LEITURA NO BRASIL: retratos de encenações?

Um público comprometido com a leitura é crítico, rebelde, inquieto, pouco manipulável e não crê em lemas que, alguns, fazem passar por ideias.

Vargas Llosa

Acaba de ser publicada a quarta edição da pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil” cuja realização é do Instituto Pró-Livro tendo como executor do projeto o “Ibope Inteligência”. Nos termos do próprio órgão, tal empreitada objetiva revelar “a intensidade, forma, limitações, motivação, representações e as condições de leitura e acesso ao livro – impresso e digital – pela população brasileira”. À luz da epígrafe “vargaslhosiana”, os dados colhidos nos facultam, entre outras interpretações, essa de que forjamos meros arremedos de leituras, ou seja, encenamos.

Se, por habilidades de leitura, entendermos os fenômenos da Compreensão (o que diz o autor – assunto tratado; tese defendida; argumentos elencados) e da Interpretação (o que se diz ao texto e a partir dele – processo de significação), nossa realidade é vexatória. Ora, a cada quatro brasileiros, só um parece atender a estas exigências. Assim, giramos as primeiras rodas do espetáculo: aumento de escolaridade que não redunda em caráter qualitativo – o saber ler. Conceituar leitor como aquele que passou por um livro ou descodificou parte dele em determinado tempo é embusteirice cultural. No mesmo nível se encontra o consumo de textos de viés puramente mercadológico ou “lixeratura”.

Que, de fato, aconteceria, neste País, caso cinquenta e seis por cento da população, acima de cinco anos de idade, fossem – permita-me o neologismo – “Leitricos”? Apontamos, aqui, o cidadão que trabalha a leitura em sua radicalidade mais profunda, isto é, como experiência intelectual complexa, sistematizada, geradora de significações. Ao predominar este tipo (“Leitrico”), se espalha, em todos os cantos, uma energia Libertária indomável, uma Potência do bom uso da Vida. As engrenagens, digamos, da leitura “desengonçada”, ao contrário, trituram o indivíduo implantando olhos apequenados, fixos nas ondas instintivas.

Nosso juízo avança pela consciência de que, no fundo, predomina, lamentamos, uma deplorável exibição da mentira. Faça análises dos motivos alegados para ler, do significado deste ato (Leitura) e dos textos escolhidos (afora a Bíblia) e verá o quanto há de frivolidades. Aparecem raros clássicos como “Dom Casmurro”, “Meu Pé de Laranja Lima” e “Vidas Secas”. Nenhum ensaio consistente, por exemplo: “O Que a Internet Está Fazendo Com Os Nossos Cérebros – a geração superficial”, de Nicholas Carr ou “A Civilização do Espetáculo”, de Vargas Llosa. Ademais, metade dos estudantes e leitores não compra livros de jeito algum.

Ler por ler é desinteligência a iludir pela linguagem dos vazios. Tal comportamento gera o pedantismo, o analfabeto político, o ideólogo acocorado e toda espécie de ruído velhaco à guisa de comunicação libertadora. Espero, portanto, que essas encenações da Arte de Ler sejam desmascaradas e atiradas no limbo a fim de que os sentidos verdadeiros aflorem. Afinal, como ensina mestre Mortimer Adler: não existe só o problema de Como Ler, mas, também, o de Que Ler.