Os brasileiros negros não são mais negros

O Brasil e suas muitas peculiaridades, porém, uma delas me chama a atenção: a soberba de boa parte da sociedade. Comprovamos isso quando nos atentamos às diferenças nos olhares entre os povos. “Sou negro e não sou branco. Sou amarelo, não sou branco e nem quero ser negro. Sou branco, olhem pra mim, vim lá de fora e não gosto de outras cores.” Quanta bobagem!

Mal sabem as Marias, os Joãos, os Josés da Silva e Silva, que todos esses, brasileiros legítimos, são de uma só cor e de uma única raça, chamada de diversidade. Distinção que não é fácil de encontrar por esse mundão a fora. Brasileiro não tem cor, tem?

Deve ter, pode ser que tenha. Brasileiro que é do Brasil é negro, negro sofrido, raça humana, imune, vítima da diferença. Brasileiro é fruto dos índios, é pardo, é sofredor, é vítima da injustiça. Brasileiro que é brasileiro, também é branco é descendente de outro canto, é apaixonado pela variedade.

Há alguns dias tive acesso ao estudo "Pesquisa das Características Étnico-Raciais da População”, e tive a certeza que a raça negra deixou de ser um dos cartões postais do Brasil, como já ouvi dizer.

O Estudo das Categorias de Classificação de Cor ou Raça, coletou informações em 2008, em uma amostra de cerca de 15 mil domicílios, no Amazonas, Paraíba, São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Distrito Federal. Entre os resultados, destaca-se o reconhecimento, por 63,7% dos entrevistados, de que a cor ou raça tem influência em suas vidas.

Entre as situações nas quais a cor ou raça tem maior influência, o trabalho aparece em primeiro lugar, seguido pela relação com a polícia/justiça, o convívio social e a escola. Dos entrevistados, 96% afirmam saber a própria cor ou raça. As cinco categorias de classificação do IBGE (branca, preta, parda, amarela e indígena), além dos termos “morena” e “negra”, foram utilizadas.

Os negros, em proporção e emoção, são maioria. Outra pesquisa, realizada no mesmo ano pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) me deixou um pouco mais pensativo. A pesquisa dizia que os negros são 70% das vítimas de assassinatos no Brasil. Coincidência?

O estudo disse ainda que a possibilidade de o negro ser vítima de homicídio no Brasil é maior inclusive em grupos com escolaridade e características socioeconômicas semelhantes. A chance de um adolescente negro ser assassinado é 3,7 vezes maior em comparação com os brancos. E essa questão é social ou racial? Não sei a resposta, mas tenho ela na ponta da língua.

Os negros são maioria e representam a nação em diversas culturas, levam o nome do país para todos os cantos. Mas, os brancos e pardos fazem isso também, não fazem? O mais difícil de toda essa situação é tentar fazer com que as pessoas saibam que somos todos iguais. E talvez, um dia, não se assustem ao ver um casal de namorados de cores diferentes. A cor do sentimento é a mesma.

Ah, sou descendente de outra terra, e me conforto ao saber que meus antepassados daqui eram negros. Eu tenho sangue mulato, tenho resistência ao desrespeito. E tenho em mim o ‘maior sentimento do mundo’, seja ele qual for: branco, pardo ou negro.

Kallil Dib - Jornalista

Kallil Dib
Enviado por Kallil Dib em 06/01/2014
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