SEXUALIDADE AOS OLHOS DA RELIGIÃO

SEXUALIDADE AOS OLHOS DA RELIGIÃO:

RAIMUNDO DOS SANTOS LIMA

RESUMO: A sexualidade é um tema amplo e complexo, não se pode afirmar que exista um conceito único que possa agradar a todos os estudiosos do tema, sabe-se que ele existe desde os primórdios da história do homem e tem ao longo dos anos passado por inúmeras transformações, dependendo da realidade, do tempo e da sociedade em que está inserida, sua visão e aceitabilidade pode ser diferir de maneira assustadora. Cada sociedade cultiva determinados valores morais e éticos que podem ser vistos por outros grupos sociais como indecorosos e inaceitáveis, mas são visto sem preconceitos em sua origem, pois sua cultura assim o permite. A relação existente entre sexualidade e religião se estende há muitos séculos, precisamente desde o inicio da era cristã, pois somente após a morte e ascensão do Senhor Jesus Cristo é que seus discípulos começaram a pregar o evangelho nos moldes em que o conhecemos atualmente, em que cada homem deveria ser marido de uma só mulher, esposo e esposa devem fidelidade um ao outro, o sexo só é permitido após o casamento e dentro dele, sendo condenado todo e qualquer tipo de relacionamento sexual antes e fora do casamento.

Palavras-chave: Sexualidade. Religião. Igreja. Deus. Jesus. Moral. Ética

ABSTRACT

Sexuality is a broad and complex topic, one can not say there was a unique concept that can appeal to all students of the subject , it is known that it existed since the dawn of human history and has over the past years by numerous transformations , depending on the reality of the time and society in which it operates , its vision and acceptability can be differ frightening way . Each society cultivates certain moral and ethical values that can be viewed by other social groups as unseemly and unacceptable , but without biases are seen in its origin , because their culture allows. The relationship between sexuality and religion stretching back many centuries , precisely since the beginning of the Christian era , because only after the death and ascension of Jesus Christ that his disciples began to preach the gospel in the manner in which we know it today , in that every man should be the husband of one wife , husband and wife are faithful to one another , sex is only permitted after the wedding , and within it , being condemned any kind of sexual relationship before and outside of marriage .

Keywords: Sexuality. Religion. Church. God. Christ. Ethics

1 INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos tem-se encontrado certo grau de dificuldade para conceituar o tema sexualidade uma vez que existem entendimentos marcados pelo senso comum de que essa expressão remeteria a exposição do corpo, bem como ao envolvimento intimo entre duas pessoas.

Entretanto, cientificamente esse conceito pode ser compreendido como de outra maneira, pois segundo Scottini (2009, p.496) “sexualidade é o conjunto de característica que determinam o sexo de uma pessoa”. Sob essa ótica, percebe-se que os conceitos nutridos por muitas pessoas são equivocados.

O concito de religião também pode ser construídos a partir dos valores de cada pessoa. Segundo Chauí (2002) religião seria um conjunto de sistemas culturais e de crenças, incluindo visões de mundo diferentes, que estabelece os símbolos e relacionam a humanidade com a espiritualidade e seus próprios valores morais.

Ainda de acordo com Chauí (2002) muitas religiões têm narrativas, símbolos, tradições e histórias sagradas que se destinam a dar sentido à vida ou explicar a sua origem, bem como a do universo, ela acredita que religiões influenciam a moralidade, a ética, as leis religiosas ou um estilo de vida preferido de suas ideias sobre o cosmos e a natureza humana.

Outros conceitos podem ser encontrados, pois muitos escritores definem de acordo com suas óticas sobre o mundo, entretanto neste artigo ater-se-á ao conceito bíblico encontrado no livro de Tiago no novo testamento, pois representa de forma coerente e sem ambiguidade a visão deste trabalho.

Se alguém entre vós cuida ser religioso e não refreia a sua língua, antes engana o seu coração, a religião desse é vã. A religião pura e imaculada para com o Pai é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e guardar-se da corrupção do mundo (TIAGO, 1.27).

Percebe-se no fragmento acima que a religião é mais que um conjunto cultural de valores, refere-se aos cuidados em guardar os mandamentos bíblicos, desprovido de vaidades, interesses pessoais e principalmente o homem deve ter como meta primeira em sua vida aproximar-se de Deus e ter com ele uma relação de intimidade, de respeito e amor.

