O bullying na cultura popular

O bullying sempre esteve presente na nossa vida embora nem sempre tenha sido tratado com a seriedade que hoje reconhecemos que precisa ser abordado. Como ele é muito recorrente nas escolas, é inevitável que apareça em obras ficcionais ambientadas no universo escolar. Podemos notar que o bullying aparece muito em filmes para adolescentes, seriados, desenhos animados, revistas em quadrinhos, animes e mangás. Entre os muitos filmes que já abordaram o bullying, podemos citar Karate Kid, Te pego lá fora, Cuidado com meu guarda-costas, Carrie a estranha e Evil, raízes do mal.

Podemos notar que o bullying passou a ser tratado de forma diferente na ficção e isso se deve ao fato de que fomos forçados a admitir que não é mais um fenômeno normal de escola, uma “brincadeira de criança”. Hoje, reconhecemos que é um problema grave e que causa sequelas na vida de quem sofre, além de refletir aspectos errados da sociedade em que vivemos: a falta de empatia, o preconceito e a falta de respeito por quem não se encaixa nos padrões considerados socialmente aceitáveis. Antes, os filmes davam a entender que o problema era apenas da vítima, ela que aprendesse a se defender. Isso porque era a mentalidade corrente. Não se entendia o bullying como algo sério que merecesse atenção e o normal era que as próprias autoridades escolares nada fizessem, como se nada estivesse acontecendo.

Vemos bem em filmes como Karate Kid e outros que a mensagem comum era que a vítima tinha de resolver por ela mesma. Se ela não se defendia, o problema era dela, por ser fraca e passiva. No geral, os personagens vítimas de bullying tinham como alternativa criar coragem e enfrentar quem os perseguia ou então encontrar alguém que tomava suas dores e batia no(s) valentõ(es). Em Karate Kid, o protagonista aprende karatê para deixar se ser uma vítima e consegue, inclusive, ganhar um campeonato. Já em Carrie, o final não é feliz. A jovem telecinética, além de sofrer bullying da parte de praticamente todos os colegas e de receber pouca ajuda da parte dos profissionais da escola, ainda é oprimida pela mãe louca e fanática religiosa. No fim, em que ela se vinga de toda a escola, só conseguimos pensar naqueles episódios em que jovens saem atirando em todo mundo para depois cometer suicídio. Aliás, vale mencionar que o bullying só passou a ser levado a sério depois que estudiosos observaram a vida pregressa desses jovens que matavam tantas pessoas nas escolas para logo em seguida cometer suicídio, vendo que todos eles haviam sofrido bullying.

Na vida real, quem sofria bullying era alguém que recebia pouca atenção por parte dos outros e ninguém (ou quase ninguém) se perguntava como essa pessoa se sentia sendo o alvo escolhido para ser ridicularizada com brincadeiras maldosas, piadas de mau gosto e agressões físicas. E, quem via, preferia não se envolver. Além disso, existia o constrangimento de confessar a alguém, pois o normal seria a pessoa ser cobrada a se defender, ouvindo frases do tipo: “E você não faz nada?” ; “Não se defende? “ Isso condenava as vítimas a sofrer caladas, além de insinuar que a culpa era delas e ninguém tinha obrigação de se envolver com problemas dos outros. Importava a alguém que uma pessoa estivesse apanhando ou sendo alvo de piadas e empurrões por pessoas que se compraziam ao trata-la como lixo?

Como o bullying passou a ser tratado com mais seriedade na vida real, a ficção começou a olhá-lo com outros olhos. Desta vez, deixou de ser retratado como simples piada ou problema apenas da vítima, transmitindo-se a mensagem de que é um grave problema social, responsabilidade de todos e que, se um aluno sofre bullying por parte dos colegas, a escola, alunos e pais dos alunos devem se mobilizar, combatendo-o e entendendo que nenhuma pessoa é para ser maltratada injustamente para diversão dos outros. Percebemos essa mudança de postura em filmes como Um grito de socorro, no qual o suicídio de um adolescente faz com que um colega, com remorsos por não tê-lo ajudado, mobilize-se para alertar a escola e as demais pessoas acerca do problema. Entre os seriados para adolescentes que despertam discussões, podemos citar 13 reasons why, que até se tornou alvo de polêmica porque disseram que estimularia o suicídio entre jovens. Um filme que também mostra o bullying com bastante seriedade é Evil, raízes do mal, no qual os alunos mandam em uma escola e o protagonista, um rapaz problemático, precisa enfrentar a omissão das autoridades e a perversidade de uma turma liderada por um jovem arrogante.

Enfim, a maneira de tratar o bullying na ficção mudou consideravelmente. Não é mais problema da vítima, que muitas vezes começa a ser maltratada sem entender por que a escolheram para ser o judas que todos querem malhar e se vê sozinha, dividida entre a hostilidade sem motivos e a fria indiferença dos que poderiam fazer algo e não fazem, preferindo criticá-la por ser “fraca” e não se defender. O que muitos deveriam entender é que quem sofre bullying muito tempo pode acabar absorvendo a ideia de que é alguém sem importância, principalmente porque muitos a olham como se fosse um ser sem valor, que não merece a consideração ou solidariedade de ninguém.

Assim, esperamos que as pessoas, seja assistindo a filmes assim ou sabendo de casos na vida real, aprendam definitivamente que bullying não é mais problema apenas da vítima porque, na realidade, nunca o foi. Quem é realmente fraco e patético? O alvo de tanta crueldade sem razão? Ou os que escolhem maltratar quem não consegue se defender por pura maldade?