A EDUCAÇÃO SEXUAL RIBEIRINHA: PRÁTICA CRÍTICO-FILOSÓFICA FREIREANA NA COMUNIDADE DO POÇÃO EM COTIJUBA-PA

Resumo

Este trabalho tem como objetivo apresentar as principais atuações, atividades realizadas e resultados obtidos ao longo de oito meses de atuação do Eixo de Educação Sexual pelo Projeto Pará Leitura Vai-Quem-Quer, entre os anos de 2012 e 2013, tendo como lócus principal a localidade de Cotijuba-Pa e como segundo espaço de práticas a Região metropolitana de Belém-Pa. A prática de Educação Sexual proposta realiza-se em diálogo com os saberes experienciais dos educandos, tendo por base a filosofia e os pressupostos educacionais de Paulo Freire. Trata-se de uma abordagem participativa que buscou relacionar os saberes curriculares e os conceitos existentes, prévios ou escolarizados dos participantes, sobre sexualidade. Os resultados foram obtidos através de falas, imagens e dos questionamentos transcritos da “Caixa de Segredos”, observando-se, também, as possíveis alterações comportamentais e/ou conceituais dos participantes. O registro dessas atividades foi feito através de relatórios e fotos. Para sistematização e coleta de dados foram construídas categorias temáticas. Entre os resultados desta pesquisa destacamos a dialogicidade atingida ao longo da prática, tanto com os participantes quanto a partir deles e de suas vivências, confirmando a filosofia crítica e os pressupostos freireanos como instrumentos viáveis para uma prática efetiva da Educação Sexual que permitiram aos educandos uma compreensão mais âmpla sobre a sexualidade e as relações de poder que as constituem. Como resultados obtidos, ressaltamos a importância deste trabalho para a (re)descoberta da identidade dos sujeitos participantes, a compreensão da sexualidade como elemento vital e presente no cotidiano do ser humano, perpassando a visão biologicizante e preventiva da questão sexual e permitindo a vivência plena da sexualidade e das relações interpessoais que a permeiam.

Palavras-chave: Educação Sexual, Educação Popular, Filosofia, Pedagogia Freiriana, Sexualidade.

Abstract

This paper aims to present the main performances, activities and results over eight months of operation Axis Sexuality Education Project at Para Leitura Vai-Quem-Quer want between the years 2012 and 2013, having as the main locus locality Cotijuba-Pa and as second space practices metropolitan region of Belém-Pa. The practice of sex education proposal takes place in dialogue with the experiential knowledge of students, based on the educational philosophy and assumptions of Paulo Freire. It is a participatory approach that sought to relate the curricular knowledge and existing concepts, previous or educated participants about sexuality. The results were obtained through speech, images and transcripts of the questioning "Box of Secrets", noting also the possible behavioral changes and / or conceptual participants. The record of these activities was done through reports and photos. To systematize and data collection were built themes. Among the results of this research highlight dialogicity achieved over the practice, both as participants from them and their experiences, confirming the critical philosophy and assumptions Freirean as viable instruments for effective practice of sex education that allowed students to one broader understanding of sexuality and power relations that constitute them. As results, we emphasize the importance of this work for the (re) discovery of the identity of the participating subjects, the understanding of sexuality as a vital element and present in everyday human, passing the vision biologicizante and preventive sexual issue and allowing the full experience sexuality and interpersonal relationships that permeate it.

Keywords: Sex Education, Adult Education, Philosophy, Pedagogy Freire, Sexuality.

 

1. INTRODUÇÃO

Este artigo tem como objetivo documentar a prática da Educação Sexual crítico-filosófica, embasada pelos pressupostos freireanos e pela Educação Popular, realizada na ilha de Cotijuba, tendo como lócus principal a comunidade do Poção-PA e em segundo espaço escolas públicas, aleatórias, da região metropolitana de Belém e interiores do Estado.

