A ecologia, o lixo urbano e as idas e vindas das tecnologias...

A ecologia, o lixo urbano e as idas e vindas das tecnologias...

Talvez existam poucos desafios tão difíceis para a civilização atual do que cuidar do próprio lixo que produz. A despeito de todas as iniciativas que vão sendo tomadas, o desafio apenas aumenta e a situação, em alguns casos vão se tornando insustentáveis.

Tempos atrás, durante uma vistoria de rotina a capitania dos portos de Santos pilhou um navio descarregando contêineres de lixo, vindo da Europa (quantos terão vindo?). E antes disso, o governo brasileiro teve de realizar uma modificação na legislação, para impedir uma verdadeira cadeia de práticas ilícitas ou danosas ao meio ambiente, estabelecida em torno da importação de pneus usados dos EUA, que entravam no país supostamente para a indústria de remoldagem pneumática.

É sabido que o lixo das sociedades urbanas tem uma imensa variedade de composição e impõe diferentes desafios na sua manipulação e destinação final. O lixo das embalagens plásticas exige solução muito diferente dos pneus de veículos, que por sua vez, é diferente da solução para o entulho da construção civil, que é diferente das providências quanto ao controle do lixo orgânico, que, é diferente da solução para os equipamentos de informática e baterias de equipamentos eletrônicos descartados.

Diante do desafio que a ameaça e a manipulação do lixo representa, não é difícil supor que este setor vai gerar um novo, rico e imenso filão de indústria, pois os indícios já estão à vista, todavia, as soluções até agora encontradas não competentes ou suficientes para dar cabo de todo o lixo produzido. Da mesma forma, toda uma geração de profissionais e gestores públicos, dedicados à administração do problema.

Se bem que uma parte da solução para o lixo deve começar no controle das embalagens produzidas para embalar bens de consumo. Muitas delas, para efeito de consumo, são, em si, produtos complexos, que não raro, utilizam papel, tinta, cola, material pet e verniz. Outras, são exagerados objetos de acondicionamento para determinados produtos, como é o caso dos eletroeletrônicos e informática, por exemplo.

Mas, se nos voltarmos para o acondicionamento de produtos alimentícios, então o susto é muito maior, pois boa parte dos produtos alimentícios processados deixaram de ser embalados em vidro e lata para serem acondicionados em potes, sacos e uma imensa variedade de produtos da mesma natureza. E estas embalagens também utilizam um verdadeiro complexo de diferentes produtos na sua confecção e, por isto mesmo, são de difícil decomposição...

A discussão sobre o lixo produzido sempre pressupõe ou leva a outra discussão, sobre o aumento paulatino, porém ininterrupto do nível de consumo individual e familiar, nas sociedades urbanas, pois em certa medida, parte do lixo que hoje é gerado decorre justamente no abuso do consumo ou, ainda, no descarte de produtos decorrentes do consumo feito impensadamente, por impulso.

É que chegamos a um tempo de tal abastança que precisamos refletir sobre o consumo, mas não daquilo que precisamos para a nossa sobrevivência imediata, mas justamente daquilo que podemos dispensar ou, francamente, não precisamos para viver! Nos EUA e Japão, por exemplo, esta é uma discussão que está na altura da urgência, envolvendo a sociedade, a indústria e os governos.

Assistindo a um programa sobre automóveis neste domingo – 12.06, assisti a uma matéria que fala das soluções apresentadas pelos fabricantes de veículos para o transporte de compras de víveres e bens de consumo no bagageiro dos veículos, mediante diferentes soluções e traquitanas, que estão de acordo com as novas exigências impostas mercadológicas, especialmente com a exigência de adequação à legislação e política ambiental.

O objetivo das tais traquitanas – diversas modelos diferentes de caixas e bolsas de transporte, e dar aos proprietários dos veículos dispensar as famigeradas sacolinhas de plástico dos supermercados, com o acondicionamento dos produtos diretamente nelas…

Estas iniciativas são muito importantes e chegam em muito boa hora, pois as tais sacolinhas são um atentado contra a natureza e o desafio, em termos de conservação ambiental, o que pode ser observado às margens das rodovias, onde elas são lançadas no acostamento por gente mal educada e abusada e, depois vão sendo arrastadas pelo vento pela pastaria – onde é um perigo para o gado – ou vão sendo arrastadas pelas enxurradas em direção aos cursos d'água.

