BECKETT - " TEXTOS PARA NADA" - ROBERTA LESSA

"É o Fim que confere o significado às palavras. Apenas as palavras quebram o silêncio, todos os outros sons cessaram. Se eu estivesse silencioso, não ouviria nada.Mas se eu me mantivesse silencioso, os outros sons recomeçariam, aqueles a que as palavras me tornaram surdo, ou que realmente cessaram. Mas estou silencioso, por vezes acontece, não, nunca, nem um segundo. Também choro sem interrupção. É um fluxo incessante de palavras e lágrimas. Sem pausa para reflexão. Mas falo mais baixo, cada ano um pouco mais baixo. Talvez. Também mais lentamente, cada ano um pouco mais lentamente. Talvez. É-me difícil avaliar. Se assim fosse, as pausas seriam mais longas, entre as palavras, as frases, as sílabas, as lágrimas, confundo-as, palavras e lágrimas, as minhas palavras são as minhas lágrimas, os meus olhos a minha boca. E eu deveria ouvir, em cada pequena pausa, se é o silêncio que eu digo quando digo que apenas as palavras o quebram. Mas nada disso, não é assim que acontece, é sempre o mesmo murmúrio, fluindo ininterruptamente, como uma única palavra infindável e, por isso, sem significado, porque é o fim que confere o significado às palavras."

(Samuel Beckett, in ‘Textos para Nada’)

FILOSOFIANDO IDÉIAS: Um diálogo quase que impertinente com Becckett

Uma das questões que mais me chama atenção em fatos como esses que correm soltos à bailar pela mídia global, e que por hora sigo dando minhas patacoadas(*), é essa febre incessante do "se mostrar ser", do "se utilizar de", do "se desgastar até que". Venho de um período de presenças sociais, de atitudes em níveis diferenciados e sem essa absorção dos fatos como mais um produto a se consumir, consumar e descartar.

Fora um um tempo em que vivenciava ideologias embasadas em outras óticas e não como verifico em alguns muitos casos em nossa sociedades atual, onde um de música que vira hit populesco; que anti semitismo não era fonte de renda de uma étnica descendência daqueles que sofreram realmente nos campos nada floridos mas concentrados dos horrores de uma guerra; onde um caipira era modus vivendis e não criação aloprada comercial onde se representa e traveste pessoas sem identidade de causas; onde reivindicar era ato de fato de origem em consciência individual aliada à um coletivo e não maquilagens sociais corporificadas em etiquetas oriundas de boutiques de "felizes e entediadas" esposas de uma sociedade que se mantém da aparência pré fabricada e muito bem estruturada para a manutenção desse estado digamos, saudável.

O mecanismo gerado pelas pessoas oportuniza a apropriação funcional e cotidiana que tende a descaracterizar sérias questões que deveriam ser consideradas, analisadas, repensadas e quando necessário, modificadas no pensamento,, atos e palavras de um coletivo em que existem e ou se manifestam. São questões, entre tantas outras como: homofobia, etnia, gênero, política e miríades de situações que vão se aglomerando, confundindo-se entre si, e perdendo sua real propositura.

O esquecimento é um alerta à vida, pois quem esquece a memória, a história, não se contextualiza e nem tece idéias à respeito de nada, pois multi diversifica à tal forma as questões, que ocorre a deformação circunstancial que transforma duvidosos e questionáveis conceitos naquilo que virá a se tornar absoluta verdade no processo de evolução; que deveria ser livre e consciente no indivíduo, mas que re significando torna-se fonte de consumo no coletivo cultivado para a não reflexão.

Essa inércia operante consome até esvaecer, as questões diversas depositando-as hermeticamente em compartimentos que por hora chamo banalismo. O coletivo se anestesia e não mais sente/percebe/reflete questões que envolvem o cidadão e sua atuação no meio que está inserido e atua.

Os chamados e "instituídos legalmente" comandantes desse coletivo, que por hora ouso chamar de deste grande teatro cínico da vida; que deveriam sim governar sob a bandeira do bem servir, manipulam muito bem e intencionalmente todos nós, se apropriando das questões em voga e as utilizando à seu favor. Fato é que no meio disso tudo, para sanar um pouco a pressão social que pode vir a emergir de tempos em tempos, eles permitem breves e mínimas aberturas da válvula social para que ocorra no coletivo o engodo que alivia, mas não efetiva a cura social.

