Crítica ao livro "O que é arte" de Jorge Coli

Durante a introdução o autor inicia a sua análise, e deixa claro aos leitores que não se pode definir arte através de conceitos ou lógicas, pois não há uma linha divisória para delimitar o que é arte ou não, apesar de certas obras e peças, por exemplo, serem consagradas como obras de arte. Explica também que há lugares, como museus, Instituições e profissionais que determinam o que será considerado arte pela sociedade.

O local, o discurso, as atitudes de admiração são os instrumentos utilizadas para determinar que objetos serão considerados arte e a sua hierarquia, porém o julgamento destes não são baseados em critérios técnicos, varia de acordo com a afinidade do crítico com a obra e o artista, portanto a unanimidade dificilmente será alcançada, sendo assim, parte-se do consenso da maioria.

O discurso, porém, é inconstante, nota-se através da História, ou seja, o que não é arte pode passar a ser considerado, e o que é, pode não ser mais. Acredito que esta invariável do discurso seja afetada pela situação social, cultural e política vivenciada pela sociedade, e que esse julgamento mude durante esta transição de conceitos da sociedade.

O discurso sobre a arte busca uma objetividade em seu julgamento para obter bases seguras para conclusões e críticas, e essa será alcançada através das classificações estilísticas e da determinação do estilo, que são feitas analisando as características que são ocorrentes nas obras, e assim, faz-se a definição, porém no decorrer das criações e da vida do artista, é possível observar outras características além das que estão sempre presentes e que traçam o estilo do criador, isto é, o artista pode variar nas tendências estilísticas durante as obras, estabelecendo as “fases”, mas sem abandonar o seu estilo, e creio que estas sofrem alterações de acordo com o momento social, político e cultural da sociedade e os sentimentos, idéias, opiniões que estão sendo vivenciadas por ele.

Por isso devemos ter cautela para não rotular artistas e obras com estilos - pois cada um tem o seu de forma particular -, fazemos isto porque acreditamos que assim saberemos informações básicas sobre eles e essa atitude empobrece o valor dos mesmos, esta classificação deve ser cuidadosa porque ela não é exata e não deve passar a ser mais importante do que a obra.

É importante ressaltar que existe uma diferença entre crítico e historiador, o primeiro analisa e tem a função de selecionar as obras, o segundo, a princípio evita critérios seletivos, porém os objetos supõem uma escolha, ou seja, a diferença é apenas formal, pois elas se unem a partir de um ponto.

A busca por essa classificação objetiva faz com que possamos encontrar ao longo da História esforços para alcançar um rigor através do estilo, primeiramente isto ocorre com Heinrich Wöfflin, ele propõem bases de uma análise formal precisa, escrevendo em 1888 “Renascença” e “Barroco”. Em 1915 ele escreve outro tratado já com as reflexões das outras obras amadurecidas e tenta as teorizar, é chamado os “Princípios Fundamentais da História da Arte”. Wöfflin tinha o discurso cuidadoso porque sabia que suas categorias escritas no tratado se aplicam somente aos períodos da Renascença e Barroco.

Eugênio d’Ors escreveu em 1928 o texto “O Barroco” propondo a aproximação do conceito de natureza científica, classificatória e universal, independente da história. Esse diz que o barroco seria um “gênero” que agruparia fenômenos culturais que são distantes pela linha temporal, mas que possuem constantes determinadoras comuns e por isso contêm especificidades que definirão as “espécies” do barroco, iniciando pela pré-história e chegando até o século passado, resultando em vinte e duas categorias. Wöfflin gera duas categorias que historicamente são sucessivas, d’Ors universaliza uma delas e sacrifica o rigor que era tão presente, mais tarde a outra também sofrerá o mesmo processo, porém não será por um teórico brilhante como ele.

