Sem referências (publicado originalmente em 20/2/2021)

Outro dia (ou nem tanto assim - alguns meses atrás) assisti na TV a entrevista com uma pretensa cineasta. Escrevo 'pretensa' porque da conversa não se extraiu bulhufas sobre a arte de fazer cinema. Em dado momento, o apresentador a indaga sobre quais eram as referências dela nas mulheres profissionais do ramo, na fotografia e direção.

A pobre moça, que se diz 'feminista', progressista e mais um bando de 'ista' que serve para encher linguiça, não soube responder. É engraçado observar esses buracos. Do que vale defender tanto alguma coisa, achar 'bonito' ser de esquerda, 'só por ser', e na hora H despejar no público ventos de ignorância.

Não pode e nem é recomendável se expor desta maneira. Mais: dividir bons profissionais entre homens e mulheres é absurdo, obsoleto, e chega a ser agressivo e até cruel. Quem se diz cinéfilo, com caso de amor com a Sétima Arte, precisa ter referências profissionais. É obrigação.

'Todos somos imitadores, plagiadores', disse certa vez Nélida Piñon, nossa primeira-dama da literatura. 'Ninguém é inaugural. O jovem afoito que pensa ter o inédito, comete um deslize', completou. A tal 'cineasta' da entrevista era, digamos, jovem.

Posso apostar que jamais assistiu a um Bergman, Hitchcock, Woody Allen, Fritz Lang, Orson Welles, Ernst Lubitsch etc, mas se gaba de ser fã de Petra Costa, por exemplo, por causa do insólito 'Democracia em Vertigem'... É óbvio que há os engajados, como Glauber Rocha (1939-1981). E com toda a razão.

Mergulhado em seus delírios, porém insuflado pela brasilidade que lhe queimava as entranhas, Glauber se tornou o guerreiro de sua turma. Fez obras de impacto, como 'Terra em Transe' (1967) e 'Deus e o Diabo na Terra do Sol' (1964), numa época em que o país estava em convulsão (exagerei?) política.

Vamos pinçar uma mulher agora: Anna Muylaert, que é de esquerda. Seu primeiro trabalho 'político' foi 'Que Horas Ela Volta?' (2015), sobre a ascensão da classe pobre e o contraponto com a 'elite' soberana. Ótimo. Tem espaço. Todavia, nestes momentos, penso em Nelson Rodrigues (1912-1980) e Paulo Francis (1930-1997). Esta atual geração de progressistas e adeptos à Patrulha do Politicamente Correto me decepciona e não cansa. Coitada dessa menina.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 16/02/2021
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