Idealizando um banco

Parece-me que há um erro nos fundamentos de criação de uma empresa, independente do ramo de negócio que ela abrace. Ainda que estudem o mercado, a demanda pelo produto ou serviço, o potencial da região, a concorrência, ainda que avaliem o investimento, o capital de giro e a receita projetada, tudo pode ruir por outros fatores.

A maioria dos empresários, no nosso mundo desenvolvido, crê (mesmo que de forma inconsciente) que – eles - são a parte mais importante no mundo dos negócios. Essa crença decorre de sentimentos e valores distorcidos, porque valores éticos não são exatamente a prioridade no sistema de ensino de muitos países. O ideal seria que as pessoas tivessem conhecimento e vivenciassem os valores éticos desde a tenra infância, mas sabemos que isso, hoje, é mera utopia.

Ter diplomas de pós-doutorado não blinda ninguém de sentimentos primitivos como ódio, soberba, orgulho, vaidade, inveja, ciúme, avareza, personalismo, intolerância, impaciência. Dominados por esses sentimentos (mesmo que seja só alguns), muitos empresários se tornam inapto, inábeis, para conduzir qualquer negócio, porque partem de uma crença que o cliente não viveria sem eles, quando a verdade é exatamente a oposta.

Já diziam os mais sábios empresários que “o cliente é a alma do negócio” – qualquer que seja o negócio.

Quando enumeram os talentos de um bom empreendedor citam ser firme e determinado, ter iniciativa, visão de futuro, capacidade de inovar, de organizar demandas e gerenciar equipes. Obviamente, sem esses talentos ninguém pode abrir um negócio e inovar, mas não basta ser capaz de assumir riscos e desafios, identificar oportunidades e desenvolver meios de aproveitá-las. Muitos identificaram oportunidades de modo surpreendente, desenvolveram meios de aproveitá-las, assumiram riscos altíssimos e desafios instigantes até que, inacreditavelmente, foram derrotados. Nós mesmos, ao deixarmos que os venenos da alma nos dominem, nos tornamos os nossos piores inimigos.

Há que se ter em mente que consumidores, na maioria das vezes, seriam mais felizes e mais livres se não consumissem a maior parte das coisas que estão atualmente no mercado, já os empresários deixam de existir se não conseguirem consumidores para os seus produtos (isso raramente é considerado no mundo empresarial). Pensamentos como esses são necessários para aplacar um pouco a arrogância e o agir que ignora, desatende e desrespeita os interesses e direitos do cliente.

Como, então, fazer com que a galinha dos ovos de ouro escolha depositar os seus ovos na minha empresa?

Penso que no caso que fomos chamados a refletir - um banco -, muito interessante seria que se cuidasse para que a galinha sempre produzisse seus ovos de ouro. Lógico? Sim, na teoria é, mas na prática, a maioria termina por ignorar isso.

Muitos empresários tem inúmeras ideias mirabolantes para captar o dinheiro dos clientes, visando o seu enriquecimento contínuo e em progressão estratosférica. Esse desejo gera a ganância que leva a pensar que os “fins justificam os meios”, que ser inescrupuloso é ser esperto e que a sua riqueza é tudo o que importa – mesmo que seja às custas da miséria de milhões de pessoas que foram ludibriadas.

Muitas empresas foram criadas de forma irresponsável, tendo como único objetivo enriquecer quem as criou; outras, em determinado momento, passam a ser administradas por CEOs que, embora muito credenciados, terminam por levar grandes empresas à ruína e os clientes destas à perda de seu patrimônio, por adotarem fórmulas administrativas que lhes garantam salários e bônus milionários. Muitos desses exemplos pudemos observar durante a eclosão da crise financeira de 2008 e o seu desenrolar nos anos seguintes.

Se o cliente é a alma do negócio, sem ele, obviamente, o nosso negócio está morto. Se são os ovos de ouro que enriquessem a nossa empresa, mais do que apenas captá-los, é inteligente criar condições para que eles sejam sempre produzidos. Vamos, então, pensar em como fazer com que a nossa galinha possa sempre produzi-los?

Penso que o banco ideal é o que inovar e propiciar formas para que o cliente continue sempre a gerar renda. Se tivéssemos uma galinha que produzisse ovos de ouro seria sensato cuidar de sua alimentação, de seu habitat e de seu bem-estar para que ela continuasse a sua produção. Comumente, nenhum empresário imagina pensar em seus clientes, apenas em captar o dinheiro que eles tenham. É uma postura egoísta e socialmente autista, porque o empresário fecha-se em seu próprio mundo, pequeno e restrito, alheando-se dos problemas do mundo exterior – onde estão os seus clientes.

Mais do que se preocupar com as instalações (não que estas não sejam importantes, mas não devem ser consideradas como a essência do banco) devemos nos preocupar em oferecer apoio ao cliente para que a sua economia se torne sólida, consolidada. Bons investidores não tornam um banco mais forte? Por que, então, não multiplica-los?

Da mesma forma que é preciso ganhar dinheiro com a – saúde – e não com a doença, porque um paciente saudável, que apenas previne doenças será nosso cliente / nosso fornecedor de ovos de ouro por muito mais tempo, igualmente teremos de garantir que nossos clientes bancários sejam financeiramente saudáveis.

O egoísmo gera sempre ideias de criação de privilégios, de exclusivismo, por isso são tão comuns golpes financeiros para que apenas uma pessoa ou um grupo limitadíssimo consiga se apropriar de uma grande fortuna. Há uma ideia extremamente arraigada de que só a miséria e a pobreza podem e devem ser coletivizadas, jamais a riqueza. Isso não é capitalismo: isso é burrice financeira.