Partindo dos conceitos de religião e sexualidade, este artigo discutirá a visão que se tem desse tema dentro de algumas religiões no Município Amapaense de Ferreira Gomes, nesse sentido será abordado o tema de acordo com o pensamento de alguns líderes de igrejas do referido Município.

Incialmente é de bom tom lembrar que na visão deste artigo a sexualidade é inerente a todo ser humano, uma vez que todos pertencem a um sexo, feminino ou masculino. O sentimento sexual está presente desde o nascimento do bebê, considerando que segundo Freud (1936) a sexualidade perpassa pela questão do prazer.

Nesse sentido este assunto será debatido amplamente nas páginas seguintes deste trabalho, entretanto a questão sexual passa obrigatoriamente pelo crivo da moralidade, da ética e dos bons costumes para que suas manifestações sejam aceitas pela comunidade dentro dos padrões vistos como normais.

Ressalta-se, entretanto, que esses padrões ditos normais são um conjunto de regras estabelecidas e obedecidas a milhares de ano pela maioria dos membros de uma determinada sociedade, não significa dizer que estejam certos ou errados, mas que são diferentes.

Esses padrões de comportamento variam de uma cultura para outra, logo, o que pode ser visto como aceitável em uma determinada cultura ou país pode ser entendido como deplorável em outra. Ao se analisar a questão do casamento em sociedades antigas, nas quais os homens podiam casar-se com várias mulheres, para os brasileiros tal atitude não só é reprovável do ponto de vista moral, mas também é crime previsto em lei.

A moral é um conjunto de deveres e ações consideradas obrigatórias em cada sociedade, é decorrente de discussões entre membros do próprio grupo e que pré-estabelecem as normas que deverão orientar as inter-relações pessoais dos membros daquela sociedade, sendo passível de punição o membro dela que desrespeitar uma das regras.

Essas normas a que todos os membros da sociedade estão submetidos podem ser determinadas por força de lei ou simplesmente por conhecimentos repassados de geração a geração ou ainda por doutrinas religiosas. Entretanto, é válido ressaltar que a maioria absoluta das regras existentes na sociedade e inclusive as leis são frutos de entendimento bíblico, ou seja, a Bíblia é a origem de todas as regras existentes na sociedade.

Percebe-se que na sua maioria absoluta tanto as regras quanto as leis que norteiam as relações interpessoais nas sociedades tem sua origem no livro de Êxodo, precisamente no capítulo 20, em que a redação estabelece as normas de comportamento que os membros da sociedade hebraica deveriam obedecer.

2. A SEXUALIDADE

Segundo Chauí (2002), sexualidade é um termo amplamente abrangente que engloba inúmeros fatores e dificilmente, portanto, não se encaixa em uma definição única e absoluta. É, portanto, um tema que exige ampla discussão e análises criteriosas, visando sua elucidação, é sempre de bom tom separar sexualidade de desejo ou exposição sexual.

A sociedade por vezes, confunde comportamentos inadequados, modos de vestir que expõem o corpo, forma de falar e agir como sendo sexualidade, entretanto esse conceito necessita de uma revisão, uma vez que o comportamento inadequado com as normas pré-estabelecidas pela casta da sociedade pode não retratar sexualidade e sim revolta juvenil.

Teoricamente, a sexualidade nos moldes como é amplamente conhecida, inicia-se juntamente com a puberdade ou adolescência, o que deveria ocorrer por volta dos 12 anos de idade, segundo preconiza o Art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Entretanto, na prática, sabe-se que não se configura exatamente desta forma.

Chauí (2002) afirma que o termo “sexualidade” remete a um universo onde tudo é relativo, pessoal e muitas vezes paradoxal. Pode-se dizer que é o traço mais íntimo do ser humano e como tal, se manifesta diferentemente em cada indivíduo de acordo com a realidade e as experiências vivenciadas em seu dia-a-dia.

Ressalta-se que em determinadas sociedade ou mesmo em comunidades amapaenses, as meninas casam-se muito sedo, é comum principalmente nos interiores amapaenses ver-se meninas de 12 anos já casadas e com filhos no colo, isso é retrato da realidade local e algumas famílias aceitam isso com naturalidade.

