VYGOTSKY E A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA

Lev Semyonovitch Vygotsky nasceu na cidade de Orsha, na Bielo-Rússia, no dia 5 de novembro de 1896, mas com cerca de um ano de idade sua família mudou-se para a cidade de Gomel nesse mesmo país. Essa cidade situava-se dentro do chamado “Pale”, um território delimitado, onde eram confinados os judeus na Rússia Czarista. Ali passou sua infância recebendo educação primária de Salomn Ashpiz, um matemático judeu que regressara há pouco de seu exílio na Sibéria. Entrou na Faculdade de Medicina, mas, após um mês de aulas, trocou-a por Direito. À medicina voltou quando já era um psicólogo de renome porque queria bases neurofísicas para o estudo da mente que vinha desenvolvendo. Em 1917, graduou-se na Universidade de Moscou na especialização de literatura, lecionando essa disciplina e também psicologia em Gomel. Nessa atividade, fundou a revista literária Verask, onde publicou seu primeiro trabalho de pesquisa, mais tarde reeditada com o título de A Psicologia da Arte.

Vygotsky efetuou também estudos avançados de Filosofia e História na Universidade de Shanyavsky, ambiente cultural múltiplo onde idéias novas ferviam.

Em 1924, com 30 anos, mudou-se para Moscou, trabalhando inicialmente no Instituto de Psicologia e, mais tarde, no Instituto de Estudos de Deficiências, por ele mesmo criado. Nessa oportunidade, de extrema fertilidade para suas pesquisas, dirigiu também um departamento que visava educar crianças portadoras de disfunções mentais. Entre 1925 a 1934 conseguiu reunir em torno de suas idéias a palestras um expressivo grupo de cientistas russos, que buscavam compreender a mente humana tomando como referência distúrbios mentais.

Convidado pelo governo russo, dirigiu o departamento de psicologia no Instituto Soviético de Medicina Experimental. Morreu com 37 anos, de tuberculose, na noite de 10 para 11 de junho de 1934, sendo, bem mais tarde, suas obras aclamadas e recobertas de luz, consagrando-o quase que unanimemente como um verdadeiro “príncipe” da Psicologia, mas também admirado como filósofo e semiólogo. As implicações de sua teoria são tantas e tão variadas que concentrou toda energia de sua existência em abrir novas linhas de investigação, muitas delas concluídas por seus seguidores.

O extremo fechamento político que cercou a produção científica na então União Soviética atrasou muito, para o Ocidente, o pleno conhecimento de sua obra. Ganhou destaque na psicologia norte-americana, e depois européia, a partir da publicação, em 1962, da sua monografia Pensamento e Linguagem embora atualmente seja unânime a certeza que a vastidão e profundidade desse trabalho estenda-se também para a filosofia e semiologia.

O aparecimento de Vygotsky, na psicologia da educação trouxe uma outra alternativa para os professores, por que ele é um autor que fala e se preocupa particularmente com a escola, com o professor, valoriza a ação pedagógica, a intervenção e o papel desse educador na formação do sujeito.

Enquanto no referencial construtivista o conhecimento se dá a partir da ação do sujeito sobre a realidade 9sendo o sujeito considerado ativo), para Vigotsky, esse mesmo sujeito não é apenas ativo, mas interativo, porque constitui conhecimentos e se constitui a partir de relações intra e interpessoais. É na troca com outros sujeitos e consigo próprio que se vão internalizando conhecimentos, papeis e funções sociais, o que permite a constituição de conhecimentos e da própria consciência. Trata-se de um processo que caminha do plano social – relações interpessoais – para o plano individual interno – relações intra-pessoais.

Desta forma, o sujeito do conhecimento, para Vygotsky, não é apenas passivo, regulando por forças externas que o vão moldando; não é somente ativo, regulado por forças internas, ele é interativo.

