Pelo diálogo

Wilson Correia

No final da tarde de quinta-feira passada estávamos em reunião do Colegiado de Filosofia. Ainda nessa reunião, fomos informados que os estudantes da UFRB estavam em assembléia e que haviam optado por um movimento paredista. Dava-se, então, a greve dos estudantes (o vocábulo “greve” vem do francês “grève” e significa “não trabalho”, o qual nomeia qualquer movimento de paralisação por parte de trabalhadores que objetivam melhores condições de trabalho e salário. Por isso, dada a massificação do termo, ele é usado, aqui e ali, para nomear qualquer movimento paredista, ainda que, a rigor, aqueles que cruzam os braços não sejam trabalhadores).

Em face dessa notícia, o Colegiado de Filosofia, repetindo a postura que tomou diante da greve dos servidores técnico-administrativos, decidiu pelo respeito ao movimento dos estudantes.

Como não é o meu segmento que está em greve e como eu tinha aula quinta (noite), sexta (tarde e noite) e sábado (manhã de ontem), estive presente em todos os horários de aula a mim atribuída, comuniquei aos alunos a decisão do Colegiado de Filosofia e reiterei meu respeito à paralisação em pauta.

Creio que um movimento como esse não diz respeito apenas aos estudantes. Se ele me afeta, tem a ver comigo, tenho que dar uma resposta a ele. É o que faço, inicialmente, aqui, neste artigo.

A verdade é que temos um fato. Um fato qualificado: conflituoso. Diante de um conflito que envolve interesses, direitos e deveres divergentes, podemos tomar três atitudes básicas, a saber:

1 Fingir que ele não existe. Essa primeira postura pode se manifestar de diferentes formas, mas tende a revelar uma imaturidade dos envolvidos na solução do problema que o conflito acarreta. Aqui, o embate será sumariamente negado ou postergado, mas ele permanecerá ali onde se instalou à espera de ações consequentes. O que será melhor: conviver com um problema ou com a busca de solução para ele?

2 Potencializar o embate. Essa segunda maneira de lidar com o conflito, parece-me, é a mais desastrada possível. Por que? Porque, como repito sempre, se embates e guerras resolvessem os problemas da humanidade, nós já teríamos alcançado a paz perpétua. Além do mais, essa atitude faz os envolvidos tomarem-se por inimigos quando, em realidade, o “inimigo” não está diretamente envolvido no conflito. Criar desafetos pessoais, institucionais e políticos nessa hora é a melhor maneira de agir, sobretudo quando o que está em jogo é a causa da educação? Não é exatamente nessa hora que mais precisamos dos instrumentos que a educação nos oferece? Antipatias, intolerâncias, autoritarismos e imposições unilaterais, possíveis em momentos nos quais já se encontra instalado o conflito, não me parece ser as melhores armas quando, pedagogicamente falando, o fato requer cabeças pensantes, bocas dialogantes, braços acolhedores e homens e mulheres capazes de caminharem rumo ao entendimento dos processos humanos. Rumo à compreensão.

3 Dialogar, à procura de soluções. Mesmo com todo o investimento que essa postura exige, ela me parece ser a melhor alternativa. Mas esse diálogo não poderá ser bem encaminhado pelos envolvidos se eles adotam a postura do pai intransigente, daquele que apenas quer impor as próprias decisões. Nessa hora, construir consensos é o maior desafio, mas sempre possível. Esse diálogo também ficará prejudicado se os lados do conflito adotam a postura da criança birrenta, essa que só sabe dizer “quero porque quero”, sem o esforço para compreender possibilidades e limitações próprias e alheias. O diálogo desejável, imagino, é aquele que se baseia na racionalidade possível aos seres humanos, esses que podem se colocar à disposição da conversa transparente, sincera, respeitosa e consequente.

De minha parte, pelo fato de eu entender que as causas da educação não pertencerem a grupos específicos, mas a toda a sociedade, invisto nessa terceira alternativa como caminho para a solução da situação conflituosa que me afeta. Talvez, aí, seja possível canalizar a energia envolvida no conflito a favor da verdadeira bandeira que nos interessa: a da educação de qualidade que tanto desejamos.

Como não fiquei indiferente à causa dos servidores técnico-administrativos, como não me furto a manifestar minhas ideias sobre a luta dos professores, não será agora que abandonarei meus alunos. Ignorá-los significaria abandonar a causa social da educação. Espero, e creio, firmemente, na nossa maturidade para fazermos dessa situação um momento profícuo de diálogo. É em meio a ele que nossos conceitos vão sendo construídos, nosso entendimento vai se alargando, a compreensão pode avançar e a educação pode prosperar.

O que eu não espero é que peçam a mim que eu fique longe dos estudantes. Eles são a razão de ser da educação. São a esperança de nossa sociedade. E são, sobretudo, a justificativa maior para o meu “ser professor”.