BURRO. Empresário australiano entrega o jogo

Lido na internet:

Manchete: Quem é o CEO milionário que sugeriu alta do desemprego para acabar com 'arrogância' dos funcionários

Legenda da foto: Tim Gurner sugeriu que era preciso sacrificar economia para lembrar às pessoas 'que elas trabalham para o empregador, e não o contrário'

"Aumento do desemprego. Essa foi a sugestão de um empresário australiano para conter o que ele chama de uma "arrogância" que impera no mercado de trabalho atual. Tim Gurner, milionário que comanda a empresa imobiliária Gurner Group, disse que era preciso que o "desemprego aumentasse" para que as pessoas lembrassem de suas posições de assalariados.

— Acho que o problema que tivemos é que as pessoas decidiram que não queriam mais trabalhar tanto. Na minha opinião, o desemprego deveria aumentar 40%, 50%. Precisamos ver problemas na economia para lembrar às pessoas que elas trabalham para o empregador, e não o contrário — afirmou o CEO, em referência a taxa de desemprego da Austrália, que está em 3,7%.

Para que a taxa aumentasse aos níveis propostos pelo milionário, 200 mil pessoas no país teriam que perder seus empregos. O comentário aconteceu durante a participação do executivo em um evento voltado para o mercado imobiliário, na última terça-feira."

Vídeo viralizou em pouco tempo.

(Agência O Globo, 18/09/2023 09h30 - in revistapegn.globo.com)

Esse cara é simplesmente um grande tonto, por vários motivos. Em primeiro lugar, demonstrou que não tem criatividade nem conhecimento de técnicas de gestão de pessoas suficientes para obter a colaboração dos empregados. Ao que me parece, não é um CEO por competência, é um herdeiro.

Em segundo, não falou apenas por estar num momento ruim; revelou a natureza arrogante, egoísta e insensível de seu caráter, talvez seja um esquizofrênico.

Em terceiro lugar, cometeu a burrice de falar o que todo mundo sabe e é praticado desde o início dos tempos modernos, especialmente nos países que iniciam a industrialização, mas que é um "tabu". Restringir o bem-estar das classes trabalhadoras para domina-la é o tipo da coisa que acontece mas não convém falar. Quem fala é execrado. É uma regra do jogo que não se discute abertamente, porque é imoral mas funciona, no jogo do poder, assim como os preconceitos de todo tipo, dentre outros mecanismos da estruturação piramidal da sociedade moderna.

Mas foi bom o empresário australiano dar com a língua nos dentes. Bom seria que muitos outros empresários cometessem essa "gafe", para colocar o assunto na pauta dos debates públicos. Isso apressaria o surgimento de mecanismos de equilíbrio social e econômico mais apropriados para a evolução da humanidade no terceiro milênio.

Há uma quarta razão para considerar que o referido empresário falou uma asneira: a matemática. O quê gera mais bem-estar: uma economia onde boa parte da força de trabalho permanece imobilizada no desemprego, pressionando para baixo a massa salarial, ou uma política de pleno emprego em que a força de trabalho é aproveitada ao máximo e dá maior poder aquisitivo à classe média?

Conheci, há uns quarenta e cinco anos, um empresário que investiu na criação de coelhos para produção de carne e peles. Ele aplicava uma técnica de rigoroso controle dos custos, e dava aos coelhos a quantidade exata de ração para maximizar o lucro financeiro. Para o cálculo, usava uma novidade da época: o "processamento de dados". Com isso, ele sabia a quantidade de ração bastante para os animais não perecerem de fome, mas não o suficiente para reduzir o lucro. É mais ou menos o que se faz atualmente na criação de frangos para abate, contando os dias, horas e minutos para cessar a vida das aves no justo momento em que o consumo de ração deixa de ser proporcional ao ganho de peso. As técnicas daquele criador de coelhos era incipiente, e o negócio faliu. Não considerava a qualidade da carne e das peles curtidas, que obviamente ficava muito aquém da qualidade da carne de um coelho alimentado com abundância, num ambiente livre e saudável. A carne era "aguada", o valor baixo, mas dava um lucro que um coelho bem tratado não proporcionaria. Mas o lucro cessou quando os coelhos - mal tratados - começaram a ficar doentes e o custo dos medicamentos superou o rendimento potencial da aplicação financeira do valor do capital investido na granja.

Todo empresário calcula e minimiza os seus custos de produção, para maximizar o lucro. No cálculo de custos entra o item "mão-de-obra", e no planejamento é preciso considerar também a relação salários/ produtividade. Obviamente, é bom que os empresários façam isso, para que as empresas se fortaleçam e no conjunto proporcionem mais riqueza.

Todavia, na matemática empresarial não se pode esquecer que junto com a mão-de-obra vêm as pessoas, e estas querem ser felizes. Tratadas como mera força de trabalho, elas se sentem maltratadas e ficam doentes, ou revoltadas, ou diminuídas em seus potenciais. Empregados são seres humanos, e não gado.

De certo ponto de vista os empresários trabalham, sim, para seus empregados. Para não meterem os pés pelas mãos, é bom que distingam suas pessoas do capital que possuem e manipulam. Capital é diferente de capitalista. Capital é riqueza entesourada, empresários são capitalistas, como se dizia antigamente. O capital vive para o lucro. Empresários vivem para ser felizes.

Parece que Tim Gurner esqueceu-se dessas coisas. Quer o lucro e também as facilidades da força de trabalho totalmente submissa. Está querendo demais. Deveria se tornar um fazendeiro criador de coelhos, para aprender algumas lições básicas.