ENFOQUE REFLEXIVO SOBRE A REALIDADE DAS ESCOLAS, DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO

Arivaldo Leandro da Silva Monte

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo uma breve reflexão sobre o trabalho do professor, suas atividades e realidades escolares. Observa também a formação do professor e a psicologia da aprendizagem. O texto foi orientado com base no artigo de Libâneo (2004) que postula “as renovações das práticas de formação inicial e continuada de professores com base na concepção histórico-cultural da aprendizagem escolar.”

Palavras-chave:realidade escolar, formação de professores, aprendizagem.

INTRODUÇÃO

Desde o fim do tecnicismo, juntamente com o regime militar, o professor tem se deparado com inúmeras questões da aprendizagem que o coloca em constante prova de fogo. Isso porque o professor não é um ponto neutro, seu ponto de vista está diretamente articulado às suas metodologias que por sua vez está conectada à sua fundamentação política e filosófica. Dirá se este ou aquele professor é mais ou menos conservador ou progressista.

Sendo assim no subtítulo “Atividade não é o mesmo que ação”, tentamos esclarecer que a simples ação pedagógica não remete o aluno, necessariamente, a uma aprendizagem. É precisa que haja um sentido motivador na vida do aluno, que o objeto faça parte de sua vida, do seu capital cultural – É fato.

Em um segundo momento a “Atividade profissional do professor e sua formação”,fala de como o trabalho do professor está estreitamente ligado à compreensão da estrutura da matéria, de forma histórica e evolutiva para que a sua sistematização possa ser devidamente repassada ao aluno.

O terceiro momento “A consideração dos contextos sociais, políticos, institucionais”. Observa-se nas atividades docentes o modo como elas estariam sendo desenvolvidas. As sistematizações ideológicas sociais, políticas, institucionais, dos professores, das escolas e dos livros didáticos avançaram rumo ao sentido democrático e autônomo ou não?

Atividade não é o mesmo que ação

Compreender melhor o trabalho do professor e as suas relações epistemológicas com a psicologia da aprendizagem e a realidade das escolas não tem sido uma tarefa fácil. Após a segunda guerra mundial (1945) alguns países europeus e americanos, incluindo o Brasil, tentaram adotar modelos políticos para melhorar a distribuição de oportunidades sociais através da educação. O modelo implicava em todos ter acesso à mesma educação pública e gratuita – era a chamada meritocracia , uma boa intenção que não deu certo. Isso porque lidamos com universos contextuais distintos, não exatamente opostos, mas com peculiaridades diferentes e, às vezes, conflituosos, gerando tensão entre interesses díspares.

Basta lembrar que, segundo a teoria da atividade, uma ação não representa uma atividade, posto que a atividade reveste-se de necessidade e motivação, implicando em sentido na vida do aluno. Já a ação “é um processo cujo motivo não coincide com seu objetivo, mas reside na atividade da qual faz parte.” (LIBÂNEO, 2004, p. 120). Ora, na verdade estamos falando do processo de apropriação da cultura que exige uma atividade do sujeito para que isso aconteça. Essa atividade deverá levar o indivíduo a ter contato com os aspectos humanos historicamente formados e sistematizados.

Comecemos então observando a atividade profissional do professor a qual Libâneo (2004) considera através de três aspectos em desenvolvimento simultâneo, encontrados a partir de estudos da psicologia histórico-cultural e a teoria histórico-cultural da atividade.

Atividade profissional do professor e sua formação.

“O primeiro, a apropriação teórico-crítica dos objetos de conhecimento, mediante o pensamento teórico e considerando os contextos concretos da ação docente.” (p. 141). Sabemos que o pensamento teórico surge com o domínio do pensamento lógico de caráter generalizador para ser aplicado na aprendizagem. Daí vem “os métodos e estratégias cognitivas gerais de cada ciência.” (LIBÂNEO, 2004, p.125).

Esse aspecto dá relevânciaao conhecimento das disciplinas para a formação do professor. Mas Libâneo (2004) observa a importância desse aspecto está estreitamente ligado à compreensão da estrutura da matéria, posto que “o pensamento teórico se caracteriza como o método da ascensão do abstrato para o concreto. ”Sendo esta de forma histórica e evolutiva para que a sua sistematização possa ser devidamente repassada ao aluno. Além disso, essa atividade de transformação deve ser constituída de necessidade e motivação para impulsionar o indivíduo aos seus objetivos.

A estrutura da atividade é constituída pelas necessidades, motivos, finalidades e condições de realização da atividade. A atividade surge de necessidades, as quais impulsionam motivos orientados para um objeto. O ciclo que vai de necessidades a objetos se consuma quando a necessidade ou motivo é tanto material quanto ideal. (LIBÂNEO, 2004, p. 119).

