Janialidades...?

Quando a campanha de Jânio pela moralidade varreu o país em 1960, eu tinha uma década de existência, e achei bem acertada a idéia da vassourinha, da qual minha Pitangui até uma fábrica tinha. Era a Relâmpago, fábrica das afamadas vassouras de piaçava. Pegar numa delas e saber manobrar aí já me era tarefa mais complexa, de esquerda mão que já era, de nascença. Mas as vassouras mais populares eram aquelas de fibras vegetais, de facho comprido que faziam lembrar as saias de moças que nem saíam mais e costumavam ser vendidas de porta em porta.

Quase duas décadas depois, com tanta água passada debaixo da ponte, e até um Jânio redivivo, prefeitando São Paulo, em meio ao pleno entulho autoritário, fui reencontrar vassouras do outro lado do mundo, em Jacarta, capital da Indonésia, onde fora lotado na Embaixada do Brasil numa missão temporária de um ano.

O que me acordava pela manhanzinha, no ainda quase bucólico bairro de Kebayoran Baru, ao lado dos vendedores matinais diuturnos de bubur-ayam - uma sopa de arroz, com lascas de cebolas fritas, e mais algum cheirinho verde e molho de soja ao gosto do cliente - era o refrão, ocasional dos vassoureiros, que do meu entender inicial, apu, fui posteriormente ensinado que na verdade queriam dizer sapu. Curiosamente mais variadas dos que as nossas modalidades, tinham todas o cabo curto e eram operadas com uma só mão.

E bote mais quase quarenta anos nisso e eis-me aqui, na casa de mamãe, na mesma Pitangui, cercado de vassouras, industrializadas em sua maior parte, com apenas umas poucas artesanais. A política do descarte é aplicada com extrema parcimônia, de molde a se aproveitarem as mais desgastadas, ou de cerdas viciadas, em funções quintalícias...e todas somadas, elas devem passar de 20, mas não ouso precisar o censo. Juntadas, elas podem se estranhar e depois eu nem saberia como as retornar aos devidos lugares de origem. E o rastelo, ou rastelador, que jamais entrou em casa, ou numa varanda que seja, me olharia amuado se o deixasse de lado...

A onda que inda há muito pouco varreu o país, ainda não tendo baixado a poeira, não me permite ver se as bruxas ainda estão soltas, muito embora cresça de forma quase tsunâmica o número dos adeptos de que elas devam ser caçadas, ou cassadas?, a todo custo e a todo susto.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 01/11/2018
Reeditado em 01/11/2018
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