Percebe-se, portanto, que a noção de sexualidade como busca de prazer, descoberta das sensações proporcionadas pelo contato ou toque, atração por outras pessoas de sexo oposto ou do mesmo sexo com intuito de obter prazer pela satisfação dos desejos do corpo, entre outras características, é diretamente ligada e dependente de fatores genéticos e principalmente culturais.

É inegável o fato de que o contexto social influi diretamente na sexualidade de cada pessoa, e por vezes se confunde o conceito de sexualidade com o do sexo propriamente dito. Pois sexualidade seria o conjunto de caracteres, inerentes aos seres humanos determinados pelo sexo do indivíduo, neste caso masculino ou feminino e não o desejo sexual emanado a partir do desejo de satisfação da carne.

Chauí (2002) acredita que sexualidade e desejo sexual não necessariamente precisam vir acompanhados um do outro. Cabe, portanto, a cada indivíduo decidir qual o momento propício para que esta sexualidade se manifeste de forma física e seja compartilhada com outro indivíduo através do sexo, que é apenas uma das suas formas de se chegar à satisfação desejada.

Percebe-se que a sexualidade é uma característica experimentada por todo ser humano e não necessita de relação sexual, pois se define pela busca de prazer, sendo estes não apenas os explicitamente sexuais. Pode-se entender como constituinte de sexualidade, a necessidade de admiração e gosto pelo próprio corpo, por exemplo, o que não necessariamente signifique uma relação narcísica de amor incondicional ao ego. Freud contribui com esse pensamento ao afirma categoricamente que:

A relação da criança com seu próprio corpo e não com outra pessoa, busca o prazer completo como uma forte motivação para o comportamento pessoal. O foco dessa fonte de prazer muda de acordo com a fase em que a criança está (FREUD, 1905, p.147).

O fragmento do texto acima deixa claro que o prazer através da sexualidade não se refere exclusivamente ao ato sexual realizado entre duas pessoas. O ser humano é movido e motivado por sensações de prazer, ou seja, suas realizações devem lhe proporcionar prazer, mas este pode vir de várias ações, seja através da alimentação, da inalação de um bom perfume, da leitura de uma boa literatura, do toque em um tecido de qualidade ou de carícias em seu próprio corpo.

Segundo Freud (1905) a função sexual existe desde o princípio da vida, logo após o nascimento do bebê e não somente a partir da puberdade, como afirmavam outros teóricos. Ele acreditava que o período da sexualidade é longo e complexo até chegar à sexualidade adulta, em que as funções de reprodução e de obtenção de prazer podem estar associadas, tanto no homem quanto na mulher.

Freud (1905) classificou a sexualidade em cinco fases distintas, segundo ele a primeira denominada “fase oral”, tem inicio no momento do nascimento da criança e se estende até os 18 (dezoito) meses, nessa fase a estrutura mais desenvolvida é a boca, é através dela que o bebê começa a provar e a conhecer o mundo e por onde também fará sua mais importante descoberta afetiva, ou seja, o seio de sua mãe.

No primeiro momento o prazer da criança advém do ato de sugar o seio da mãe no segundo momento quando a criança já possui dentes o prazer advém através da ação de mastigar. Segundo Freud (1905) é nesse momento que a criança percebe sua primeira capacidade concreta de destruição, através dos dentes ela pode destruir determinados objetos.

A segunda fase denominada “fase anal”, na opinião de Freud (1905) vai dos 18 meses aos três anos de idade, na visão de Freud nesse período o centro do prazer deixa de ser a boca e passa a ser o ânus, é nessa fase que a criança passa a controlar os esfíncteres prestando uma atenção especial à micção e à evacuação. Desperta também um interesse natural pela autodescoberta.

A terceira fase que Fred denominou de “fase fálica” vai dos três aos sete anos de idade, nela a criança centraliza suas atenções para as áreas genitais do seu corpo. Segundo Freud é nesse período que a criança e dá conta de que possui um pênis ou sente a falta dele, é nesse momento que a criança percebe a primeira diferença entre os sexos, ou seja, percebe a diferença entre homem e mulher. Freud afirma que para as meninas esse é um período crítico ele salienta que:

Daí partem três linhas de desenvolvimento possíveis: uma conduz a inibição sexual ou a neurose, outra à modificação do caráter no sentido de complexo de masculinidade, a terceira, finalmente, à feminilidade normal (FREUD, 1933 p.155).

