Conceitos para “humanescer”: Complexidade na formação humanística.

Prof. João Beauclair[i]

 

"(...) A resistência é o outro lado da esperança”.

Edgar Morin, 1997.

 

 

            Para que nos seja possível desenvolver potencialidades na formação continuada de educadores, é vital nutrirmos nossas experiências práticas com a busca por referenciais novos que facilitem a aquisição de novos conhecimentos e favoreça a revisão de antigos conceitos. Em atuações no campo da Educação e Psicopedagogia, pesquisas e interações nos direcionam a mananciais imensos de ideias e conceitos, nem sempre bem compreendidos e estudados e, muitas vezes, açambarcados em modismos presentes nos discursos, estudados em deficiências alarmantes e pouco assimilados.

Tornam-se usuais palavras, ideias pouco refletidas e quase nunca aprofundadas. Na formação docente e na transformação da prática educativa que desejamos em nossas instituições, fica a necessidade de discutir esta questão. Aqui, na limitação que possuímos em relação ao espaço de produção de ideias, emerge com sentido de partilha o desejo de colaborar tecendo algumas reflexões sobre a importância da complexidade na formação de pessoas envolvidas com a Educação, seja na docência ou na gestão de nossas instituições, alinhando algumas ideias de seu principal pensador: Edgar Morin, filósofo, epistemólogo, sociólogo, enfim, um pensador transdisciplinar contemporâneo.

Na promoção da busca das relações entre todos os tipos de pensamento e dos diálogos entre as ciências, Morin se intitula “um contrabandista dos saberes”, transitando em diversos tipos de conhecimentos. Em sua base de raciocínio reside a compreensão dos significados presentes no contraditório e na dialógica como uma fonte de reflexão, constituinte do pensamento complexo e uma manifestação contrária aos movimentos excludentes e ao preconceito. Além disso, no que se refere aos movimentos contínuos de busca de significado e sentido para a própria vida, Morin enfatiza a importância do amor como energia principal para processos de continuidade existencial, pelos quais nos é possível integrar modos de pensar diversos, para além do pensamento disjuntivo, linear e reducionista.

Com a sua obra, Morin nos possibilita desejar um pensamento que unifique diferentes aspectos, considerando incertezas e contradições como elementos integrantes do viver e da condição humana, apontando para o resgate de dimensões humanísticas, onde possamos dar novos sentidos a Ética e a Solidariedade como caminhos favorecedores da religação de saberes e, consequentemente, dos seres humanos, no resgate do humano no humano, como propõem em toda a sua obra.

Morin considera que o ser humano é um ser complexo, com capacidades de auto-organização e de estabelecimento de relações com os outros, modo através do qual, - enquanto sujeitos relacionais envolvidos em dimensões éticas onde nossas percepções, escolhas e valores-, podemos evidenciar o encontro com a autotranscendência, num movimento auto-eco-organizador.

 Com a Complexidade aprendemos que tudo está ligado a tudo e, por isso, a emergência de pensar alternativas diante dos dilemas e desafios do mundo depende de aproximação entre as pessoas e os grupos que elas formam, onde haja possibilidades reflexivas vitais na adoção de comportamentos e posturas novas, principalmente no que se refere ao fato de que, como seres viventes, somos todos aprendentes e ensinantes ao mesmo todo tempo.

Se resgatarmos aqui a epígrafe deste texto "(...) A resistência é o outro lado da esperança”, como sujeitos envolvidos com Educação e Humanismo, o que podemos fazer é mantermos nossas práticas e intervenções focadas no desejo de resistência aos processos de desumanização, lidando no cotidiano com nossas limitações, mas agindo em prol de superações das dificuldades, em práticas vivenciais onde o diálogo seja elemento de construção de novas esperanças.

Como sujeitos, estamos inseridos no todo social que se presentifica em nossas próprias vidas, e, portanto isso se refere ao fato de que, a sociedade está em nós, mas nós também estamos na sociedade – o princípio da complexidade onde a parte está no todo e o todo está na parte. Somos viventes em redes interdependentes e relacionais, onde nada se isola e tudo se relaciona: somos autônomos, mas dependentes, em circularidades que nos tornam distintos e singulares, mas complexos, entretecidos no todo, em relação com os outros, com o mundo e suas múltiplas diferenças e semelhanças.

Para Morin, é necessária a compreensão da complexidade humana, pois como seres humanos, somos seres biológicos, culturais e multidimensionais, onde em cada um de nós “(...) há algo mais do que a singularidade ou que a diferença de indivíduo para indivíduo, é o facto que cada indivíduo é um sujeito”. (MORIN, Edgar. Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa, Instituto Piaget, 1991, p. 78).

Como conceito para “humanescer”, estudar o pensamento complexo na formação humanística hoje é interessante possibilidade de ressignificação dos movimentos em prol de novos tempos em Educação e Aprendizagem. Com o pensamento complexo, acredito que podemos pensar na ampliação de nossas consciências frente ao mundo e, com isso, reelaborarmos modos de pensar, criando oportunidades de reinvenção e de criatividade, onde a mansidão, a afabilidade e a amorosidade se tornem mais presentes, tornando nossas práticas movimentos circulares de ação, reflexão e ação comprometidas com a esperança de construção de novos tempos.

Novos tempos onde seja possível a existência da multirreferencialidade, dos pensamentos míticos, mágicos, empíricos, racionais, lógicos, da objetividade, da subjetividade, da Filosofia, da Ciência, das Artes em processos de auto-eco-organização que gerem motivos novos para seguirmos com a busca maior de todo o ser humano: a busca da Poesia, da Alegria e da Felicidade, enfim. Façamos a nossa parte, aceitando-nos com Amorosidade.



[i] Prof. João Beauclair é Palestrante e Conferencista Internacional sobre temas motivacionais, educacionais, psicopedagógicos e organizacionais. Membro do Conselho Mundial de Cidadania Planetária – WCPC. Autor e tutor de cursos em EAD, escritor, professor de cursos de pós-graduação, capacitação e  formação continuada de educadores e psicopedagogos. Possui o DEA Diploma de Estudos Avançados em Intervenção Psicossocioeducativa pela Universidade de Vigo, Ourense, Galícia, Espanha, onde desenvolve pesquisas sobre Pedagogia da Amorosidade para o Doutoramento Europeu em Intervenção Psicossocioeducativa.      Homepage: www.profjoaobeauclair.net        e-mail joaobeauclair@yahoo.com.br




Artigo publicado na BIS REVISTA PUBLICAÇÃO DO SINEP- MG ANO 03 N.12 AGO/SET/OUT 2011