Nessa consumação é que se dá a internalização da atividade externa. Na prática, em sala de aula, nem sempre o professor consegue a realização da atividade, atingindo apenas o mérito da ação. Isso porque o professor não conhece ou talvez tenha pouco domíniosobre os processos de investigação que ao longo do tempo foram utilizados pela história e,assim, acaba incorrendo em atividades que não dizem respeito à cultura e ao contexto social do aluno. Nesse momento o intelectual deve se perguntar: o que estamos lhes ensinando é, pelo menos em parte, o correto? Este é verdadeiramente o conteúdo histórico-cultural que satisfaz o cidadão crítico-social que pretendemos formar? São esses, verdadeiramente, seus interesses? Ou seriam interesses que podem estar favorecendo determinado estrato social, com fins direcionados?

Quando observamos estes pontos críticos também nos voltamos para a epistemologia da pedagogia. Pois a concepção do ensino, visto como transmissãodos conteúdos da cultura e da aprendizagem, envolve a formação do professor em vários ramos de conhecimento. Estes diferentes saberes de outras disciplinas deveriam ser encarados como conhecimentos bem vindos, mas muitas vezes são vistos com resistência, alegados quase sempre por falta de tempo, e assim essa parcela vai para debaixo do tapete e o professor fica refém do livro didático para não se comprometer com tantas outras tarefas acumuladas ao seu trabalho.

A este quadro não podemos esquecer o progressivo aumento de responsabilidade do professor que lhe vem sendo acrescentado nos últimos anos, desde a década de 90. Surgem novas competências ao trabalho do professor, pedagogias de projetos, transversalidade de currículos e as muitas novidades tecnológicas. Já não basta o trabalho pedagógico, mas também o enfrentamento dos problemas sociais e familiares dos alunos.

Com isso aparecem as questões das condições de trabalho, baixos salários, carga horária extensiva, turmas com muitos alunos, falta de materiais de trabalho, falta de autonomia do professor e outros aspectos relacionados.

Entretanto são os diferentes saberes que irão confrontar o docente com as novas realidades sociais.As mudanças que ocorrem na sociedade atual devem ser acompanhadas de perto pelo novo profissional do ensino com um olhar crítico e investigativo, de olho na sua própria formação e transformação.Pois é através do estudo, da pesquisa, da reflexão, do constante contato com novas concepções, propiciadopelos programas de formação continuada, que é possível uma mudança.

Apropriação, metodologias de ação e a psicologia da aprendizagem

O segundo aspecto abordado por Libâneo (2004) é “a apropriação de metodologias de ação e de formas de agir, a partir de explicitação da atividade de ensinar;” (p. 141). Este é um momento muito delicado de escolhas de procedimentos pelo professor, pois como foi observado pelo autor “a atividade de ler o livro somente para passar no exame, não é atividade, é uma ação, porque ler o livro por ler não é um objetivo forte que estimula a ação.” (LIBÂNEO,2004, p. 120). Aqui observamos a escolha que atravessa a psicologia histórico-cultural e a aprendizagem escolar.

A psicologia histórico-cultural é uma ciência que tem como objeto de estudo a atividade do homem no plano psicológico e“se propõe à tarefa de estabelecer as leis básicas da atividade psicológica, estudar as vias de sua evolução, descobrir os mecanismos que lhes servem de base e descrever as mudanças que ocorrem nessa atividade nos estados patológicos” (LURIA, 1991, p. 1). Entende-se com isso certa “concepção marxista da natureza histórico-social do ser humano” (LIBÂNEO, 2004, p.116), que nos norteia ao desenvolvimento psíquico com base na história como nos revela Marx em “O 18 de Brumário”:

Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem: não a fazem sobcircunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com as quais se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. (MARX, 1978).

Nesse contexto a atividade do professor é um desdobramento histórico-cultural que precisa ser, antes de tudo, assimilada pelo professor, dela depende uma boa parte do contexto social que será reescrito pelo aluno orientado pelo docente dentro da sala de aula.

A grande questão é: o professor está devidamente preparado para tal assimilação das novidades pedagógicas? O aluno estará realmente no centro, como sujeito e objeto de sua própria formação? E mais ainda, esse aluno será capaz de, no futuro próximo, reelaborar a realidade interna e externa que lhe é perpassa, mediante o que lhe foi ensinado? Será capaz de discernir o contexto geral e global?

Se pensarmos que para muitos dos professores atuantes em sala de aula nosso legado educacional ainda é quadro negro e giz, as questões acima não fazem o menor sentido. Em outras palavras, esses professores estão tentando fazer a história à sua própria maneira, contradizendo as circunstâncias.

Ora, a psicologia da aprendizagem exige uma relação constante entre sujeito e objeto, esta relação íntima é um dos elementos que pode manter viva a chama da motivação para a atividade efetiva do aluno e não apenas de uma ação mecânica. Se um aluno tivesse que escolher entre ler o livro O primo Basílio de Eça de Queirós ou assistir ao filmeO primo Basílio, para o que será que ele estaria mais motivado? Não é difícil deduzir. Agora imaginemos todos os recursos da tecnologia da informática à disposição desse mesmo aluno e o professor com seu velho e bom livro didático, como seria esse encontro em sala de aula?