A quarta fase que Freud denominou de “fase latente”, se estende dos sete anos até a puberdade, esse período é caracterizado como uma pausa na evolução da sexualidade, o que significa dizer que não se desenvolverá nenhuma nova organização da sexualidade nesse período, é nesse momento que surgem os sentimentos de pudor e repugnância.

Finalmente, a última fase de Freud denominada “fase genital”, tem inicio na puberdade e se estende por toda a vida, de acordo com a teoria psicanalista é atingir o pleno desenvolvimento do adulto normal. Essa é, portanto, a fase final do desenvolvimento libidinal, nessa fase, as pulsões parciais estão definitivamente integradas sob a primazia genital específica de cada sexo.

Vale ressaltar que a fusão entre o amor e o medo inicialmente é a responsável pela vontade de penetrar o universo moral e ser penetrado por ele'. O desenvolvimento da moralidade depende de fatores biológicos, cognitivos e afetivo-emocionais, associados às práticas educativas submetidas aos valores do grupo social em que a criança ou adolescente está inserido desde seu nascimento.

Não se pode e nem se deve que existem diferentes abordagens do tema que variam de acordo com concepções e crenças convenientes a cada um. Em alguns lugares podem-se encontrar visões preconceituosas sobre o assunto. Em outros, é discutido de forma livre e com grande aceitação de diferentes olhares ao redor do termo.

Seja qual for a visão íntima que se tem sobre o assunto, é interessante que se possa manter uma relação de compreensão e aceitação de sua própria sexualidade. O esclarecimento de dúvidas e a capacidade de se sentir a vontade com seus desejos e sensações, colabora imensamente ao amadurecimento desta, o que gera sensação de conforto e evita conflitos internos provenientes de dúvidas e medos, gerando uma experiência positiva e saudável.

A construção da identidade social na adolescência está, portanto, relacionada ao estabelecimento de relações afetivo-sexuais com o grupo de pares. Percebe-se que o discurso religioso não consegue êxito na regulação das práticas sexuais, as mudanças sociais no âmbito da família, das relações entre as diferentes gerações e de gênero provocaram uma confusão de valores na cabeça dos adolescentes atuais.

No contexto da construção da identidade do adolescente é de bom tom lembrar que de acordo com a teoria freudiana ao longo do desenvolvimento da criança a energia libidinal também conhecida como “pulsões sexuais”, tende a investir em diversos objetos à procura de satisfação instintiva, que corresponde à existência de uma zona erógena dominante, isto é, uma zona do corpo cuja excitação produz a satisfação libidinal.

A cada estágio do desenvolvimento corresponde a uma zona erógena dominante, o seu deslocamento provoca a sucessão de estágios. A criança desenvolve-se passando por um princípio do prazer controlado pelo princípio da realidade, nesse contexto, sua personalidade é formada socializando-se progressivamente.

De acordo com a teoria de Freud, o mecanismo determinante e essencial para essa formação consiste em um jogo de múltiplas e sucessivas indefinições que vão ao longo dos anos se consolidando e possibilitando ao adolescente formalizar sua identidade.

3 A RELIGIÃO

O conceito de religião pode vir a ser discutível se pensarmos nele sob a ótica da amplitude existente na atualidade, entretanto, se pensarmos sob a ótica científica poder-se-ia iniciar conceituando de acordo com o que preceitua o dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, segundo o qual “religião” é Culto rendido a uma divindade. Fé; convicções religiosas, crença: a religião transforma o indivíduo. Doutrina religiosa: religião cristã. Tendência para crer em um ente supremo. Acatamento às coisas santas. Algo pelo qual se tem o maior respeito.

Entretanto, para os escritores cristãos o termo religião pode e deve ser definido como sendo a relação espiritual direta entre o homem e Deus. Já no tocante às questões sociais e a relação do homem com a natureza da qual faz parte, a abordagem aparece como um pano de fundo e não como elemento de elevada relevância. Com esse pensamento Macedo contribui afirmando que:

O termo religião em termos gerais tem sido definido como culto à divindade, crença na existência de uma ou mais força sobrenatural e observância de preceitos, em Tiago 1.26 encontra-se uma definição mais clara desse significado segundo a qual “religião” é um conjunto de atitudes que a pessoa toma em relação a Deus, a si mesma e ao seu semelhante. A verdadeira fé religiosa depende do que acontece no interior da pessoa, no que diz respeito a uma transformação moral, e de um caráter voltado para o senhor. Esse conjunto de ações leva a pessoa a ter uma vida moldada na palavra de Deus. (MACEDO, 2007 p.24).

