A educação refém do “homem que se faz a si mesmo”

Wilson Correia

Atualmente, o professor não pode reprovar. Se reprova, justificadamente, pode ter a certeza de que contará com uma “cara virada” a mais para não encarar. Isso quando não é enxovalhado e ofendido, injuriado e difamado por onde o reprovado passe e venha a abrir a boca.

Hoje, o professor encontra hercúleas dificuldades e enormes empecilhos ao trabalhar com os conceitos de disciplina, limites e respeito estendidos para além do “si mesmo” de cada aluno e aluna que encontra em salas de aula, corredores e outros espaços escolares.

Mas, qual a raiz desse fenômeno que espreita e desafia cada ensinante em seu cotidiano de profissional cuja tarefa é educar, formar, preparar para a vida, para a sociedade, para o mundo do trabalho, para a cidadania, para a política e para a cultura?

Arrisco aqui o entendimento de que por trás dessa realidade está a concepção antropológica medievo-moderna e moderno-contemporânea que elabora, propõe e consolida o paradigma antropocêntrico e que modela o humano moderno e contemporâneo.

Desde os humanistas renascentistas Morus, Roterdam, Rabelais, Campanella, entre outros, passando por filósofos modernos como Descartes, Rousseau, Hegel, Kant, entre muitos da mesma estirpe, o antropocentrismo aludido acima encontra seus fundamentos em uma (apenas uma) das potencialidades humanas: a racionalidade.

Então, se no centro do universo e do planeta racionalmente ordenados e governados pelas leis naturais encontra-se o ser humano, e se no centro do humano reside a razão plenipotente, cujo desenvolvimento natural faz esse humano atingir o topo do topo de toda humanidade possível, do que mais esse idiota racional precisa para ganhar a estatura de homem e de mulher?

No âmbito antropológico, ele não precisa de mais nada além de ser compreendido e respeitado como indivíduo, porque esse é o patamar ôntico básico e fundamental do novo homem. No âmbito da economia, ele pode prescindir da regulação de qualquer ente exterior e alheio a si mesmo, uma vez que é apto a firmar contratos que estabeleçam relações equitativas entre comprador-vendedor autonomamente equilibradas, o que consubstancia a sociedade dos indivíduos nos âmbitos político, ideológico e da vida pública.

Nessa trilha, quando se fala de educação, nesse campo esse sujeito autocentrado, indivíduo-idiota, não precisa de mestre, professor ou do que o valha, mas, sim, de um auxiliar-facilitador criador das condições subjetivas e objetivas para que esse “homem que se faz por si mesmo” erga-se como autodidata autônomo e juiz autodeterminado da própria causa cognitiva, letrada e cultural.

Claro que se esse autodidata assim caracterizado traz dentro de si uma mestra maior, incólume e insuperável chamada RAZÃO, o que resta ao professor e à professora que tentam educar pressupondo a realidade social, da coisa pública compartilhada e do bem comum que se realiza graças à contribuição de todos e todas, e não apenas a da existência do mercado, esse ente cujo lastro é o contrato que a tudo mercantiliza e privatiza, inclusive as relações pedagógicas existentes no interior de uma sala de aula?