É exatamente disso que a psicologia histórico-cultural está falando, ter como objeto de estudo a atividade do homem no que diz respeito às vias de sua evolução, acompanhar os mecanismos que descrevem as transformações ao longo dos tempos e do espaço, fazer desses mecanismos algo motivador na aprendizagem. Isso tornará a apropriação da metodologia de ação algo valioso na aprendizagem na hora da escolha da atividade para desenvolver “funções psíquicas superiores. ”

A consideração dos contextos sociais, políticos, institucionais.

O terceiro aspecto a ser considerado por Libâneo é “a consideração dos contextos sociais, políticos, institucionais – práticas contextualizadas – na configuração das práticas escolares.” (LIBÂNEO, 2004, p. 141). Não há novidades no enunciado a não ser o modo de pensar essas práticas, de que a cultura tem tudo o que é preciso para desenvolver o trabalho docente. É, talvez, a principal ferramenta do processo de ensino/aprendizagem. Dela retiramos nosso modo de agir e pensar, nossas práticas e símbolos, tudo o que é necessário para a atividade e o desenvolvimento cognitivo. A cultura está sempre um passo à frente do que sabemos ou entendemos como sujeito individual. Daí a multiplicidade das atividades que se distinguem pelo seu objeto:

Vimos que, para Leontiev, uma atividade se distingue de outra pelo seu objeto, e que a atividade se realiza mediante as ações, de modo que a atividade humana não pode existir a não ser em forma de ações ou grupos de ações, de modo que a atividade laboral se manifesta em ações laborais, a atividade didática em ações de aprendizagem, a atividade de comunicação em ações de comunicação. (LIBÂNEO, 2004p. 137-138).

Desse modo o professor poderá desenvolver melhor suas ações, suas atividades como prática coletiva, utilizando instrumentos da experiência humana como base teórica e sistemática de nova reflexão em contexto sociocultural.

O trabalho de professor é, portanto, um trabalho prático, entendido em dois sentidos, o de ser uma ação ética orientada para objetivos (envolvendo, portanto, reflexão) e o de ser uma atividade instrumental adequada a situações. A reflexão sobre a prática não resolve tudo, a experiência refletida não resolve tudo. São necessárias estratégias, procedimentos, modos de fazer, além de um sólido conhecimento teórico. (LIBÂNEO, 2004, p. 138).

Estratégias, conhecimentos teóricos, histórico/cultural e social, como também os procedimentos formam a base para a sistematização da atividade do professor. Atividade esta “socialmente situada, razão pela qual os próprios professores aprendem no contexto de trabalho em parceria com seus colegas.” (LIBÂNEO, 2004, p. 140).

O grande pensamento a ser considerado nessas atividades docentes não é saber se elas estão, ou não, sendo realizadas, mas de como elas estariam sendo realizadas. As sistematizações ideológicas sociais, políticas, institucionais, dos professores, das escolas e dos livros didáticos avançaram rumo ao sentido democrático e autônomo ou não? Ou será que ainda pensamos que um médico ganha mais que um operário porque é mais inteligente?Que só não trabalha quem não quer ou por que é vagabundo? Que o estudo é sinônimo de sucesso e é para isso que se estuda, para se ter sucesso na vida? Muitos professores ainda conservam esses pensamentos meritocráticos do governoGetuliano, não evoluíram muito. Outros apenas aceitam as ideologias capitalistas e concordam de bom grado que a escola do governo é ruim (pobre) e a escola privada é boa (rica).

E mais uma vez nos perguntamos se estamos de fato preparados para assumir esse papel de agente transformador e formador de opinião, pois o contexto que os nossos alunos estão inseridos muitas vezes exigem demandas de esforços extraclasses, por exemplo, a formação continuada para que possamos nos atualizar.Pois em grande parte os diagnósticos apontam o baixo rendimento dos alunos ao professore e sua formação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atividade do professor não depende apenas de ações concretas e bem intencionadas. Esse trabalho deve estar repleto de ações motivadoras e objetivas, devem fazer sentido para que o processo de aprendizagem desenvolva capacidades cognitivas no aluno. O aluno tem que aprender a aprender em razão da grande gama de informações colocadas à disposição da sociedade.

Em um segundo momento compreendemos que para que isso aconteça o professor deve estar preparado, não apenas esperar oportunidades, mas criar oportunidades, o professor tem que está um passo à frente do cotidiano. E este é o momento da formação continuada, indiscutível com respeito à sua importância, para novos olhares à sociedade. Um olhar mais crítico-social, longe do senso-comum e dos domínios do capitalismo. O professor tem que ter uma visão aberta, pluricultural e investigativa para identificar pontos críticos, alvos do preconceito e da marginalização que possam estar atraindo seus alunos.

REFERÊNCIAS

LIBÂNEO, José Carlos. A aprendizagem escolar e a formação de professores na perspectiva da psicologia histótico-cultural e da teoria da atividade. Educdar, Curitiba, nº 24, p. 113-147, 2004, Editora UFPR.

LURIA, Alexandre R. Curso de psicologia geral. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1991.

MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. Crítica da educação e ensino. Introdução e notas de Roger Dangeville. Lisboa: Moraes Editores, 1978.

Leandro Dumont
Enviado por Leandro Dumont em 03/04/2021
Código do texto: T7222845
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