Reabilitação de Nero?

REABILITAÇÃO DE NERO?
Miguel Carqueija

Só recentemente tomei conhecimento de que algumas pessoas andam tentando reabilitar a sinistra figura de Nero, imperador romano, sob cujo reinado começou a perseguição do Império contra os cristãos. A primeira perseguição foi de fato efetuada pela Sinagoga, como relatam os Atos dos Apóstolos, inclusive narrando o martírio de Santo Estevão.
Contra Nero constam crimes horrendos, além de ter ordenado incendiar Roma para depois por a culpa nos cristãos. Sabe-se que ele matou ou mandar matar diversos parentes próximos.
Recentemente parece que surgiu um movimento para reabilitá-lo, com argumentos meio exdrúxulos, tentanto até justificar, por razões políticas, o assassinato da própria mãe. Alega-se que o incêndio de Roma não foi provocado por Nero.
Tenho para mim que matar a própria mãe, ou matar a esposa Popeia, que estava grávida (por consequência matou também a criança) a chute, não pode ter justificativa razoável a não ser no caso de loucura furiosa, o que não era o caso.
Também pesa sobre Nero a morte de seu meio-irmão Britânico.
Historiadores antigos, como Tácito e Suetônio, lançam graves acusações contra o imperador romano. E segundo a wikipedia, “poucas das fontes antigas que sobreviveram o descrevem dum modo favorável”.
Sabemos como eram comuns no paganismo (leia-se a propósito o tratado de História de Heródoto) as intrigas palacianas com toda a sorte de covardias e assassinatos, mesmo de parentes. Isso aconteceu profusamente naqueles tempos do Império Romano, antes e durante Nero.
Também consta contra Nero a execução de sua ex-esposa Octávia além da eliminação de diversos rivais como Palas, Rubélio Plauto e Fausto Sula, entre 62 e 63, portanto antes do início da perseguição aos cristãos.
Estamos diante de um caso de mau caráter, de temperamento assassino, tanto mais que os imperadores romanos tinham a mania de endeusar a si próprios, portanto eram intocáveis e infalíveis, podiam fazer o que bem quisessem e entendessem.
Prosseguindo nesse dossiê sinistro, após a morte de Popeia (assassinada, lembremos) Nero casa-se com certa Messalina; como esta já era casada seu marido foi constrangido a se suicidar.
Tácito, que não era cristão e nem favorável ao Cristianismo, não poupa Nero no que se refere à culpabilização dos cristãos no caso do incêndio:
“Contudo, nem por indústria humana, nem por larguezas do imperador, nem por sacrifícios aos deuses, foi conseguido afastar a má fama de que o incêndio tinha sido mandado. Assim pois, com o fim de extirpar o rumor, Nero inventou uns culpáveis, e executou com refinadíssimos tormentos os que, aborrecidos pelas suas infâmias, chamava o vulgo cristãos. O autor deste nome, Cristo, foi mandado executar com o último suplício pelo procurador Pôncio Pilatos durante o Império de Tibério e, reprimida a perniciosa superstição, irrompeu de novo não somente por Judeia, origem deste mal, senão pela urbe própria, aonde conflui e se celebra quanto de atroz e vergonhoso houver por onde quer. Assim, começou-se por deter os que confessavam a sua fé; depois pelas indicações que estes deram, toda uma ingente multidão (multitudo ingens) ficaram convictos, não tanto do crime de incêndio, quanto de ódio ao gênero humano. A sua execução foi acompanhada por escárnios, e assim uns, cobertos de peles de animais, eram rasgados pelos dentes dos cães; outros, cravados em cruzes eram queimados ao cair o dia como se fossem luminárias noturnas. Para este espetáculo, Nero cedera os seus próprios jardins e celebrou uns jogos no circo, misturado em vestimenta de auriga entre a plebe ou guiando ele próprio o seu carro. Daí que, ainda castigando os culpáveis e merecedores dos últimos suplícios, tinham-lhes lástima, pois acreditavam que o castigo não era por utilidade pública, mas para satisfazer a crueldade dele próprio.” (fonte wikipedia)

Ainda mesmo que o fogo em si tenha surgido por outra causa que não uma sabotagem do imperador, entendo que fica muito difícil negar os crimes desse homem ou pintá-lo como um santo de aureóla ou um anjo de asinhas.
Afinal a morte do tirano ocorreu por suicídio, depois de ter caído em desgraça,. Foi a triste consequência de sua própria existência criminosa.
Também esta página:

http://www.sohistoria.com.br/biografias/nero/

não coloca dúvida de que Nero tenha mandado martirizar os cristãos, que eram “capturados e jogados para serem devorados pelas feras”.
No “mundoestranho” da Abril se diz que ele governou “na base da loucura” e mais: “Ele pode até não ter incendiado Roma. Mas fez uma porção de outras atrocidades.”
Um pouco por toda a parte a reprovação histórica de Nero é quase unânime, ainda que se possa alegar que ele tenha feito boa administração (parte apenas técnica) o que me parece discutível, pois há quem diga que Lula fez boa administração e sabemos que não é verdade.
Eu penso que o que está por trás dessa tentativa de reabilitar aquela fera romana é o ódio contra a Igreja Católica. Os adversários mais rancorosos e menos imparciais da Igreja buscam por todos os meios negar o sofrimento dos cristãos, as suas boas obras, a pureza de sua doutrina e estrutura, a sua contribuição para a Ciência, Literatura, Arte, Música e Obras Sociais. Negar, o quanto possam, que cristãos, especialmente católicos, possam ser flor que se cheire. Daí tentativas de reabilitar historicamente monstros como Nero e Robespierre. Se duvidar tentarão reabilitar Stalin e Hitler, entre outros monstros.
Não caiamos nessa esparrela.
Em adendo, uma prova adicional de que a perseguição romana à Igreja começou já no tempo dos Apóstolos está na atenta leitura do Apocalipse de São João Evangelista. Veja-se por exemplo em Ap. 17,7: “Mas o anjo me disse: “Por que te admiras? Eu mesmo te vou dizer o simbolismo da mulher e da fera de sete cabeças e dez chifres que a carrega.” (...) “Aqui se requer uma inteligência penetrante. As sete cabeças são sete montanhas sobre as quais se assenta a mulher.” Na nota de rodapé da minha Bíblia, edição da Ave-Maria (provavelmente escrita pelo revisor geral da tradução dos originais, Frei João José Pedreira de Castro O.F.M.; atenção, não é a Vulgata mas tradução dos originais mediante a versão prestigiada dos monges de Maredsous, Bélgica) lemos: “Penetrante: porque a explicação permanece prudentemente alegórica, a alusão às sete colinas de Roma pagã é evidente.”

Rio de Janeiro, 8 de março de 2018.


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