As mesmas pessoas que são tão egoístas, ambiciosas, gananciosas não se sentem felizes só pelo fato de estarem ricas: mais do que a riqueza própria, elas precisam presenciar a miséria alheia. Muitos buscam o poder não apenas por vaidade, mas para exercer a tirania, exercitar o ódio, a vingança – na maioria das vezes contra quem nada lhes fez.

Esses tipos de pessoas nem precisariam de tanto dinheiro, porque elas não querem exatamente o luxo: elas acumulam continuamente não para realizar grandes sonhos (palácios suntuosos, cidades inteligentes, limpas, seguras e repletas de confortos), mas para destruir os sonhos alheios ou transformar a vida de outrem num pesadelo. Incineram bilhões de dólares para criar infernos: guerras fratricidas, prisões onde aplicam torturas desesperadoras, laboratórios para experiências cruéis etc.

O dinheiro é energia e, portanto, pode ser impregnado com tudo que há de bom ou ruim em nossos corações e em nossas almas.

Se alguns podem ficar bilionários havendo muita miséria no planeta, por que não se imaginam quatrilionários se houvesse como padrão no mundo um status social de classe média? Porque, infelizmente, para eles é muito mais prazeroso ver a miséria ao redor.

Todas as empresas poderiam desenvolver formas de tornar os seus clientes financeiramente fortes. Investir em cursos de ética, de educação financeira, oferecer possibilidades para que cada um encontrasse e desenvolvesse suas habilidades intelectuais, inventivas, criativas, artísticas, artesanais, esportivas etc. Patrocinar cada cliente a produzir algo que torne o nosso mundo melhor.

Uma vez assisti uma reportagem de uma mulher que estava na prisão, condenada por latrocínio que, depois de presa, descobriu e desenvolveu um talento incrível: o de fazer cartões em papel vegetal. Nunca vi cartões tão lindos! O nosso mundo não seria muito melhor, seguro e rentável, se, ao invés de lançada ao mundo do crime, a ela tivesse sido oferecida a oportunidade de aprender artesanato?

Eu sei que continuamos a ter muitas mentalidades escravocratas, que desejam ardentemente que o seu contingente de escravos nunca pare de crescer. Por isso, investem pesadamente na produção de armas, na produção de drogas (lícitas ou ilícitas), na indústria da pornografia, porque, ao mesmo tempo que ganham dinheiro para continuar a fomentar a miséria, promovem também a escravidão – física, mental e espiritual.

Em verdade, eu sei que estamos muito distantes de termos mentalidades que queiram promover verdadeira liberdade, que queiram que o dinheiro pareça brotar em cachoeiras de águas límpidas, porque a sua origem é legítima, é legal e é sustentável.

Dinheiro sujo jamais consegue ser limpo: é energia negativa, que só gera tragédias e misérias.

Desculpem ter aqui “viajado na maionese”, mas eu me lembrei de um insight que tive há tempos atrás, quando vi o que seria Atlântida: um lugar de pessoas magras, saudáveis, vestidas com extrema elegância; com iluminação noturna agradável, ambientes limpos e com perfumes que enlevam e encantam; meio de transporte velosíssimo, limpo, silencioso e não poluente. As pessoas se comunicavam através da telepatia, o nível de conhecimento de todos era muito alto e dispunham de uma ciência extraordinariamente avançada – para a época atual. Um lugar sem violências, mas... que foi tragado pela ganância. Tiveram a galinha dos ovos de diamante, mas a implodiram.

Não sou marxista, não gostaria de dividir o pouco com muitos, mas de criar uma forma de gerar muito de forma contínua e sustentável e distribuir com todos.

Você que chegou a ler este texto até aqui acha tudo isto uma loucura? Neste “nosso” mundo sempre foi e não dá mostras que mudará nos próximos milênios. Este “nosso” mundo é de tantas insanidades que não apenas os que detém grande poder teriam a sua fúria destruidora despertada ao ler certos pensamentos aqui – mas também muitos dos miseráveis odiariam se tentássemos construir um mundo melhor para eles.

Os bancos e as empresas em geral, continuarão a ser o que sempre foram: sanguessugas que captam a riqueza produzida por muitos para abarrotar os cofres de poucos (como mostrou-nos o documentário norte-americano Inside Job).

Este é um mundo em que entronizamos com euforia os nossos algozes e trucidamos os heróis.

Para merecermos um mundo melhor, seria preciso que aceitássemos aprender e vivenciar a ética e a orar e vigiar – para não sermos tragados pelo ódio, pela ganância, pela vingança, pela inveja, pela injustiça. O que se constata, entretanto, é que as pessoas, em seu íntimo, conscientes disso ou não, não desejam um mundo melhor. Não é uma questão de ser otimista ou pessimista: artistas se declaram mais criativos na ditadura (de esquerda ou direita, tanto faz), e a parcela da população que se expressa politicamente, reclama muito mais do Bolsa Família do que da escalada da violência.

Ah, este “nosso” mundo. O planeta – bonito por fora e em ebulição por dentro -, está a sinalizar que gostaria de nos varrer de sua face. Furacões com ventos de 300 km por hora, terremotos fortíssimos, tsunamis... Não é a ira de Deus que está a provocar isso, mas os nossos venenos interiores.

Um banco com as bases que descrevi aqui seria muito combatido pelas outras empresas, porque a maioria das pessoas considera a ideia de permitir que outros tenham um bom padrão de vida, enquanto elas mesmas se enriquecem – uma aberração, uma ideia que não pode prosperar no planeta. Trouxe esse embrião de ideia apenas como um exercício de brainstorm.