Ao nascer, a criança se integra em uma história e uma cultura: a história e a cultura de seus antepassados, próximos e distantes, que se caracterizam como peças importantes na construção de seu desenvolvimento. Ao longo dessa construção estão presentes: as experiências, os hábitos, as atitudes, os valores e a própria linguagem que interagem com a criança, em seu grupo familiar. Então ainda presentes nesta construção a história e a cultura de outros indivíduos com quem a criança se relaciona e em outras instituições próximas como, por exemplo, a escola, ou contextos mais distantes da própria cidade, estado, país ou outras nações.

Mas não devemos entender esse processo como um determinismo histórico e cultural em que, passivamente, a criança absorve determinados comportamentos para reproduzi-los, posteriormente. Ela participa ativamente da construção de sua própria cultura e de sua história, modificando-se e provocando transformações nos demais sujeitos que com ela interagem.

Vygotsky é chamado de sócio-interacionista porque ele destaca o papel, a importância do contexto histórico sócio-cultural nos processos de desenvolvimento e aprendizagem. Ele considera que o desenvolvimento das funções mentais superiores estão diretamente ligados a fatos sociais e históricos da espécie humana para Vygotsky toda atividade humana é mediada (instrumentos, sistemas de signos, pela linguagem, construídos coletivamente).

Para Vigotsky, a linguagem é o sistema simbólico básico de todos os grupos humanos, sendo a principal mediadora entre o sujeito e o objeto do conhecimento. Em cada situação de interação, o sujeito está em um momento de sua trajetória particular, trazendo consigo determinadas possibilidades de interpretação.

Em seus trabalhos, Vigotsky aponta para a importância da linguagem como instrumento de pensamento, afirmando que a função planejadora da fala, introduz mudanças qualitativas na forma de cognição da criança, reestruturando diversas funções psicológicas, como a memória, a atenção voluntária, a formação de conceitos, etc.

Para Vigotsky, a linguagem age decisivamente na estrutura do pensamento, e é ferramenta básica para a construção de conhecimentos. A linguagem, em seu sentido amplo, é considerada por este autor como um instrumento, pois ela atuaria para modificar o desenvolvimento e a estrutura das funções psicológicas superiores, tanto quanto os instrumentos criados pelos homens modificam as formas humanas de vida.

A linguagem é instrumento essencial na construção da consciência, na construção de um mundo interno, psicológico. Permite a representação não só da realidade imediata. Mas das mediações que ocorrem na relação do homem com sua realidade. Assim, a linguagem apreende e materializa o mundo de significados, que é construindo no processo social e histórico.

Quando se apropria da linguagem enquanto instrumento, o indivíduo tem acesso a um mundo de significação historicamente produzido. Além disso, a linguagem também é instrumento de mediação na apropriação de outros instrumentos. Por isso, quando se torna indivíduo – o que só ocorre socialmente – o homem apropria-se de todos os significados sociais. Mas por ser ativo, também atribui significados, ou seja, apropria-se da história, aprende o mundo, atribuindo-lhe um sentido pessoal construindo a partir de sua atividade, de suas relações e dos significados aprendidos. Esse processo de apropriação do mundo social permite o desenvolvimento da consciência do homem.

Para Vygotsky, o desenvolvimento é um processo que se dá de fora para dentro, sempre inclui relações entre as pessoas. Essa relação do indivíduo com o mundo está sempre mediada pelo outro.

A escola surgirá, então, como lugar privilegiado para este desenvolvimento, pois é o espaço em que o contato com a cultura é feito de forma sistemática, intencional e planejada. Como nos diz Vigotsky:

O aprendizado quando adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer. (1987: 101).

Muito embora a aprendizagem que ocorre antes da chegada da criança à escola seja importante para o seu desenvolvimento, Vigotsky atribui um valor significativo à aprendizagem escolar que, no seu dizer, “produz algo fundamentalmente novo no desenvolvimento da criança”. (1987:95)

A partir desta concepção Vigotsky construiu o conceito de Zona de Desenvolvimento Próxima na Teoria Histórico Cultural.

Para entender a relação entre desenvolvimento e aprendizagem, em Vigotsky, torna-se necessária a compreensão do conceito de zona de desenvolvimento proximal.