A proposta consiste em uma abordagem qualitativa, com utilização de grupos de discussão de diversas faixas etárias nos municípios do interior do estado e, no caso específico da comunidade do Poção, na implantação e acompanhamento desse grupo de discussão em uma escola multisseriada, com crianças de faixa etária entre 6 e 16 anos, ao longo de todo o ano letivo, buscando trabalhar a compreensão e o aprofundamento dos conceitos sobre a sexualidade humana, a identificação e a análise crítica dos papéis sexuais de homens e mulheres na sociedade e relacionando os saberes escolares ao conhecimento prévio dos educandos, visando possibilitar a vivência plena e segura da sexualidade.

A sexualidade é entendida por nós como condição básica para a existência pessoal, dimensionada em um processo biológico, psicológico, sociocultural e existencial do indivíduo. Estes processos definirão a formação do EU, a abertura ao outro (TU), as relações interpessoais (NÓS), e ao mundo, a expressão social do ser homem e do ser mulher, expressão e consciência de vida e morte e o agir moral (BRASIL, 2006).

Paulo Freire ressaltava em seus escritos que era preciso à escola adequar-se às necessidades da sociedade, fazendo com que o indivíduo assimilasse o que lhe era útil para tornar-se um cidadão crítico e transformador. Desta forma, associando-se este conceito ao pensamento filosófico, temos a curiosidade latente dessas faixas etárias, necessitada de espaço para fluir e à qual propomos uma discussão realizada pela criança ou adolescente e não para eles, de forma que nos sejam apresentados os conceitos que estes formulam fora do meio escolar e as dúvidas que, normalmente, a escola desconhece e deixa, portanto, de nortear.

Nesse contexto, a Filosofia é percebida como via dialética para a discussão das questões sexuais, por considerar-se que nela se confrontam o senso comum e a criticidade do indivíduo, como afirma Goldman (1979 apud NUNES, 1996) ao dizer que "A filosofia é uma tentativa de resposta conceitual aos problemas humanos fundamentais tal como estes se apresentam em certa época numa determinada sociedade.".

Conjuntamente ao uso da Filosofia, inserimos na proposta educacional o conceito freireano de respeito e valorização dos saberes do educando:

[...] pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à escola, o dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os das classes populares, chegam a ela saberes socialmente construídos na prática comunitária – mas também discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes em relação com o ensino dos conteúdos. (FREIRE, 1996: 30)

Oliveira (2003) completa esta definição quando afirma que a visão de mundo de cada ser humano é “produto de seus questionamentos e reflexões sobre as ações, os sentimentos e as ideias extraídas da vivência cotidiana e geradas pela curiosidade” (p.24). E a curiosidade nada mais é do que o “motor” que movimenta as crianças e adolescentes na busca de sua própria identidade, uma identidade que também se forma na construção de sua sexualidade.

Neste artigo apresentamos inicialmente a educação sexual crítica construída com base nos pressupostos filosófico-dialético de Paulo Freire, seguida da aplicação da proposta em uma escola ribirinha, multisseriada e dos resultados obtidos da sistematização de dados e observações.

2. O Projeto Pará Leitura Vai-Quem-Quer: o eixo de Educação Sexual – metodologia e fundamentação

O Projeto Pará Leitura Vai-Quem-Quer teve seu início a partir de uma atividade acadêmica, realizada no segundo semestre de 2010, na ilha de Cotijuba (comunidade de Vai-Quem-Quer), quando foram realizadas simultaneamente atividades de concientização ambiental, resgate cultural, incentivo à leitura, ludicidade, construção linguística e contação de histórias. Na oportunidade foram atendidas aproximadamente 260 crianças com idades variadas entre 2 e 16 anos em um dia intenso de práticas pedagógicas.

Após um ano de ações ocasionais foram retomadas as atividades, organizando e estruturando o projeto e dando surgimento a três eixos que direcionariam a proposta: 1. Educação Ambiental, 2. Educação, leitura e ludicidade e 3. Educação Sexual. O projeto ressurgiu, então, com aproximadamente 12 acadêmicos dos 32 iniciais. Após três anos de atuação na localidade do Poção o Projeto Pará Leitura Vai-Quem-Quer conta com aproximadamente 25 integrantes e tornou-se um forte aliado do processo educacional da Escola Anexo Pedra Branca, lócus de sua prática.

