O Discurso de Descartes

Descartes é considerado o pai da moderna filosofia. Nascido em 1596, teve suas obras condenadas pelos religiosos que a consideraram eivadas de ateísmo e imoralidade. Contrário às tradições, decidiu não procurar qualquer saber que não pudesse ser encontrado nele mesmo e no “livro do mundo”. Dedicou-se à investigação de si mesmo e morreu em Estocolmo de pneumonia, aos 54 anos. Matemático e criador da geometria analítica, ele ficou mais conhecido como filósofo por se dedicar às questões metafísicas, à existência de Deus e ao estudo da natureza humana. Mais do que estava escrito nos livros e na sujeição a preceptores, procurou o conhecimento pessoal na experiência da vida e nas reflexões.

Preocupou-se com o ser pensante, o campo da consciência, a demonstração da existência de Deus, Verdade pura; considerou-se como “um homem que caminha só em meio às trevas”. Para ele, a certeza de Deus provinha da certeza de si mesmo.

O discurso de Descartes descreve um método próprio através do qual o filósofo poderia chegar a várias conclusões no campo da matemática e da metafísica por conta própria. E é incrível constatar que após quase quatrocentos anos, a premissa básica do enunciador do aforismo “penso logo existo” não foi compreendida.

A razão humana não deveria aceitar passivamente, credulamente, nenhum conhecimento. A atividade da inteligência deveria filtrar e analisar tudo aquilo que em matéria de conceitos pudesse ter sido transmitido através da educação recebida promovendo uma revisão geral, a começar pelo da própria vida: viver por quê? E para quê? O método principia com a negação geral e o axioma básico “penso logo existo”; inspirado nas matemáticas procura provar a existência de Deus e o primado da alma sobre o corpo.

Dos seres vivos conhecidos, só o homem pensa, produz idéias e pensamentos. Numa linguagem mais apropriada, diríamos que só ele pode pensar; porque a maioria não o faz; imagina que o faça quando, na verdade, segue os pensamentos pensados por outras pessoas; é a ilusão da criação mental de uma humanidade acostumada e acomodada à condição de espectadora do drama humano. Pensar implica criação: forjar idéias e pensamentos que se consubstanciem em ação e sirvam para o bem e aperfeiçoamento próprio e dos semelhantes.

O “penso logo existo” poderia ser substituído por “crio logo existo”, pois somente tornando-se um criador se poderá eternizar. E como a maior obra seria a de esculpir em si um novo ser humano através da evolução pessoal, cada um, tornando-se criador de si mesmo, poderia afirmar que é a imagem e semelhança de um Criador maior.

Nagib Anderáos Neto

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