Tais imposturas governamentais, aliadas aos pares que dominam as finanças da sociedade, servem de escape para que não haja uma real explosão ou implosão de ideias e ideais que fugiria a humanidade do controle social que é submetida.

SILENCIO-ME OU MACULO A PALAVRA E O SENTIDO DA ESCRITA?

-Quantas pessoas tem realmente consciência politizada na sociedade vive?

-Quantas dessas realmente se engajam sem interesses político partidários?

Dentre essas, quantas que, se leitas fossem, fariam de sua ações, a confirmação das palavras tão bravamente "urradas" em passeatas, atos cívicos, entrevistas midiáticas?

VIVA ZAPATA! (**)

Os Lamarcas (****) existenciais de plantão que me perdoem mas presenciei também o poder subir à cabeça de muitos "companheiros" pseudo "bolchevique tupiniquins" e que agora ensimesmados, agem de forma a manter -se na segurança dos benefícios lucrativos alcançados às "duras penas" através muitas vezes da auto prostituição voluntária, utilizando-se do eterno fervor de uma massa que anteriormente compunha e que é transformada novamente em uma mecânica de manobras para que atinja seus fins individualistas.

Fazem uso e até instauram eficazes sistemas de implantação da ausência da memória coletiva; e também difundem conhecimento artificializado ideologicamente transformando em fato histórico entre jovens adolescentes, instigando neles um pseudo heroísmo sensorial, haja vista poucos se dedicarem à leituras mais complexas e profundas, buscando a reflexão da conjuntura que estão inserido.

Transformam nossos jovens em muitos "heróis sem causas", mas com as faces muito bem maquiladas, que se deixam consumir e consomem marcas de modas vigentes e sazonais, deixando sempre à mostra as etiquetas caras para seu padrão de vida, mas que saciam o desejo de mesmo que por instantes seja seu corpo visível, consumível, utilizável enquanto outdoors em suas frequentes selfs postadas diariamente à serviço de um ego que só não é maior, por que choca com outros egos, seus pares, e também muito inflados pela inconsciência voluntária ou não.

O que nos resta a não ser observar esse novo exército, quase que imbatível, e muitas vezes cruel e sagaz em suas posturas nada solidária e pacífica, que a nova forma ditatorial tão bem articulou nessas décadas de aprendizado de utilização da sutileza silenciosa que corrói gradual e sistematicamente as estruturas de resistência humana tornando-nos servos e defensores desse sistema quase que indestrutível.

SOMOS COBAIAS DESSES SEMI DEUSES E SEQUER O ADMITIMOS SER.

Algumas notas necessárias:

(*) - Que o saudoso proseador Cornélio Pires me perdoe , mas esse termo ouso também utilizar , contextualizando -me nele e ele em mim, afinal a arte assim nos permite;

(**) - Viva Zapata é referencia ao filme estadunidense feito na década de cincoenta, utilizando o gênero faroeste. Dirigido por Elia Kazan, foi escrito por John Steinbeck e Edgecumb Pinchon;

(***) - Emiliano Zapata Salazar foi um líder na chamada revolução mexicana do ano de 1910 contra a ditadura de Porfírio Díaz. Considerado um dos heróis nacionais mexicanos. Era conhecido como Caudilho do Sul. Inn: http://pt.wikipedia.org/wiki/Emiliano_Zapata;

(****) - Referencia à Calos Lamarca, um dos líderes da oposição armada à ditadura militar brasileira, instalada no país em 1964. Capitão do Exército Brasileiro, desertou em 1969 tornando-se um dos comandantes da Vanguarda Popular- VPR, organização da guerrilha armada de extrema esquerda que combatia o regime. Elevado à condição de ícone revolucionário do socialismo e da esquerda brasileira, foi condenado pelo regime militar como traidor e desertor. (...). Inn: http://pt.wikipedia.org/wiki/Carlos_Lamarca.

Roberta Lessa
Enviado por Roberta Lessa em 12/12/2014
Código do texto: T5066862
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