Destacamos aqui o Eixo de Educação Sexual cuja proposta centra-se na aplicação de uma prática crítico-filosófica, orientada pelos pressupostos freireanos do respeito aos saberes do educando e pela dialogicidade como mediadora educacional. A prática proposta tem gerado excelentes resultados, mostrando-se eficaz aliada do processo educacional.

As discussões geradas pelas temáticas propostas pelos educadores e pelos educandos, resultaram em relatos pessoais, explicitação de conceitos, tabus e mitos extra-escolares e foram registradas através de relatórios e fotos, observando-se, principalmente, as possíveis mudanças conceituais e comportamentais, ainda que apenas ocasionais. Também foram construídas categorias temáticas que permitiram o agrupamento dos dados e a análise destes identificando, em maior ou menor grau, as que requeriam aprofundamento teórico e/ou dialógico e que auxiliaram o planejamento das atividades seguintes.

A necessidade de desenvolver-se uma pesquisa que enfoque as questões da sexualidade na comunidade de Cotijuba-PA se configura quando torna-se perceptível que as relações de poder estabelecidas nesse espaço caminham lado a lado com as questões de gênero, por exemplo, e que as problemáticas sociais que envolvem a sexualidade, como os altos índices de gravidez adolescente e de violência doméstica e/ou sexual são, muitas vezes, reforçadas pela escola, em virtude da evidente omissão na ação educativa e pela negativa em tomar posicionamento.

3. Práticas Pedagógicas na Ilha de Cotijuba – Comunidade do Poção

a) Reconhecendo os sujeitos: áreas alagadas e sanguessugas

No dia 13 de março de 2012 foi dado início às atividades do “Projeto Pará Leitura Vai-Quem-Quer” na comunidade do Poção, ilha de Cotijuba-PA. Formamos um grupo de aproximadamente doze pessoas que saiu da residência da Coordenadora docente, Profª Izilda Cordeiro, no Vai-Quem-Quer rumo à comunidade do Poção. O objetivo era fazer o levantamento das famílias residentes ao longo do caminho e nas proximidades da escola Anexo Pedra Branca, que possuissem crianças matriculadas nessa escola.

Ao longo de uma caminhada de duas horas foram encontradas tanto residências quanto igrejas diversas. A maioria delas estava fechada, por se tratar de final de semana, quando os pescadores vão para o porto de Icoaraci vender pescado.

As famílias mais próximas à escola Anexo Pedra Branca tinham em média de 3 a 6 crianças, com idades variadas. No levantamento realizado a problemática mais evidente era referente a Meio Ambiente, porém, após alguns minutos de diálogo com as crianças, principalmente, identificamos questões relevantes para a Educação Sexual, como gravidêz precoce, violência doméstica, discriminação de gênero e abandono do lar por parte dos adolescentes. Estas questões foram as que nos deram instrumentos iniciais para formular e justificar a proposta de Educação Sexual.

A caminhada e o levantamento prosseguiram até uma área próxima à entrada da comunidade Fazendinha, quando fomos obrigados a retornar devido ao alagamento comum no período de março, impedindo nossa passagem, tanto pela dificuldade de transposição quanto pela possibilidade de jacarés nessas áreas. A última casa cadastrada encontrava-se em uma área alagada, a qual alguns de nós se arriscaram a atravessar e que se encontrava infestada por sanguessugas.

A ação seguinte foi realizada no dia 18 de Junho de 2012, na própria escola Anexo Pedra Branca, contando com a presença da equipe de filmagens do programa “UEPA nas Comunidades” que registrou as atividades realizadas. Neste dia foram atendidas aproximadamente 30 crianças e as atividades começaram com atraso devido a problemas com o bondinho que faria o transporte do grupo.

O Eixo de Educação Sexual, último a se apresentar, iniciou bastante atrasada, ressaltamos, devido à repetição constante de tomadas gravações das atividades anteriores. O objetivo era trabalhar questões de gênero, mas nos deparamos com o acanhamento das crianças ocasionado pela presença de adultos, tanto das filmagens quanto pais e educadores.

