A educação em movimento

Wilson Correia

No “18 brumário de Luís Bonaparte”, Marx afirmou que “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”. Claro que essas “circunstâncias” aí estão prenhes de condições que são objetivas (vida material e social concreta) e subjetivas (vida simbólico-cultural).

Nosso passado, não tão distante, coloca-nos como herdeiros da polarização mundial entre capitalismo e socialismo, com a conquista da hegemonia pelo capital no final da década de 1980. Somos, também, filhos de quase três décadas de regime político ditatorial, que se arrastou até o início da década de 1990. Nossos pais são a repressão e o sufocamento da liberdade de pensamento e de ação.

Nessa perspectiva, abre-se um caminho para o entendimento sobre as razões pelas quais qualquer movimento que se levante contra a tirania do capital, como dizia Milton Santos, encontre todas as dificuldades possíveis. Conforme o sujeito social se posicione com relação às condições materiais, culturais e sociais de vida na atualidade, isso influenciará o seu posicionamento em face da história que estamos fazendo e sofrendo. Daí depararmos com os que se colocam “contra”, a “favor” a um movimento e com aqueles que não se perfilam nem de um lado nem de outro.

Entremeando as complexas relações que derivam dessas expressões políticas possíveis, ainda há a exigência da tal “paciência histórica”, essa que custa a superar estádios de consciência “mágica”, “ingênua” ou “fanatizada” em direção à consciência crítica, como teorizou Paulo Freire. E como consciência crítica não basta, haja “paciência histórica” diante daqueles que, possuindo alta capacidade de julgamento da realidade vivida, custam a se decidir pela ação consequente para expressar sua discordância com relação aos rumos que estamos dando à história concreta.

Qualquer movimento de luta, resistência e conquista que se inicie no interior do mundo da educação não está imune a esses percalços. Educação sempre foi, é e sempre será sinônimo de poder. E quem pode afirmar que o poder é o bem social mais equitativamente partilhado entre os seres humanos? Ninguém no mundo poderá afirmar algo dessa natureza porque o poder sempre foi privilégio de alguns, dos autorizados a “mandar”. Às grandes maiorias sempre restou apenas a migalha política do “obedecer”.

Qualquer movimento que ouse desobedecer, não se contentando com essa relação assimétrica do mundo da política, atrai a imediata gama de ações disciplinadoras, repressivas e punitivas de que o sistema necessita para não ver seus interesses transformados. E isso se torna mais grave quando sabemos que quem governa nas sociedades de livre mercado é o capital, cabendo ao Estado e à rede de instituições sociais o papel de somenos que é o de simplesmente administrar.

O alento vem da certeza de que nenhum modelo tirânico de produção material da vida consegue ser 100% totalitário. Ele traz em si, em seu interior, o germe da sua própria destruição, como Marx e Engels ensinaram. Talvez, por isso, ainda que a disciplinarização seja acachapante, que a repressão seja asfixiante e que a punição seja homérica, a educação faz-se um setor sempre ousado para sair do aparelhamento meramente inerte e exigir qualidade onde a quantidade precária e os interesses miúdos a ela relacionados querem ostensivamente transbordar.

Para o nosso bem e o bem da sociedade, a educação em movimento não pode parar. Aí, ouço Lou Andréas-Salomé, “amiga” de Nietzsche, Rilke e Freud, a me dizer: “Ouse, ouse, ouse tudo!!! Não tenha necessidade de nada! Não tente adequar sua vida a modelos, nem queira você mesmo ser um modelo para ninguém. Acredite: a vida lhe dará poucos presentes. Se você quer uma vida, aprenda a roubá-la! Ouse, ouse tudo!”. A educação em movimento se alimenta de nossa ousadia!