No século XX, Focillon tenta criar um sistema de evolução das artes onde o Classicismo é o momento de maturidade onde as formas se encontram e este pode ser aplicado em qualquer época artística, teoricamente. Uma das características da concepção de Focillon é que as formas possuem suas próprias leis de transformação através do tempo e são elas que permitem um sistema classificatório, estático ou evolutivo, porém a redução a esses esquemas formais deixa exposto o aspecto semântico.

Todas essas tentativas de dar um rigor formal à análise das estruturas das obras de arte não foram suficientes, pois a riqueza do objeto artístico acaba fugindo dos modelos lógicos, e assim, as classificações se tornam cômodas e não científicas.

Existem obras de arte que são universais e que ao longo do tempo não perderam e nem perderão seu valor artístico, porém há objetos que terão o valor de arte atribuído dependendo da sua própria cultura, por exemplo, os objetos africanos, para nós, são considerados arte, para os próprios africanos, são apenas instrumentos de uso em rituais e cultos. Seguindo esta concepção de que selecionamos os objetos segundo o que é arte “para nós” Malraux concebeu a idéia do “museu imaginário” onde selecionamos, conforme a nossa intuição, as obras que temos afinidade, ou seja, o absolutismo de uma obra de arte ao longo do tempo é relativo à nossa cultura.

Do século XVIII em diante a concepção de arte tem se expandido e dá espaço para a criação da antiarte – com atitudes como a de Duchamp e outros vanguardistas -, objetos usuais que se tornam arte apenas por serem aceitas pelas diversas “competências”, porém quando esses se tornam arte estamos os distanciando dos seus papéis de origem.

Há também no livro a constatação feita por Jean Renoir de que sem os cuidados dos humanos os objetos podem desaparecer e que é preciso esforço para manter os materiais das obras de arte, e aí é possível mencionar os restauradores, e estes podem determinar o prolongamento da vida da obra como também profundas mudanças na mesma, por isso é possível concluir que as obras de arte não são absolutas culturalmente e materialmente, podendo sofrer grandes modificações ao longo do tempo.

Aprofundando um pouco mais, é possível perceber que a arte é dividida em dois registros: uma é a supérflua, pois não é artigo de primeira necessidade para nós, resiste pelo simples fato de obter o prestígio de arte, e a outra é o das funções econômicas ou sociais. O mercado das artes se utiliza de certos artifícios para se movimentar, dentre eles está a presença do marchand, intermediário que comercializa as obras, é possível citar vários destes artifícios, como a valorização das peças depois da morte do artista, expor em um lugar de prestígio para, de certa forma, “herdar” o mesmo. A arte tem outro papel, além dos já citados, o de valorizar a elite da sociedade. Ter obras de arte e ser culto dá o status de “superioridade”, de “refinamento”, porém só está mascarando a verdadeira intenção, que é a de ostentação do dinheiro.

Visto todas essas informações com cuidado, é possível notar que a arte não se baseia apenas nos fatores já mencionados, destaca-se a intervenção do racional - através de técnicas, da fabricação- e da não-razão – através das emoções, sentimentos, intuições -, e dentro desta; encontramos o que buscamos na arte: o prazer que ela nos fornece. A “sensibilidade inata” é formada pelo complexo de elementos culturais que foi internalizado e mantém a conexão com a cultura que está em volta de nós. Os diferentes discursos “autorizados” sobre a arte vêm nos lembrar que representam apenas um dos meios possíveis de freqüentação, ou seja, observar, detalhar, características que perdemos devido à necessidade de obter a informação à primeira vista, porém a freqüentação não é tão acessível, se deve às circunstâncias materiais e sociais.

Diante de tudo que foi exposto é possível constatar que o livro “O que é arte” enfoca em seu conteúdo o objeto artístico e não a Arte no seu sentido abstrato, pois as obras em si já trazem a sua complexidade. A dissertação baseou-se na relação espectador- obra, no esclarecimento das tentativas de definição e na explicação de que o conceito do que é arte é relativo e pessoal, e se deve também às influências exteriores, como situação econômica, social e cultural de cada época.

Liliane Maciel
Enviado por Liliane Maciel em 16/06/2010
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