O fragmento do texto acima descreve com autoridade um conceito aceito por inúmeros religiosos, pois toma como base o texto do apóstolo Tiago em que afirma que a verdadeira religião é aquela que procura obedecer a Deus. É válido ressaltar que em termos de religião a Bíblia é o livro mais recomendado, mais lido e mais respeitado, pois seus conceitos são absolutamente relevantes para o exercício da fé crista.

Percebe-se que os principais líderes religiosos das denominações pertencentes ao protestantismo consideram a Bíblia como a expressão da palavra de Deus, capaz de oferecer conteúdos suficientes para que o fiel tenha um comportamento adequado no relacionamento afetivo.

E inegável o fato de que a religião tem para os seres humanos uma importância extremamente relevante, independente da fé que a pessoas professe. Não se pode ignorar que a fé tem exercido forte influência sobre o comportamento e consequentemente, sobre a sexualidade humana.

É, portanto, de fundamental importância se ter noções claras sobre a sexualidade na visão da religião numa perspectiva histórica, de forma a facilitar o conhecimento em relação a seus valores, dificuldades, medos, conflitos, e desejos ocultos. De formas diferentes, mas sempre se apresentando como um foco de intensa elaboração, a sexualidade desperta interesse às religiões e é um ponto importante de preocupações éticas discutidas pelos teólogos.

Segundo Macedo (2007) a religião tem sido no decorrer da história, um fator determinante sobre a sexualidade humana, ora impondo regras rígidas, em outros momentos procurando orientar o ser humano nessa dimensão tão importante da vida. É inegável o fato de que a religião tem ao longo dos anos contribuído de maneira contundente para a manutenção de padrões aceitáveis de comportamento dos membros da sociedade.

Em muitos momentos da história a religião se mostrou eficiente no controle dos atos da sociedade, possibilitando a convivência harmoniosa entre os vários membros dos grupos existentes, pois em sua maioria as religiões professam o amor ao próximo, e em se tratando especificamente das religiões cristãs, o amor aparece como sendo o maior mandamento. Nesse sentido Mateus contribui relatando que Jesus assim o disse:

E disse-lhe Jesus, amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento. Este é o primeiro e grande mandamento. E o segundo semelhante a este é, amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos depende toda a lei e os profetas (MATEUS, 22.37 a 40).

De acordo com o fragmento acima, percebe-se que a religião contribui de maneira significativa para que ocorram relações interpessoais dentro dos padrões aceitáveis pelas sociedades, evitando assim que ocorram tragédias e diminuindo a sensação de insegurança, pois os preceitos bíblicos auxiliam os seres humanos na busca por melhorias na qualidade de vida e nos relacionamentos com os demais membros da sociedade.

4 RESULTADO DA DISCUSSÃO

A religião vive em conflito com a questão da sexualidade, sob a ótica da relação intima entre duas pessoas, pois a Igreja não aceita nenhum tipo de relação extraconjugal, ou seja, a relação íntima fora do casamento, ou antes, dele, pois segundo os preceitos religiosos a relação sexual só pode ser permitida através da união legal entre duas pessoas.

Historicamente, a religião vê a relação íntima entre o casal como uma necessidade de reprodução, por muitos séculos a Igreja católica então detentora do poder quase absoluto, impôs a seus fiéis que a relação sexual deveria ser realizada exclusivamente para a reprodução e que o prazer feminino dentro dessa relação seria pecado e por tanto intolerável.

Essa visão arcaica se manteve desde os primeiros anos da era cristã até o século XX, somente com as recentes transformações sociais é que esse tabu passou a ser discutido e as mulheres passaram a ter o direito de defender suas opiniões, a lutar por suas aspirações, pois entendiam que dentro do casamento abençoado por deus e pela Igreja elas poderiam sim sentir prazer e serem felizes.

Mas se a Igreja não concebia as mulheres casadas o direito de sentir prazer em suas relações íntimas com seus maridos, imagina-se como se dá o pensamento da Igreja em relação ao sexo antes do casamento, por tanto, o pensamento da Igreja com relação à sexualidade é muito conturbado e suas justificativas atualmente perpassam a questões religiosas e se estendem a questões éticas e sociais.