Contudo, fez-se uma relação da temática com o cotidiano e percebemos que as crianças apresentavam bem definida a divisão de gêneros, porém não ficou muito clara sua origem. Algumas crianças não reconheciam o trabalho das mães enquanto catadoras de açaí ou construtoras de embarcações, relacionando-as com o trabalho doméstico apenas. Esta ideologia perpassava as questões escolares e se apresentava socialmente na diferenciação de jogos e brincadeiras, configurando posicionamentos machistas por parte das crianças.

Consideramos que a ação realizada apresentou sérias restrições, foi satisfatória para dar uma noção da construção social e dos conceitos criados na comunidade. É necessário salientar ainda que a presença da equipe de filmagens da UEPA dificultou muito o andamento e a continuidade das ações dos eixos, por causa da constante repetição das tomadas e da “montagem” de cenas que, em nosso entendimento, deveriam ter sido registradas mantendo-se a naturalidade e veracidade dos acontecimentos.

b) Discutindo a Família

No dia 16 de março de 2013, deu-se a ação que tratou sobre família. Conversamos com as crianças sobre alguns conceitos de sexualidades, a respeito do papel de cada um dentro da família, levando em conta que o encontro tinha como tema central “a importância da família”.

Foi feito um círculo dialógico, onde desmistificamos a questão dos papeis específicos de homens e mulheres dentro da família, dando alguns exemplos de funções estabelecidas para as mulheres que os homens desempenham e vice-versa, e logo eles começaram a perceber o próprio cotidiano e a dar mais exemplos. Aproveitamos para trabalhar a questão de gênero e os papéis socialmente instituidos e determinados, mostrando-lhes que cada um possui uma função importante, mas que não podemos determinar isso pelo gênero.

Baseadas na conversa inicial, realizamos atividades através de colagens de revistas, propondo que recortassem uma imagem que representassem a família e outra que representasse algo de que gostassem. O grupo foi dividido em 3 grupos pequenos, e cada integrante ficou auxiliando o grupo menor. Paralelamente foi sendo dialogado o conceito pessoal que tinham sobre sexualidade. A partir dessas atividades pudemos observar que muitos possuem a família tradicionalmente constituida (pai e mãe), mas outros apenas demonstraram nas imagens que deveria haver carinho e amor, dando a entender que esses sentimentos se fazem presentes para a maioria das famílias.

Em relação aos fatos observados e registrados por nós, percebemos que a maioria das meninas escolheu imagens com bonecas e maquiagem e os meninos imagens relacionadas a futebol e carros. Já as crianças com uma idade maior, demonstraram interesse por imagens que representavam o sexo oposto.

c) Questão de Gênero – brinquedos de menina e brincadeiras de menino

No dia 20 de abril de 2013, a temática desenvolvida foi “Trabalhando os gêneros por meio da ludicidade”, escolhida na ação anterior pelos educandos. O direcionamento foi dado em conjunto com a ideia do brincar, relacionando a temática aos brinquedos utilizados por eles.

Iniciamos o tema em um círculo dialógico, perguntando aos alunos sobre os brinquedos de menino e de menina, em como eles dividem seus brinquedos. Metade do grupo afirmou que existem brinquedos só de meninas (boneca, casinha, etc) e somente de meninos (carrinho, boneco, entre outros). Algumas meninas afirmaram que “Quando eles brincam de bola não me deixam participar”, “Menino não pode brincar de boneca, senão os outros falam”, explicitando o preconceito enraizado cultura e historicamente nas relações interpessoais. Em seguida, dividimos o grupo em dois subgrupos (à escolha das crianças) para confeccionar um cartaz. Foram apresentados a eles alguns brinquedos pedindo que identificassem quem podia ou não utilizá-los.

É interessante notar, que tivemos duas respostas distintas novamente, as crianças maiores afirmaram que os brinquedos são de todos, já as crianças menores fizeram a divisão entre meninos e meninas. Trabalhamos a noção de brincar em conjunto e de diversão em grupo. Finalizamos esta ação com a “Caixa dos segredos”, na qual as crianças fizeram desenhos e escreveram frases sobre a temática abordada. Esta ação foi muito proveitosa e prazerosa tanto para as crianças quanto para os educadores, pela troca de experiências e de conhecimentos predominantes nas atividades. Entende-se, aqui, a discussão de gênero como o questionar concepções e construções sociais.