Segundo este autor, a Psicologia sempre esteve preocupada em detectar o nível de desenvolvimento real do indivíduo, ou seja, aquele que revela a possibilidade de uma atuação independente do sujeito. Um exemplo desta preocupação pode ser encontrada entre os psicólogos que utilizam estes testes, ou que se apoiam em escalas, visando detectar o nível de desenvolvimento do indivíduo.

Durante os testes ou observações que fazem, estes profissionais assumirem uma posição neutra, distante, sem oferecer qualquer tipo de ajuda. Medem o desempenho observando ao final do processo, procurando compatibilizar erros e acertos, mas não consideram o processo vivenciado pelo indivíduo na resolução de problemas.

Do mesmo modo, a escola tende a valorizar, ainda hoje, apenas o nível de desenvolvimento real dos alunos, seja durante as aulas, seja nos momentos de avaliação. Não é difícil encontrar professores que, ao fazerem uma análise da turma, argumentam:

Muitos professores, ao aplicarem suas provas, exigem que os alunos a realizem sozinhos, sem discutirem as questões com ele, professor, ou com colegas. Este tipo de avaliação leva em conta apenas o produto ou seja, o que os alunos conseguem responder e não como conseguiram chegar as respostas. Perde-se assim, a oportunidade de observar que muitas questões não respondidas, ou que apresentam respostas “erradas”, se realizadas com a mediação do professor, ou a de colegas mais experientes, tenham tido respostas positivas.

Daí porque Vigotsky aponta a existência de um outro nível de desenvolvimento – o proximal ou potencial que, tanto quanto o nível real, deve ser considerado na prática pedagógica.

Quando alguém não consegue realizar sozinho determinada tarefa, mas o faz com a ajuda de outros parceiros mais experientes, está revelando o seu nível de desenvolvimento proximal, que já contém aspectos e partes mais ou menos desenvolvidas de instituições, noções e conceitos.

Portanto, o nível de desenvolvimento mental de um aluno, não pode ser determinado apenas pelo que consegue produzir de forma independente, é necessário conhecer o que consegue realizar, muito embora ainda necessite do auxílio de outras pessoas para fazê-lo.

4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PAREDES, Eugênia Coelho. Org. Fascículo III. Psicologia da Aprendizagem.Cuiabá: Ed VFMT, 2003, 92 P. IL.

1. Psicologia 2. Vigotsky e Educação 3.Psicologia infantil 4.Psicanálise e Educação 5. Agressividade 6.Dificuldades de Aprendizagem 7. Educação e Psicologia

III- Maria Ignez Joffre Tanus, Maria V. Aquino, Daniela Barros Silva Freire de Andrade, Maria Augusta Rondas Speler, Solange Tomé Gonçalves Dias, Sumaya Persona de Carvalho e Maria Lúcia Cavalli Neder.

Universidade Federal do Espírito Santo. Biblioteca Central. Guia para normalização de Referências: NBR 6023.200/. Universidade Federal do Espírito Santo. Biblioteca Central. 2. ed. – Vitória: A biblioteca, 2002. 51 p.

Inclui bibliografia. Título Anterior: Guia para Normalização de Referências Bibliográficas: NBR 6023. ISBN 85-87106-37-7. 1. Referências Bibliográficas. 1. Título.

Normalização e Apresentação de trabalhos científicos e a acadêmicos. Guias para alunos professores e pesquisadores da UFES/ Universidade Federal do Espírito Santo, Biblioteca Central. – 6. ed. rev. 60p.: il e ampl. – Vitória: a Biblioteca, 2002

Vigotsky L.: A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes 1987

______.Psicologia e Pedagogia. Lisboa: Estampa, 1977

______.Linguagem, desenvolvimento e a aprendizagem. São Paulo: Ícone, 1998.

Eliane Auer (Moça Bonita)
Enviado por Eliane Auer (Moça Bonita) em 30/11/2010
Reeditado em 30/11/2010
Código do texto: T2645175
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.