Nas áreas urbanas, o controle delas também é difícil, e o volume de sacolas que são encaminhadas para os depósitos de lixo é absurda. Some-se a isto, o descarte de garrafas pet e cascos de coco, pilhas usadas nas ruas e se percebe o tamanho do problema e o custo financeiro do desafio...

Pudera! Fiz as contas: em minha casa entram maios ou menos cinquenta(!) sacolinhas plásticas por semana. Felizmente, num bairro próximo ao meu, existe uma cooperativa de reciclagem de papel, plástico e outros materiais e, a coleta é feita nos bairros circunvizinhos duas ou três vezes por semana.

Em alguns países, muitos progressos já foram alcançados, à conta de iniciativas educacionais e uma pesada legislação de conservação ambiental, obrigando cada pessoa e cada família a assumir atitudes e compromisso em torno do controle do consumo e da geração de lixo.

Mas, voltando às traquitanas de transporte que estão sendo incorporadas aos veículos, acabei me divertindo com os testemunhos dos fabricantes, sempre tecendo comentários espertos sobre “agregação de valor” e “iniciativa de colaboração com a preservação ambiental”.

Ri bastante, me lembrendo das formas práticas que as donas de casa, há tempos, usam para transportar e acondicionar as compras da feira - a famosa (e bem feiosa) sacola de feira e o interessante carrinho de feira, que já tem uma versão dobrável, que lembra justamente as traquitanas boladas pela indústria automobilística!

Mas recordei também que, neste sentido, meus pais e avós poderiam ser considerados gente de uma geração de pioneiros, nesta matéria.

Me lembro que em meu tempo de criança, quando os veículos de transporte mais comuns para curtas distâncias na minha região eram, pela ordem, a carroça, o cavalo e a bicicleta.

Era um tempo em que embalagens plásticas para o acondicionamento de produtos era quase desconhecida.

Na zona rural, os produtos produzidos pelas famílias eram acondicionados em tulhas e paióis. Para transportá-los em pequenas quantidades de um lugar para outro, eram usados os sacos de aniagem que vinham de uso anterior na indústria cafeeira. E os poucos produtos que exigiam acondicionamento na cidade, vinham em sacos de papel ou caixas de papelão, que traziam os produtos da indústria.

A maioria dos produtos industrializados adquiridos na cidade, porém, eram levados para a zona rural dentro de diferentes objetos de acondicionamento. Para o cavalo, haviam as enxergas, uma espécie de saco de tecido grosso e comprido, aberto no meio e que permitia acondicionamento nas duas pontas, que eram equilibradas na garupa dos cavalos. Nas carroças, os produtos eram acondicionados nos gavetões laterais, sacos de aniagem, embornais de tecido ou latas, dependendo do produto, pelo lado de dentro. Nas bicicletas, eram comuns o uso de uma caixa aberta afixada na garupeira para tanto, ou latas e embornais, se o volume fosse pequeno.

Disse linhas acima que meus avós e pais “pareciam” pioneiros no uso de embalagens ambientalmente corretas porque, não era exatamente este o caso. Era um outro tempo e uma outra situação. Boa parte da população da região do vale do rio Turvo, interior de Goiás, ainda estava fixada no campo, era um outro tipo de sociedade e um tempo de consumo muito reduzido de produtos industrializados, em face do dinheiro curto e contado para as despesas anuais, para as famílias da região...

A geração que veio em seguida, assistiu a uma verdadeira revolução nos hábitos de consumo, desde o ramo alimentar até o ramo das comunicações e, depois, informática, aderindo imediatamente aos hábitos de consumo correspondentes.

Neste sentido, tanto faz que uma cidade tenha 1.200.000 habitantes, como é o caso de Goiânia, ou 4.500 habitantes, como a minha cidade natal. Por conta da variedade de composição e volume, o controle do lixo é um desafio em qualquer lugar, em face do desafio administrativo e da ameaça ambiental que representa.