Inclusão: reflexões sobre suas possibilidades

Murilo Mendes escreveu um aforismo interessante. Diz ele que “Só não existe o que não pode ser imaginado” . Parafraseando o poeta, gostaria de dizer que só não conseguimos imaginar o impossível. A inclusão, dentro da dimensão mais sensata e mais humana que a escola já teve – a escola para todos – é totalmente possível. Não que seja fácil e rápido. Nem que não exija esforços. Não que dependa apenas da boa vontade de alguns poucos professores abnegados.

A inclusão no ensino regular de crianças com necessidades educacionais especiais significa um crescimento do Brasil como sociedade integrada ao contexto universal de direitos iguais para todos. E a escola para todos, como um dos símbolos dessa sociedade, precisa se concretizar, sair do discurso político e burocrático e firmar-se como uma política pública de todos nós. E sabemos que, para isso acontecer, ainda temos muito a fazer até que nossas crianças percebam-se incluídas de fato e de direito.

Um primeiro passo talvez seja a ação política do professor informado e consciente, agindo dentro da unidade escolar. É necessário fazer ver a todos que a escola precisa de um Projeto Político Pedagógico da comunidade. Se esta comunidade decidir incluir todas as suas crianças, independentemente de suas deficiências e necessidades, toda ela, toda a comunidade, precisará fazer valer as leis que protegem os direitos dessas crianças. Não é mais possível fazer concessão, fazer de conta que está tudo bem, fazer vistas grossas em relação àqueles que têm responsabilidades e não as cumprem. Pressionar direção e coordenação, família, Conselho Tutelar, Ministério Público etc. e tudo o que mais for necessário para verem atendidas as necessidades das crianças.

Um segundo movimento é discutir os paradigmas da escola, sobretudo um dos mais dificultadores da inclusão: a feição homogeneizadora da educação. Nossa escola não pode querer que todas as suas crianças aprendam da mesma maneira e o mesmo conteúdo no mesmo tempo e com a mesma qualidade de aprendizagem. O importante é o crescimento pessoal a partir das potencialidades, dentro de um tempo também pessoal. Enquanto todos forem nivelados com a homogeneização, nenhuma inclusão será possível. A escola para todos requer um paradigma novo, o da heterogeneidade, o da diversidade – o da rica diversidade que nos constitui como seres singulares com saberes distintos uns dos outros.

Há ainda que se falar em discussão dentro da comunidade sobre o malefício da discriminação e sobre os benefícios trazidos pela convivência com o diferente. No mundo contemporâneo, em que tudo caminha para uma supermassificação e que olha todos como consumidores em potencial e homens cada vez mais “perfeitos”, a escola precisa caminhar na contramão disso tudo. Ela precisa respeitar as diferenças entre as pessoas e respeitá-las em suas individualidades. Sem o respeito pelo diferente, também não será possível a inclusão. O fim do preconceito se dá por meio da informação transparente, contínua, séria. Aqui também não se pode abrir exceção: toda discriminação precisará ser debatida e rechaçada.

Por derradeiro, é preciso dizer que, sem vontade política e sem consciência humanizadora, pouco acontece. Do mais ilustre senador da República ao mais simples porteiro da escola, todos precisam acreditar na possibilidade de mudança da sociedade em que estamos inseridos. Cada um dentro da responsabilidade que lhe afeta. Aqui, a crença no poder do ser humano é fundamental. É somente acreditando que todos podem e todos têm direito aos bens culturais e sociais que poderemos, um dia – quem sabe brevemente –, viver a inclusão como a grande conquista dos brasileiros de bem do século XXI.