A questão das relações sexuais antes ou fora do casamento se constitui um problema grave aos olhos da Igreja, pois além da questão pecaminosa, existem outros agravantes, como as doenças sexualmente transmissíveis, a gravidez indesejada, e o aumento populacional por mães que não possuem as condições necessárias para educar as crianças.

Segundo Macedo (2007) os líderes religiosos não fazem apelo à obediência aos preceitos religiosos para a vivência da sexualidade, mas ao sentimento de semelhança entre Deus e os homens. Dessa maneira fica subentendido que o fiel deve experimentar a sexualidade como ato divino de criação e não uma mera busca pelo prazer individual.

Para Macedo (2007) o ato sexual, portanto, deveria ser realizado apenas com o objetivo de procriar, considerando que o livro do Gênese registra um discurso do Senhor Deus, cujo conteúdo é “crescei e multiplicai-vos e enchei a terra”, razão pela qual um número significativo de líderes religiosos só admite a relação intime entre o casal com o objetivo bíblico da reprodução.

Assim, a religião em relação à sexualidade tem sido um instrumento ideológico e político-social, de forma que tem orientado os indivíduos para uma moral, na maioria das vezes, negando sua sexualidade. A maior exceção vem dos orientais que se pautaram pelas orientações religiosas do Taoísmo, Budismo e Confucionismo que têm uma relação no que se refere à sexualidade sem a força repressora como as Igrejas cristãs, desta forma a sociedade oriental sempre foi muito mais livre e natural que a ocidental.

Dentre os conteúdos que as religiões cristãs utilizam para justificar sua posição em relação á sexualidade destacam-se os argumentos registrados na Bíblia sagrada que em várias passagens relata ou registra a insatisfação de Jeová com as pessoas que cometem o adultério, se prostituem e cometem lascívia, aqui vista como o desejo incontrolável pela prática do sexo. Paulo em sua carta a Timóteo assim o diz:

Sabendo isto, que a lei não é feita para os justos, mas para os injustos e obstinados, para os ímpios e pecadores, para os profanos, para os parricidas e matricidas e para os homicidas. Para os fornicários, para os sodomitas, para os roubadores de homens, para os mentirosos, para os perjuros e para todos os que forem contrários a sã doutrina (A TIMÓTEO, 1.9,10).

Percebe-se no trecho acima que as religiões evangélicas, ou seja, que seguem o evangelho de Jesus Cristo possuem uma gama de aconselhamentos bíblicos que justifica sua posição contrária a exposição da sexualidade, principalmente quando se trata da relação entre pessoas não casadas, uma vez que tal prática segundo o texto bíblico implica na condenação eterna.

Considerando que para os cristãos esta vida terrena é apenas um momento passageiro, e que no porvir a vida será eterna, e que todos os que não forem encontrados escritos no Livro da Vida serão condenados, e ainda considerando que qualquer atitude vista como desobediência é pecado e, portanto, separa o home do convívio divino é natural que a Igreja reprove atitudes libidinosas.

É válido ressaltar que a visão teocêntrica faz os valores religiosos impregnar as concepções éticas e os critérios de bem ou de mal se acham vinculados à fé e dependem da esperança da vida pós-morte. Nas perspectivas religiosas os valores são considerados transcendentes, pois resultam da doação divina. Identifica-se, então, o homem moral como homem temente a Deus que segue os seus preceitos e guarda seus mandamentos.

A consequência disso é a regulação do comportamento moral no mundo material ou expiação da culpa do pecado original, para ser premiado no mundo imaterial após morte física. Como a sexualidade está no âmbito material é, portanto fonte de pecado e deve-se ficar afastado de suas “tentações”. É necessário levar uma vida simples e afastada dos prazeres e desejos.

Esse é um pensamento muito defendido por Paulo de Tarso o maior escritor da filosofia patrística, que em uma de suas cartas aborda a questão do desejo sexual, alertando que seria bom se todos pudessem ser iguais a ele, ou seja, que pudessem se manter solteiros, mas pela necessidade da carne, ou seja, o desejo sexual, a pessoa poderia casar.

A questão significativa aqui e que produzia uma situação incomoda em relação ao casamento era como conseguir manter um dos princípios básicos do cristianismo aceitos na forma do "crescei e multiplicai-vos" sem considerar a atração ou o prazer sexual.

