A INTERVENÇÃO DO DOCENTE NO PROCESSO EDUCACIONAL DO ALUNO COM DISLEXIA

Introdução

Pesquisas realizadas em vários países mostram que cerca de 10 a 15% da população mundial possui dislexia. Ao contrário do que muitos pensam a dislexia não é o resultado de má alfabetização, desatenção, desmotivação, condição socioeconômica ou baixa inteligência. Ela é uma condição hereditária com alterações genéticas, apresentando ainda alterações no padrão neurológico.O disléxico tem uma dificuldade e não uma impossibilidade. Devidamente acompanhado ele vai paulatinamente superando ou contornando suas dificuldades.

Portanto para mudar a perspectiva que se tem com relação à dislexia, devemos começar por uma compreensão clara e precisa do que realmente seja e qual a sua causa. Sendo assim vamos investigar este problema, tornando-o objeto de trabalho ao tentar responder a pergunta: "Como lidar com a dislexia em sala de aula?” Destacando os aspectos positivos e os negativos dessa situação, e verificando como a dislexia se desenvolve.

Dislexia

Para Helmer Myklebust (1972), a dislexia constitui uma desordem cognitiva e uma desordem da linguagem. Desordem cognitiva, exatamente porque se centra na problemática da significação da linguagem interior, da abstração, da formação dos conceitos e das metáforas. Myklebust diz que a dislexia evidencia uma perturbação no processo de simbolização, não se operando a significação da significação, na medida em que a aquisição da significação, que deverá resultar da leitura, põe em jogo um processo cognitivo e integrativo.

Obter significação compreende uma relação com o pensamento abstrato. Deduzir, inferir, generalizar, conotar, associar, categorizar, etc., se dá imediatamente quando o processo da leitura está adquirido. Em resumo, a significação (linguagem anterior) é um requisito da leitura. Vários tipos de dislexia são descritos por Myklebust como:

- Dislexia auditiva: afeta o processo cognitivo que relaciona os fonemas (sons) com os grafemos (letras) na formação das palavras. Ler é de certa forma ver e ouvir. A visualização pressupõe a auditorização dos grafemos, isto é, a capacidade de simbolizar e de codificar a informação. Ler envolve aquisições auditivas muito importantes: silabação (soletração), a fonologia e a função auditiva de uma palavra que é um processo básico de informação; exemplo: ouve-se MACACO e escreve CAMACO.

- Dislexia visual: quando as letras não são reconhecidas como letras (tamanho, forma, linhas retas ou curvas, ângulos, vertical ou horizontal, etc.). A leitura vai da identificação das letras á síntese das sílabas (audição) e destas as palavras. Exemplo: Lê-se SOL e escreve LOS.

- Dislexia Mista: processo auditivo-visual e visual-auditivo.

Nilson Guedes de Freitas (2000) coloca o problema da dificuldade de aprendizagem sob outra perspectiva, ou seja, a perspectiva da não afirmação do problema ou da não rotulação, o que não quer dizer que seja necessário negar o aluno que nos parece portador de dificuldades de aprendizagem, muito pelo contrário, é necessário aceitá-los, compreendê-lo, amá-lo, sem ditar regras nem classificar a normalidade dentro da sala de aula.

"Como ajudar alguém a aprender se não compreendermos? E pior, por vezes quando não conseguimos atingir nossos objetivos - ajudar o outro no seu processo de aprendizagem caímos num lugar comum de rotular o outro como uma pessoa portadora de dificuldade de aprendizagem ou outras coisas do tipo [...] se entendermos que o próprio conceito de normalidade é no mínimo relativo e, ainda, que o homem é um ser temporal único, é no mínimo imprudente estigmatizar, ou mesmo, classificar alguém como um portador de dificuldades de aprendizagem para depois interceder no caso" (FREITAS, 2000, p.27).

De acordo com Piaget, o desenvolvimento cognitivo compreende quatro estágios ou períodos: o sensório-motor (do nascimento aos 2 anos), o pré-operacional (2 a 7 anos); operações concretas (7 a 12 anos) e, por último o estágio das operações formais, que corresponde ao período da adolescência (12 em diante). Cada estágio se desenvolve a partir do que foi construído nos estágios anteriores.

Se pensarmos então na relação do desenvolvimento da criança e no processo de aprendizagem podemos perceber que a dislexia pode ser diagnosticada no período pré-operacional que é marcado pelo aparecimento da linguagem oral. Cabe ao professor não encarar a educação de uma criança disléxica como algo difícil ou complicado demais, senão, corre o risco de convencer-se de que aquela criança não aprende. É claro que as ações pedagógicas devem ser planejadas com finalidade de maximizar as potencialidades da criança, e o educador deve encarar as limitações infantis com profissionalismo, buscando fazer, com que aquele aluno que lhe parece "menos competente" tenha oportunidades de construir seu conhecimento.

A aprendizagem tem que ter o necessário ingrediente lúdico e emocional, base de todo o sucesso. É essencial que se reconheça que o sucesso não é a condição crítica da aprendizagem. O sucesso implica na superação de um obstáculo nele contida a base da motivação na aprendizagem. As situações demasiado fáceis ou difíceis são trampolim para o desinteresse e para a distração. Conduzir o processo da aprendizagem numa criança em desenvolvimento não é fácil nem é simples, mas a intenção pedagógica é um misto de relação e de competência.

