Identidade e sexualidade: O crônico embate feminino por sua emancipação.

Resumo: Na trajetória da mulher pode-se visualizar não somente em contexto histórico antigo, mas também atual, o quanto a mulher lutou e ainda terá que lutar para ter seus direitos garantidos de maneira legal e verídica,um embate infindavelmente crônico aos ditames sociais e infelizmente ainda Patriarcais, mesmo que em algumas circunstâncias de espaço tempo essas nomenclaturas nem mesmo existissem ou fossem cotadas.

Palavras-chave: Direitos. Ditames Sociais. Tempo Espaço. Trajetória da Mulher.

Perceber-se ao longo da história a luta das mulheres em situações, épocas, nomes e nacionalidades diversas, lutando incansavelmente por seus direitos, não somente como ser humano que são, mas, como mulheres e senhoras de suas vontades, desejos e atos.

De inúmeras tradições antigas do ser humano, uma das mais disseminadas em diversas partes do mundo, é a do matrimônio, contudo, é visto como uma ação, contrato, formalidade ou cerimônia, com o intuito de estabelecer uma união conjugal; porém, os primeiros matrimônios, eram ferramentas de manutenção de relacionamentos entre grupos sociais, amplamente usado na Europa medieval, como meio de manter alianças políticas e militares, onde membros da nobreza se sujeitavam a casamentos por interesse de firmar tratados e assegurar a estabilidade econômica; existem relatos que até o século XI, os casamentos eram arranjados pela família de noivos, com intenção de conseguir perpetuar alianças, bem como, manter uma manutenção do poder econômico, seja através do casamento entre membros de uma mesma família, ou não, contanto que estes possuíssem maiores ou similares níveis de riqueza. Somente em 1140 com o Decreto de Graciano, deu-se início a tradição do consentimento, contudo somente no século XII isso passou a ser uma condição para o casamento.

“Hoje, as discussões que envolvem o casamento ainda persistem e representam muito das mudanças que ocorreram em nossas sociedades. O casamento homoafetivo, por exemplo, é amplamente discutido na sociedade atualmente, principalmente nas esferas políticas, onde a pluralidade e a diferença devem ser contempladas, e nas organizações religiosas que se posicionam contra e acreditam ser a única instituição legítima capaz de consagrar a união matrimonial.” (RODRIGUES, Oliveira de Lucas, História do casamento – Mundo Educação, Uol)

No Brasil não foi muito diferente, apesar de seu declínio na segunda metade do Oitocentos, os casamentos arranjados ainda eram realizados de maneira lícitas, com o intuito de enriquecimento e benesses, segundo o artigo do site Rainhas Trágicas, publicado por Renato Drummond Tapioca Neto em 01 de agosto de 2017, nas palavras da historiadora Mariana Muaze “foi recorrente até o final do século XIX o recurso de se constituir matrimônio dentro da mesma família ou entre troncos familiares com negócios em comum com o objetivo de não deixar a riqueza se dissipar” (2008, p. 18). Partindo-se dessas premissas,é possível constatar o relato dessas práticas, em inúmeras peças, como Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente, que fora de imenso impacto na literatura portuguesa do século XV início do século XVI, engenhosamente utilizada para criticar os vícios e maus hábitos daquela sociedade da época, no intuito de educar não somente a população mas a sociedade como um todo, se utilizando da comicidade teatral , caricaturando através da sátira o tema abordado; neste caso, o casamento por interesse da jovem Inês Pereira, que apesar da relação de confidência com sua Mãe, a existência divergências sobre o que seria a felicidade se mantém com a maneira que a Mãe lhe cria, se utilizando da máxima que, mulher, necessita ser prendada, temente a Deus para assim encontrar casamento e pretendente dignos, constituir família com o matrimônio e ser boa reprodutora, por que assim foi com ela e deverá ser com a filha, contudo, aos olhos de Inês, que deseja um casamento onde o homem a deixe ser livre como mulher, sem afazeres obrigatórios, entre outros, divergindo da visão de matrimónio que sua Mãe tinha, enxergando assim como única saída para sua suposição do que seria felicidade, em meio a sua utopia do que é liberdade, é seduzida por uma oratória bem construída, juntamente com uma aparência impecável do Escudeiro Brás da Mata, alguém ligado a nobreza, e supostamente detentor de todos os requisitos ilusórios de Inês, sobre o que seria um bom partido para marido, entretanto logo após o casamento, este ser erroneamente tido como perfeito, mostra sua real face, um homem tirano, opressor, pretensioso e insensível, mantendo a então esposa, Inês, sob seu jugo de mandos e desmandos, que somente se vê livre do cárcere após a morte do mesmo em uma guerra, levada por uma ilusória vingança, dialoga com a alcoviteira Lianor Vaz, no intuito de casar-se novamente, a casamenteira por sua vez, não perde a chance de tentar unir Inês ao seu primeiro pretendente, Pero Marques, que havia sido rejeitado em primeiro momento por ser campestre, trabalhador rural nato, desprovido de educação elevada, porém, possuidor de imensas posses e meios de sustentá-la a longo prazo, sendo agora o pretendente mais viável para a nova viúva. Mesmo não sendo um casamento que detenha os padrões desejados de Inês, esta, se mantém e aceita o agora esposo, Pero Marques, dando sentido ao mote “ Mais vale asno que me leve que cavalo que me derrube” habilmente utilizado por Gil Vicente, no intuito de educar seu público da época, revelando que para Inês era mais vantajoso casar com um homem física e socialmente menos interessante, contudo, que lhe proporciona um casamento e um futuro mais tranquilo, do que um matrimônio com alguém que se enquadra em todos os parâmetros sociais da época, mas, acaba desiludida com uma vida de aparências, a qual teria que sustentar.