Paulo em suas cartas era extremamente severo em relação as questões de imoralidade e da sexualidade, mas também ensinava a seus filhos na fé questões relacionadas ao casamento e principalmente sobre a fidelidade conjugal entre o marido e a esposa. Fala daqueles fazem a sua opção pelo celibato para se dedicarem mais às atividades eclesiásticas, porém recomenda que aqueles que não tenham a vocação para uma vida de castidade que se casassem.

O apóstolo Paulo reconhece que o casamento não era um pecado, mas apesar disso reconhecia que havia muita virtude em renuncia-lo. Para ele o sexo deveria limitar-se a propagação da espécie e não deveria ser feito por prazer. Nesse sentido Brown contribui afirmando que:

Foi a partir da danação dos nossos pais primeiros que essa desgraça começou. Parecia-lhe que o casamento, a relação sexual e o Paraíso eram tão incompatíveis como o Paraíso e a Morte. Desse modo, a sexualidade permanecia como o indicador da queda do homem, do seu triste declínio da anterior situação angelical, fazendo com que deslizasse para baixo, para a natureza física, e desta para a sepultura. Está certo que os casais deveriam preocupar-se em gestar filhos, mas que o fizessem conscientes de que estavam cometendo um ato de rebaixamento. Era algo necessário, mas humilhante, que deveria ser praticado sob os acordes de uma intensa melancolia. (BROWN, 1990, p.109).

O trecho acima deixa claro que o ato sexual ao longo da história aos olhos da Igreja tem sido visto como algo deprimente impuro, sinônimo de pecado e distanciamento de Deus, ou seja, é iniquidade e a iniquidade faz separação entre o homem e seu criador, o Senhor Jeová, uma vez que Deus não convive com o pecado.

Tais afirmações fazem jus aos sentimentos dos líderes religiosos que foram entrevistados e que invariavelmente confirmaram que suas convicções religiosas são absolutamente contra a exibição da sexualidade, uma vez que como já foi exposto tais atitudes e ações são contrárias aos ensinamentos bíblicos e contribuem de forma significativa para o caos a que a sociedade atual está submetida.

Dos oito líderes religiosos entrevistados na cidade de Ferreira Gomes, todos foram enfáticos em afirmar que suas igrejas não toleram atitudes de exposição da sexualidade, e que quando um de seus membros se envolve em relações íntimas antes ou fora do casamento tais membros são punidos severamente.

Entretanto, quando inquiridos quanto ao conceito de sexualidade suas respostas foram diferentes, cinco dos líderes afirmaram que em suas opiniões sexualidade vem a ser toda exposição do corpo, seja em lugar público ou em suas próprias casas e também consideram comportamento inadequado o envolvimento íntimo com outra pessoa e tais atitudes são reprováveis.

Enquanto três dos líderes entrevistados disseram que sexualidade tem a ver com os prazeres carnais, mas, que não necessariamente entre um homem e uma mulher ou mesmo entre pessoas do mesmo sexo, porém mesmo sendo uma manifestação íntima a pessoa deve evitar, pois Deus não se agrada de tal manifestação, uma vez que todo prazer mundano é pecado e a Igreja não aprova.

Perguntou-se ainda se a Igreja não via essa postura como discriminatória e passiva de sanções da lei, a esta resposta seis dos oito líderes entrevistados responderam que não se preocupam com reações contrárias a maneira de pensar da Igreja, pois acreditam que o Brasil é um país livre e cada um tem o direito de professar sua religião livremente, enquanto dois dos entrevistados responderam que tem cuidado para expor suas ideologias e que sempre escolhem as palavras adequadas para conversarem com seus membros.

Perguntou-se a respeito da doutrina cristã em relação à sexualidade, todos responderam que seguem exclusivamente os ensinamentos descritos na Bíblia Sagrada e que acreditam ser ela a única fonte de conhecimento capaz de orientar o homem a seguir corretamente o caminho que conduz a Vida Eterna.

Também perguntou-se aos líderes se eles acreditam na manifestação da sexualidade através do comportamento, da maneira de falar, agir, caminhar e tratar uns aos outros, todos responderam que o comportamento dos membros de suas Igrejas é tratado em cultos específicos para estudos bíblicos e que posturas inadequadas com a fé que professam não são toleradas e que todas essas formas citadas representam sim uma manifestação da sexualidade e são abusivas, portanto, a Igreja não aprova

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A questão da sexualidade é um tema complexo e que suscita uma grande discussão, pois seus conceitos são amplos e desconhecidos de um número significativo de membros da sociedade, ressalta-se que essa falta de conhecimento contribui para o aumento da discriminação, pois algumas pessoas criticam a sexualidade sem ao menos saber o que de fato significa.

