Atender é servir

Wilson Correia

Já freqüentei ambientes onde uma frase, atribuída à Teresa de Calcutá, dizia o seguinte: “Quem não vive para servir, não serve para viver”. A posição extrema dessa afirmação quer provocar o ato de pensar. Para tanto, em uma outra perspectiva, parece seguir a máxima cunhada pela “Teoria da Curvatura da Vara”, a qual nos garante: quando a vara está torta, ela fica curva para um lado; se você quer endireitá-la, não basta colocá-la na posição correta, mas, sim, curvá-la para o lado oposto (LÊNIN apud SAVIANI, 1997, p. 48).

Pensando nessa teoria, e inspirado nas lições do SEBRAE (apud LACERDA, 2012), aplico-a, neste texto, às relações que mantemos entre seres humanos e estabelecimentos comerciais do primeiro, segundo e terceiro setores da atividade econômica, mantenedores das relações de compra e venda –sofríveis, na maioria das vezes, por conta da nossa má educação para atender visando a satisfazer necessidades, realizar desejos e concretizar sonhos humanos. É como portador de necessidades, desejos e sonhos que seres humanos se relacionam em suas práticas de consumo, esse meio no qual “Quem não vive para servir, não serve para viver”.

Nesse sentido, é vital que quem deseja servir compreenda que é preciso:

1) Conhecer o consumidor, suas necessidades, desejos e sonhos, pois é dessas fontes que brotam a forma segundo a qual o consumidor vê o mundo, o planeta e a vida; a sociedade a que pertence, a cidade em que vive e o estabelecimento onde procura produtos e serviços.

2) Desenvolver a percepção sobre as expectativas dos consumidores, dialogando com interesse sincero, ouvindo atenciosamente, mostrando-se disposto a estar ali para servir, ser útil e diferenciado.

3) Entender que da satisfação dos clientes internos (atendedores-servidores) dependerá o atendimento satisfatório dos clientes externos (portadores de necessidades, sonhos e desejos), razão pela qual políticas de satisfação dos trabalhadores devem vir em primeiro lugar. E isso se justifica pelo seguinte: “Ninguém pode dar aquilo que não possui”.

4) Esforçar-se para compreender que o consumidor é único, que busca atenção personalizada, essa que ele pede pelo dito e pelo não-dito: palavras, gestos, olhares, gosto e imaginação.

5) Evitar desafiar o cliente, pois ele pode mostrar que o enganado é o atendente, sobretudo no que tem a ver com o entendimento sobre o que seja “o melhor”, preço, solução, produto ou serviço, além de isso poder se reverter na impossibilidade de diálogo e levar ao fracasso total da relação de consumo.

6) Exercitar a empatia, essa capacidade de se colocar no lugar do outro, para averiguar se necessidades, desejos e sonhos alheios estão realmente sendo sinceramente considerados.

7) Saber que pressão ou atitudes baseadas no “complexo de vira-lata” (de coitadinho) afugentarão quem espera dignidade, profissionalismo, segurança e maturidade por parte de quem atende.

8) Ser proativo, no sentido de não esperar a iniciativa do consumidor para relatar insatisfações, mas buscar, por conta própria, mapear as fragilidades e as forças do negócio que gerencia.

9) Valorizar os princípios voltados para a afirmação da dignidade humana, entre eles: atenção, compromisso, confiança, cooperação, presteza, respeito, sensibilidade e solidariedade.

10) Vivenciar os próprios desacertos para aprender com eles, tornando seu ato de servir mais adequado àquilo que cada consumidor espera da relação que experimenta.

Em um mundo e em uma sociedade onde somos educados para não ver um palmo à frente do cifrão, do dinheiro, do lucro, da acumulação e do consumismo exacerbado (TER), essas dicas querem forçar a vara para o lado dos valores humanos (SER).

Eles podem ser utópicos, compreendo. Porém, sem utopia, a vida já não tem mais colorido. E o colorido aqui é verde. Verde da esperança de que nos eduquemos para o entendimento de que, ainda que entre nós impere o senhorio das coisas, o ser humano deve vir em primeiro lugar –só isso pode justificar uma prática de atendimento lastreada no entendimento de que “Quem não vive para servir, não serve para viver”.

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SAVIANI, D. “Escola e Democracia”. 31. ed. Campinas: Autores Associados, 1997. (Coleção Polêmicas do Nosso Tempo, v. 5).

LACERDA, F. A. de B. “Atitudes para atender melhor...”. Disponível em: <http://www.sebrae.com.br/exibeBia?id=120000770&searchterm=Atender+os+desejos+dos++cl...>. Acesso em: 9.1.12.