Antiquarismo: O gosto por Antiguidades e a reconstituição do passado

Na Antiguidade, os romanos mais ricos tinham um grande interesse por ruínas, esculturas, monumentos e fragmentos de civilizações passadas, especialmente dos gregos. Esses materiais eram utilizados como decoração para suas residências, símbolo de poder e exaltação política e étnica. Durante o Humanismo dos séculos XIV e XV, o gosto pelas antiguidades continuou sendo um interesse dos sábios, que recuperavam textos, moedas, esculturas, leis, e, deles, tiravam exemplos políticos e morais. Nos séculos XVII e XVIII, com uma Europa abalada por uma crise espiritual travada desde o século XVI entre protestantes e católicos, surge um ceticismo em relação à credibilidade das ciências e das criações humanas. Em oposição à essas dúvidas, filósofos criaram métodos científicos para validar as ciências naturais. Os métodos por eles criados eram empíricos matemáticos. A História, por ser propensa a diferentes pontos de vista e análises, não poderia ser comprovada através de métodos matemáticos e pelo empirismo. A escrita da História ficou relegada à condição de mero registro de fatos duvidosos, utilizados apenas para leitura agradável e exaltação política.

Com a História relegada a uma posição inferior, restou aos colecionadores e donos de antiquários, que não eram necessariamente historiadores, dar continuidade à produção histórica. Nos antiquários, eram recuperados documentos, bulas papais, esculturas, moedas, insígnias e fragmentos de ruínas, como foi o caso da redescoberta, no século XVIII, das cidades de Herculano (1738) e Pompéia (1748). Dessa atividade de recuperar objetos antigos, surge a Arqueologia no século XIX, que se torna uma das ciências auxiliares da História. Os antiquaristas dedicavam sua atenção para a reconstituição dessas peças, que tinham muito a dizer sobre a época em que foram produzidas. Essa atividade era somada ao método de analisar criticamente documentos oficiais e outros registros. Dessa forma, o antiquário não precisava "prestar" contas para os métodos matemáticos, pois seus objetos de estudo eram físicos, testemunhos vivos de uma época passada e com pouca possibilidade de terem sido falsificados. No entanto, devemos pontuar as diferenças entre o antiquário e o historiador nos séculos XVII e XVIII: O antiquário preserva, analisa empiricamente suas peças, e delas tira informações sobre o passado. O historiador presa a narrativa e as lições morais e políticas que dele podem ser retiradas. O antiquário não tem um interesse moral ou político, apenas a curiosidade pelo passado como ele pode ser desvendado.

Sobre as obras dos antiquários, podemos citar duas: A História Universal Demonstrada com Monumentos e Ilustrada com Símbolos dos Antigos (1697), de Francesco Bianchini; e A História e Antiguidades do Erário dos Reis de Inglaterra (1711), de Thomas Madox. Da obra de Madox temos mais informações. Esse antiquário inglês, utilizando documentos desde a época da conquista Normanda, traçou, como o próprio título de sua obra diz, as origens das riquezas do estado inglês. Madox, em uma análise crítica, utilizou documentos oficiais, assinados por funcionários, e que, em sua opinião, eram mais confiáveis que outras formas de registro, como cartas ou relatos de terceiros.

A História, desde que começou a ser escrita, sempre foi posta a dúvida, seja por seus praticantes ou por cientistas de outras áreas. O debate sobre os métodos para escrevê-la existem desde os tempos de Heródoto e Tucídides, quando se discutia a utilização de relatos de terceiros ou a observação pessoal dos fatos. A historiografia sobre a contribuição dos antiquários para a história ainda está, segundo o professor Auxiliomar Ugarte, por fazer. Talvez o pontapé inicial dessa pesquisa seja registrar a importância da metodologia dos antiquários para a história como ciência, pois podemos perceber que os métodos críticos, empíricos e arqueológicos desses profissionais tem certa semelhança nas metodologias utilizadas por historiadores da área da História Antiga.

FONTES:

HADDOCK, B.A. Uma Introdução ao Pensamento Histórico. Tradução de Maria Branco. Lisboa: Gradiva, 1989.