Segundo Albernaz (2009), “gênero e política se cruzam, porque ambos constituem a história da humanidade e nos informam (ou nos confundem) sobre quem somos”. Contudo, modificando uma dada configuração tradicional de gênero, alteramos os rumos da nossa própria história; desmitificando, por exemplo, que a mulher deve cuidar do lar e que o homem tem que sair para trabalhar. Para a autora,

Sensibilizar sobre as relações de gênero é algo que vai muito além do que juntar meninos e meninas nos trabalhos escolares ou dar o mesmo presente a meninos e meninas no dia das crianças. Não é uma mudança apenas racional, pois mexe com as emoções, com relações investidas de afeto, além de incidir nas estruturas institucionais. (ALBERNAZ, 2009, p.89).

Desta forma, a questão de gênero se encontra permeando a construção identitária das crianças e adolescentes acompanhados na comunidade do Poção e se torna extremamente relevante a sua ampliação dialógica, para que os educandos deem continuidade aos questionamentos que iniciaram com as atividades desenvolvidas.

d) Educação Sexual no espaço urbano – Capacitação docente em Marituba-PA

Em 16 de junho de 2012, através do Programa “UEPA nas Comunidades” realizado no Município de Marituba, na comunidade da antiga Invasão Ché Guevara, realizou-se atividade de Capacitação Docente em Educação Sexual com os professores locais. Encontravam-se presentes aproximadamente 20 docentes de diversas áreas disciplinares e níveis escolares, com idades entre 24 e 57 anos.

A atividade foi desenvolvida em quatro momentos principais que envolveram nessa ordem atividades de compreensão da temática, diferenciando-se sexo e sexualidade; as diferenças de desenvolvimento por nível de escolaridade; o reconhecimento pessoal dos presentes, conceitos, mitos, tabus e crenças individuais e por último a “Caixa de Segredos” onde cada um colocou suas dúvidas e questionamentos sobre a temática. Cada momento foi desenvolvido apresentando metodologias e propostas de abordagens diferentes, contando com músicas, vídeos, filmes, livros, comerciais, panfletos, sites, dinâmicas e atividades escritas. Algumas das dinâmicas foram exemplificadas durante a ação.

Destacamos que na “Caixa dos Segredos” obtivemos questões de grande relevância, como: Como falar de sexo oral e anal, o que abordar sobre família, como e o que falar da primeira relação sexual, o que era “ménage a true” e as desvantagens de realizar com o marido, dificuldades de falar sobre relação homossexual, como abordar violência sexual na adolescência, relacionar drogas e sexo, qual a forma correta de ajudar os casos de abuso sexual, como falar do aborto, o que fazer nos casos de gravidez na adolescência.

Chamou nossa atenção o fato de nenhum dos presentes saber que as cores de um desenho (vermelho ou preto) ou o ato de rabiscar os genitais das pessoas desenhadas é um indício forte de abuso sexual. As respostas foram satisfatórias e diversificadas, havendo relatos pessoais onde se afirmava não sentir-se à vontade para falar da temática ou apresentavam a ausência de diálogo em família como causadora de uma certa “timidez” que refletia na prática escolar, porém, no decorrer do encontro, as vivências e traumas foram sendo explicitados e o diálogo sobre a sexualidade individual ou social ocorreu naturalmente.

e) Falando de Sexualidade em Bujarú – O Impacto inicial e a Descoberta

No dia 19 de maio de 2013, foi realizada uma oficina no município de Bujaru, com o tema “Desvendando a sexualidade”, onde foi encontrado principalmente o publico jovem a partir de 16 anos, sem limite de idade. Pertencia ao planejamento 5 momentos de envolvimento, realizou-se uma dinâmica de descontração e fez-se explicação sobre sexualidade no dia-a-dia. No momento seguinte foi feita a construção de cartazes pelos participantes com o título “eu e a sexualidade” onde procurou-se a identificação de cada um com seu interior; utilizou-se a música “Amor e Sexo” – Rita Lee, para falar sobre relações afetivas e em seguida foi posto um vídeo explicativo sobre ética e gênero para, só então, abrir o espaço para perguntas e respostas através da “caixa dos segredos”.

