originalmente em 4/2/2014)

A partir de 2010 o diretor novaiorquino David O. Russel fez três filmes dignos de nota, pelo menos: ‘O Vencedor’, ‘O Lado Bom da Vida’ e, agora, ‘Trapaça’. Cada qual com os seus problemas: no primeiro, os irmãos Micky e Dicky (Mark Wahlberg e Christian Bale, respectivamente) duelam entre eles no mundo do boxe, sendo Dicky um incorrigível viciado em drogas e perdedor nato; no segundo, temos Bradley Cooper como Pat, dominado pelo transtorno bipolar, inseguro, tomado por remédios; e neste atual, os mesmos Bale e Cooper se esbarram: o ex-Batman como um falsário golpista, o outro, agente do FBI pronto pra agir e fazer o embusteiro pagar a conta e ajudar a polícia. ‘Trapaça’ é assim: vemos como Russel lida com dois astros recentes de Hollywood nos papéis de Irving e Richie. Duas musas os ladeiam, claro. A história necessita de moças lindas e Amy Adams e Jennifer Lawrence são as top do momento, principalmente Amy, na pele de Sydney Prosser, amante de Irving, parceira dele nas desonestidades. Sensual, provocante e libidinosa, Sydney atrai qualquer um pelo olhar, as curvas e a inteligência maliciosa. Já Jennifer parece repetir por um lapso o papel de ‘O Lado Bom da Vida’ e encarna Rosalyn Rosenfeld, a titular de Irving. Histérica, aturdida e irresponsável, a esposa faz tudo e nada ao mesmo tempo: quer ajudar e atrapalha; quer seduzir e espanta e quer ensinar e deseduca.

A trama se passa nos anos 70 e a trilha sonora nos brinda com clássicos. Além disto, a direção de arte e o figurino detalham bem a época: cabelos ‘permanentes’, roupas coloridas, a inovação pelo microondas etc. Agora, vejamos o todo. ‘Trapaça’ tem no elenco alguns ‘queridinhos’ hollywoodianos e trata-os como se deve. Cooper e Jennifer, principalmente. Até agora não compreendi a indicação do ator para coadjuvante. Parece que os eleitores apreciaram a fisionomia com os cabelos encaracolados e a barba e os olhos escuros (ele tem olhos claros, na verdade, e é loiro) e lhe renderam homenagens. Besteira. Cooper ainda é verde em filmar fitas de qualidade e precisa aprender mais. Jennifer, não. E apesar de ela ser bastante jovem, como é talentosa a menina! Ela simplesmente pega o roteiro, vê seu papel, e dá a ele o tom na medida, mesmo quando é similar a outro trabalho. Sua Rosalyn por vezes é frágil, débil e incapaz. Porém, usa a beleza a seu favor e, diferente de Sydney, para o bem. Tem medo das tarefas do marido e quer a todo custo se vingar das arapucas armadas por ele. Sobre Bale: ótima atuação, maquiagem, idem. Na primeira cena já rimos quando o personagem ajeita os parcos cabelos com a habilidade fenomenal. Está perfeito como em ‘Psicopata Americano’ (2000). E o quarteto está no Oscar: e como escrevi, Cooper como coadjuvante e Jennifer também; Bale e Amy como principais.

Embora o trio Amy-Bale-Jennifer esteja bem, ‘Trapaça’ pena para engrenar. David O. Russel tenta impor seu ritmo, mas o longa se perde porque usa muitas situações de gracejos e uns exageros. As participações de Jeremy Renner (de ‘Guerra ao Terror’, 2009) como o prefeito Carmine Polito e a de Robert DeNiro como o mafioso Victor Tellegio caem bem. J.Renner está com a indefectível peruca preta à Elvis Presley, interpreta político trapaceiro nas horas vagas. Impecável. Atua com sobriedade e regularidade, ou seja, cumpre a labuta, não compromete. Uma das melhores cenas é exatamente a que DeNiro faz parte, quando um falso árabe tenta enganá-lo e Tellegio desanda a falar o idioma do tapeador, pra desespero dos demais. Hilariante. ‘Trapaça’ pode ficar marcado, corre esse risco, como a menor das três películas que citei no começo do texto. Estas novas estrelas da sétima arte compõem o cenário imaginário do que pode ser calçada da fama daqui a algumas décadas. De mulheres lindas e deslumbrantes e boas atrizes estamos servidos. Amy Adams é um assombro, por exemplo. Jennifer Lawrence não fica atrás. Mas e atores competentes? Onde estão os Jacks Nicholsons do século 21? O mito, a lenda, se faz passo a passo, pouco a pouco, no dia a dia. Não se pode ter tudo de última hora.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 04/02/2014
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