Os sintomas mais comuns da dislexia

1 Desempenho inconstante.

2 Demora na aquisição da leitura e escrita.

3 Lentidão nas tarefas de leitura e escrita, mas não nas orais.

4 Dificuldade com os sons das palavras e, conseqüentemente, com a soletração.

5 Escrita incorreta, com trocas, omissões, junções e aglutinações de fonemas.

6 Dificuldade em associar o som ao símbolo.

7 Dificuldade com a rima (sons iguais no final das palavras) e aliteração (sons iguais no início das palavras).

8 Discrepância entre as realizações acadêmicas, as habilidades lingüísticas e o potencial cognitivo.

9 Dificuldade em associações, como, por exemplo, associar os rótulos aos seus produtos.

10 Dificuldades para organização seqüencial, por exemplo, as letras do alfabeto, os meses do ano, tabuada etc.

11 Dificuldade em nomear objetos, tarefas etc.

12 Dificuldade em organizar-se com o tempo (hora), no espaço (antes e depois) e direção (direita e esquerda).

13 Dificuldade em memorizar números de telefone, mensagens, fazer anotações, ou efetuar alguma tarefa que sobrecarregue a memória imediata.

14 Desconforto ao tomar notas e/ou relutância para escrever.

15 Persistência no mesmo erro, embora conte com ajuda profissional.

O disléxico na escola

Seria muito importante que todos os professores soubessem o que é dislexia. Havendo suspeita de que um aluno esteja apresentando algum distúrbio de aprendizagem, o melhor é não adivinhar ou diagnosticar, mas entrar em contato com a orientação pedagógica da escola, para mais informações sobre o aluno. Caso esse aluno já tenha passado por avaliações anteriores, é importante obter uma copia dos resultados para uma melhor observação. Com a devida orientação, o aluno conseguira ser bem sucedido em classe. A compreensão e assimilação da matéria são mais prováveis se houver clareza, repetição, variedade e flexibilidade no estilo de ensino.

O papel do professor com o aluno disléxico

1 Dê ao aluno disléxico um resumo do curso, se possível antes mesmo do início das aulas;

2 Avise no primeiro dia de aula sobre o desejo de conversar individualmente com os alunos que tem dificuldades de aprendizagem;

3 Detalhe todas as exigências, inclusive a matéria a ser dada, métodos de avaliação, datas de provas, etc...;

4 Inicie cada módulo com um esquema do que deverá ser apresentado naquele período. No final, realce de maneira resumida os pontos-chave;

5 Use vários materiais de apoio para apresentar a lição à classe, como: lousa, projetores de slides, retro-projetores, filmes educativos, demonstrações praticas e outros recursos multimídia;

6 Introduza o vocabulário novo de forma contextualizada;

7 Evite confusões, isto é, dando instruções orais e escritas ao mesmo tempo.

Quanto a tarefas de leitura:

8 Anuncie o trabalho com antecedência, afim de o disléxico poder, se necessário, arranjar outras formas de realizá-la, como gravar um livro;

9 Considere a possibilidade do trabalho em grupo;

10 Quando apropriado proporcione alternativas fora da sala de aula para tarefas de leitura, como dramatização, entrevistas e trabalho de campo;

11 Dê exemplos de perguntas e respostas para o estudo das provas. Expliquem quais são as respostas aceitáveis, deixando claro o porquê da escolha desse tipo de resposta;

12 Quando necessário, avalie o conhecimento dos estudantes com deficiência de aprendizagem usando métodos alternativos, como avaliações orais, provas gravadas, trabalhos feitos em casa e apresentações individuais;

13 Autorize o uso de tabuadas, calculadoras simples, rascunhos e dicionários durante a prova;

14 Leia a prova em voz alta e antes de iniciar verifique se todos entenderam o que foi pedido;

15 Aumente o limite de tempo para provas escritas.

Considerações Finais

Considera-se que a dislexia, mais do que um distúrbio é um universo complexo contraditório que envolve aspectos neuropsicológicos, sócio-culturais e educacionais. A criança com dificuldades de aprendizagem é uma criança cujo desenvolvimento se processou mais lentamente do que outras crianças. Não devemos considerar essa criança defeituosa, deficiente ou permanentemente inapta. As crianças com dificuldade de aprendizagem podem aprender.

Percebemos que muitos professores não possuem conhecimento sobre a dislexia, dificultando um diagnóstico para um possível encaminhamento e muitas vezes passando despercebido durante a alfabetização, causando assim um grande trauma para a criança.

Se o objetivo é ensinar a criança a ler, ensine a leitura e as sub-habilidades diretamente relevantes para isso. Consiga que a criança leia. Através de conexões expressivas de palavras e de imagens, quando uma tarefa envolver aprendizagem associativa de rotina, apresente letras misturadas, em confronto com letras aos pares e sob várias circunstâncias.

A dislexia carrega a possibilidade de seus portadores apresentarem dificuldades de aprendizagem, porém é na história de vida da criança que é constituído o seu desenvolvimento, o seu modo de pensar, sentir, agir e interagir com o mundo.

Referências Bibliográficas

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISLEXIA. Disponível em <http://www.dislexia.org.br>. Acessado 25/26 out. 2009.

DISLEXIA. Disponível em: <http://www.dislexia.com.br>>. Acessado em 28 dez. 2009.

FONSECA, Vitor. Introdução as Dificuldades de Aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

FREITAS, Nilson Guedes de. Pedagogia do amor-Caminho da libertação na relação professor aluno. Rio de Janeiro: Wak editora, 2000.

IANHEZ, M.E. e NICO, Mª. Nem sempre é o que parece: vencendo as barreiras da dislexia. São Paulo: Alegro, 2001.

MYKLEBUST, Helmer. Distúrbios de Aprendizagem. São Paulo: Abril Cultural, 1972.

Lili de Sousa
Enviado por Lili de Sousa em 20/01/2011
Reeditado em 23/01/2011
Código do texto: T2741841