O processo avaliativo apresentou-se desde a ornamentação da sala e seu entorno, até o ultimo momento dentro da sala, identificando-se diversas reações externas e internas ao espaço utilizado. As pessoas mais velhas, sentadas fora da sala, reagiram com certa “indignação” pelo tema proposto e os mais jovens com receio de adentrar à sala da prática, geralmente por temor à reprovação dos mais velhos.

O inicio da apresentação contou com apenas 3 participantes. A partir de então novas pessoas se adentraram ao espaço, principalmente pelo trabalho de insistência de alguns integrantes em sair da sala e dialogar com as pessoas que estavam fora. Destacamos como resultados de observação que durante a construção dos cartazes percebeu-se um adolescente que, claramente, tinha dificuldades em encontrar imagens femininas que o agradassem como objetos de desejo e só as utilizou quando foi esclarecido a todos que as imagens podiam significar o que eles gostariam de ser, algo com que se identificassem. Damos destaque, também, à participação de senhoras de meia idade cuja contribuição histórica foi bastante relevante, por referir-se à forma como a sexualidade era direcionada pela família em décadas anteriores e nos resultados dessa castração.

A mudança de conceitos sobre a sexualidade foi visível e a relação desta com o cotidiano foi claramente compreendida pelos participantes, o que consideramos extremamente satisfatório.

Considerações Finais

A sexualidade vem se transformando, ao longo dos anos, em um ponto importante de discussão e prática pedagógica. A partir da compreensão da sexualidade como parte do cotidiano e da constituição dos sujeitos sociais, tem-se a noção plena da necessidade de amplificar seus conceitos e mudar a forma como ela vem sendo trabalhada educacionalmente.

O espaço ribeirinho não se encontra distanciado dessa temática. Sob efeito constante do processo de globalização, este ambiente social e escolar sofre alterações constantes em suas estruturas, na formação de seus sujeitos, na compreensão destes sobre seu cotidiano e sobre si mesmos.

As questões de gênero encontram-se presentes não apenas no brincar, mas na divisão de espaços por meninos e meninas, na divisão de papéis sociais e nas relações de poder socialmente instituidas, sendo um dos elementos mais fortes da sexualidade e ao qual se deve dar especial atenção, também por ser um elemento que possibilita a identificação de outras problemáticas, como a violência familiar. As atividades desenvolvidas permitiram confirmar esta afirmação e chamaram a atenção para o caminho a ser percorrido para atingir novas possibilidades dialógicas.

A proposta crítico-filosófica, participativa e em diálogo com os saberes experienciais dos educandos, mostra-se, ao longo da prática, o caminho adequado para uma Educação Sexual que atinja os objetivos propostos pela Transversalidade.

REFERÊNCIAS

ALBERNAZ, Lady. Para compreender gênero: uma ponte para relações igualitárias entre homens e mulheres. Recife: UFPE, 2009.

BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos – Apresentação dos Temas Transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998 e 2006.

CHAUÌ, Marilena. Convite à Filosofia. 11ª Ed. São Paulo: Ática, 1999.

FREIRE, Paulo & SHOR, Ira. Medo e Ousadia: O Cotidiano do Professor. Lopez, Adriana (trad.). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.

____________. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e terra, 1996 (Coleção Leitura).

____________. Pedagogia do Oprimido. 4ª ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1977 e 1987.

____________. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1967.

FREUD, Sigmund. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. In: Obras psicológicas completas de Sigmund Freud. vol. VII. Imago, 2006.

OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno de. Filosofia da educação: reflexões e debates. 2 ed. Belém, PA: Unama, 2003.

Gaby Faval, Amanda Sousa Dias, Amanda Paixão Montenegro, Luane Mourão Bayde, Dandara Karolenny Brito e
Enviado por Gaby Faval em 10/03/2014
Código do texto: T4722536
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.