De acordo com a teoria freudiana a sexualidade acompanha a criança desde seu nascimento, logo pode-se perceber que é uma questão independente da vontade das pessoas, pois não se pode e nem se deve criticar, julgar e condenar uma criança recém nascida por ser detentora de sexualidade, é de bom tom lembrar que nesse caso não se trata de desejo ou de exposição sexual.

Sexualidade é, portanto, inerente a todo ser humano, e não pode ser vista apenas como exposição do corpo ou envolvimento íntimo entre duas pessoas, não se trata de ato sexual, A sexualidade permite fazer referência ao conjunto das condições anatômicas, fisiológicas e psicológicas que caracterizam cada sexo.

Logicamente que o termo também faz alusão ao apetite sexual como uma propensão ao prazer carnal e ao conjunto dos fenômenos emocionais e comportamentais relacionados com o sexo, mas isso é decorrência do desenvolvimento da pessoa ao longo da vida, ou melhor, dos primeiros anos de sua existência.

O papel desenvolvido pela Religião na defesa dos valores morais, éticos, sociais e religiosos é indiscutível, pois todos os valores morais, bem como as leis existentes tem origem nos ensinamentos bíblicos, são oriundos dos mandamentos divinos destinados inicialmente aos hebreus e posteriormente aos chamados gentios.

A contribuição religiosa se estende em todos os campos do conhecimento e em todas as esferas sociais, sabe-se que em determinados momentos da história a Igreja exerceu grande poder e influencia, pois era vista como representante Deus na terra e suas decisões não poderiam ser questionadas, pois isso significaria contrariar ao próprio Senhor Jeová, e contrariá-lo significava ofendê-lo, despertar sua ira e ser condenado.

Mas percebe-se que existem alguns sentimentos ou leituras equivocadas por parte de alguns líderes, pois não pode-se conceber que a “a relação íntima entre homem e mulher” tenha apenas o objetivo de reprodução, pois isto igualaria os seres humanos aos animais irracionais, e colocaria o amor entre o casal em um plano inferior, pois um não estaria preocupado com a felicidade do outro, estariam apenas preocupados em reproduzir.

Outro fator preocupante na relação Religião e sexualidade dizem respeito ao despreparo de um número significativo de líderes que não estão aptos a ensinar e o fazem de maneira equivocada, criando entendimentos infundados, proporcionando o aumento da discriminação e do preconceito entre membros da sociedade, e de certa forma contribuindo para uma formação equivocada das crianças e adolescentes.

Segundo Chauí (2002) acredita-se que a criança se preocupa com o que os outros vão pensar de seus atos e atitudes. O adulto, se desenvolvido adequadamente, atua conforme a moral autônoma, em que o importante não é a sanção proveniente do grupo, e sim os seus próprios princípios morais.

O superego, instância psíquica que funciona como censor e leva o indivíduo a ponderar sobre a melhor forma de agir, é construído a partir das relações com os pais, cujos princípios morais são influenciados também pelos preceitos religiosos, nesse momento a ideologia religiosa pode contribuir positivamente ou negativamente com a construção dos saberes ético e morais da sociedade.

As religiões, muitas vezes, utilizam regras rígidas e ameaças de punição ao transgressor que, se possuir um superego muito severo, sentirá medo ou muita culpa por acreditar que foi além do permitido pela lei divina. Em tais situações, embora cronologicamente adulta, a pessoa funciona de forma imatura tanto em termos emocionais quanto morais, ficando prisioneira do julgamento alheio e não da moral autônoma.

A moral religiosa auxilia a conter e até a disciplinar as manifestações da sexualidade, favorecendo a constituição e manutenção dos vínculos familiares. Por outro lado, se a força de coerção for exagerada, pode levar a sentimentos de culpa e repressão da pulsão sexual de forma patológica, levando a desfechos desastrosos: desde a frigidez e impotência até a total aversão ao sexo, vale repensar tais atitudes.

6 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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RAIMUNDO DOS SANTOS LIMA
Enviado por RAIMUNDO DOS SANTOS LIMA em 05/06/2016
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