Já no drama Fuente Ovejuna de Lope de Vega, datado de 1612 – 1614, apesar de ser um texto politico e de seu autor transitar no caminho “capa e espada”, transmite na sua escrita uma característica contemporânea no contexto da exploração da mulher, onde uma personagem feminina torna-se a partícula transformadora e decisiva do rumo que a história possa tomar, quando em um vilarejo que leva o titulo da peça como próprio nome, tendo por Comendador Fernãn Gomes de Guzman, um homem abusivo, prepotente, tirano e que tem prazer em humilhar empregados, homens e forçar mulheres a manter relações sexuais com ele, se fazendo valer de uma instituição vigorada na idade média, a qual nomina-se Jus Primae Noctis, onde o senhor feudal, tem o direito de desvirginar uma noiva em sua noite de nupcias, independentemente da aceitação ou não da mesma, o que hoje seria encarado como estupro, porém, na época era lei e deveria ser cumprida, caso contrario o destino seria a morte. Entretanto, no vilarejo de Fuente Ovejuna, existia uma jovem de nome Laurência, que não se submete às vontades do Comandante Fenãn, muito menos aceitava ter relações com um homem que não fosse seu prometido Frondoso, levando o rapaz a tentar defendê-la, mas sendo em vão, posto que, o inescrupuloso Comendador usando de seu poder e posição social jura vingança, obrigando assim ao rapaz refugiar-se na tentativa de manter sua vida, retornando aos braços de sua amada, somente após a partida de Fernãn Gomes para a Ciudad Real, com o intuito de apoiar a guerra a Juana la Beltraneja, momento em que em Ovejuna, acontece o casamento entre Laurência e Frondoso. Após ser derrotado, o Comendador retorna ao vilarejo, bem como com seus desmandos, agora, humilha Esteban o pai da jovem e prendendo Frondoso para afastá-lo de Laurência, por quem ainda nutre pensamentos e desejos luxuriosos, sentimentos esses que instigam-no a sequestrar a moça, infelizmente apesar da resistência da mesma, o ato foi consumado com Fernãn Gomes. A jovem consegue fugir e tomada por uma fúria devido ao que lhe ocorreu, exige não somente de seu pai e noivo, mas de todos os demais habitantes de Fuente Ovejuna, um posicionamento, uma ação, incitando os homens que vinguem sua mulheres, porém, estes permanecem temerosos da reação do Comandante, o que leva Laurência a redirecionar suas súplicas por vingança e justiça as próprias mulheres, que inspiradas com a fala da jovem se encaminham para reaver a honra que lhes foi despedaçada e usurpada por Fernãn Gomes Guzman, ao ver a coragem das mulheres ditas frágeis, os homens se mobilizam e partem juntamente com elas.

“ Por muitas razões, e as principais, porque deixais deixais que tiranos me raptem, sem que me vingues, traidores, sem que me cobres. Ainda não sou de Frondoso para que digas que ao Marido peça vingança; ainda por tua conta corre; enquanto das bodas não tenha a noite chegado, ao pai, e não ao marido, a obrigação pressupõe; enquanto não me entreguem uma jóia, ainda que a compre, não há de correr por minha conta nem a guarda nem os ladrões.De vossos olhos levou-me à sua casa Fernãn Gómez; a ovelha ao lobo deixais, como pastores covardes. Que adagas não vi em meu peito! Que desatinos enormes, que palavras e ameaças, e que delitos atrozes ao render minha castidade a seus apetites torpes! Meus cabelos não o dizem? Não se veem aqui os golpes, o sangue e os sinais? Vós sois homens nobres? Vós sois pais e parentes? Não se rompem vossas entranhas de dor ao ver-me em tantas dores? Sois ovelhas, bem o diz o nome de Fuente Ovejuna. Dai-me armas a mim, que sois pedra e sois bronze, que sois jaspes e tigres… Tigres não, porque, ferozes, seguem a quem roubam seus filhos e matam os caçadores, antes que entrem no mar e sobre as ondas se arrojem. Nascestes lebres covardes; Bárbaros sois, e não espanhóis. Galinhas, aguentais que de vossas mulheres outros homens gozem![...]” (Vega de Lope – Fuente Ovejuna, pg. 307 e 308, 1612).

Pode ser observado em ambas as peças uma semelhança na narrativa de uma problemática que perdura nos dias atuais, sejam em países como a Índia ou no interior do Brasil, ainda existem lugares que naturalizam não somente o casamento arranjado com fins financeiros, mas casamentos com menores de idade ou até mesmo mantêm a prática da primeira noite com alguém que detém o poder local. Diversos escritores debatem sobre essa temática da instituição matrimonial e suas diretrizes rígidas e injustas com as mulheres, seja como uma Inês Pereira relativamente conformada, como a Aurélia do romance Senhora de José de Alencar satisfazendo os anseios de sua mãe D.Emília, bem como, uma Laurência que rompe com a tradição por se negar a ter a primeira noite com o comendador, que remete a Antígona de Sófocles ao se rebelar contra o Rei, acabando por tornarem-se personagens revolucionárias e inspiradoras na vida real, ao se rebelarem contra a monarquia confrontando o poder masculino na figura do Rei e do Comendador, onde Laurência ganha o apoio dos aldeões e Antígona dos Tebanos.

Referências Bibliográficas

GK Bagoé
Enviado por GK Bagoé em 13/09/2021
Reeditado em 18/10/2021
Código do texto: T7341302
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