Xadrez :Sobre o jogo dos Reis

Igualmente medito muitas vezes sobre a lógica do jogo de xadrez até onde posso ir. Nesse duelo, vejo que existe uma grande complexidade, e uma forma de se levar adiante uma espécie de discussão, um debate, coisas de ponto de vista como opiniões, onde a querela pode ser vencida por um dos dois oponentes ou simplesmente terminar em neutralidade. O xadrez é uma luta de duas vontades que tendem o mesmo objetivo. É o mais profundo dos jogos. Desenvolve-se com leis rígidas, severas, que não admitem exceção, semelhante às matemáticas e à mecânica. É o escalpelo da alma: ele nos mostra a cultura, o cavalheirismo, o egoísmo e os sentimentos do enxadrista, faz flutuar as taras dos indivíduos, evidenciando-lhe as boas ou más qualidades. É imaginação. É uma luta gostosa de emoções. A vida é muito curta para o xadrez. É uma diversão que tem algo de arte e muito de ciência, é a forma de arte ideal. O xadrez prende a alma toda, mas perdido pouco pesa, pois não é nada. A vida é uma espécie de xadrez, no qual temos pontos a ganhar e adversários a enfrentar. É a lógica em forma de arte. Como o amor e a música, tem o poder de fazer as pessoas felizes. O tabuleiro é o mundo; as peças são o fenômeno do universo; as regras do jogo são as leis da natureza.

A partida é jogada em um tabuleiro quadriculado composto por 64 quadrados de coloração alternadamente clara e escura. No começo da partida, as forças de cada lado são em todo sentido equivalentes, consistindo de 16 peças para cada jogador, a saber: um rei, uma dama, duas torres,dois bispos, dois cavalos e oito peões. O xadrez representa o mais fascinante desafio intelectual expresso em forma de jogo. Consiste de uma batalha em miniatura, entre dois reinos adversários, conduzida vigorosamente e em culto estilo, o objetivo da partida é dar xeque mate ao rei oponente, mas se no decorrer da partida os dois reinos se exaurirem de tal modo que nenhum deles possa aniquilar o outro, podem fazer acordo de empate. Há algumas explicações simbólicas do jogo. Nos tempos medievais, sustentavam que o tabuleiro de xadrez representava o próprio campo de batalha da vida. As brancas e as pretas representavam a vida e a morte; ou então o bem e o mal. As peças de xadrez representam os homens terrenos, e antes e depois do jogo são conservadas em uma caixa ou em um saco, para recordar-nos de onde viemos todos e para onde todos retornaremos. Quando as peças do xadrez surgem para a “vida” no tabuleiro, elas assumem posições representativas das diversas situações na sociedade. O rei simboliza todo o reinado; sua vida é a vida da nação. A dama, representa a influência da mulher. As torres simbolizam a justiça itinerante. Os cavalos “cavaleiros” representam a aristocracia cosmopolita. Os bispos simbolizam a hierarquia eclesiástica. Os peões são o povo comum. Quando toda essa gente e esses oficiais se entremisturam, o demônio está sempre ocultamente tentando o jogador a fazer um lance fraco, indiferente ou infeliz. Se o jogador faz um lance dessa natureza, estará cometendo pecado e deverá ser punido por uma captura, xeque ou mate. O objetivo maior é o xeque mate, mas cada fase da partida, combinação, ameaça ou ataque, tem um objetivo, ou no mínimo, deverá ter um propósito definido.

Caíssa é a deusa do xadrez e é quem protege o bom jogador.

Aprende-se facilmente a jogar o xadrez, mas é difícil jogar-se inteligentemente. Quando tiramos proveito de sua prática, estamos acumulando experiência. Podemos obtê-la diretamente por nossos próprios esforços, ou interpostamente, aproveitando da experiência alheia. A simples experiência pessoal somente, pode ser um caminho tedioso e desagradável de aprendizado; outros meios como livros e professores podem ser menos desgastantes. Os livros são professores silenciosos, eles apresentam as melhores experiências de gerações de especialistas. Toda experiência acumulada pelos outros serve de base teórica para nossa própria experiência.

Geralmente o aprendiz de xadrez é audacioso, por sua crueza e avidez. É ávido por agarrar qualquer oportunidade que se lhe ofereça para capturar algo, por isso é rapidamente cercado e liquidado. As aventuras de um aprendiz são mais ricas, emocionais e variadas que as do mestre, e um neófito fica muito contente quando a sorte lhe favorece. Já o artista no xadrez é o que conjuga teoria com a sua própria experiência e habilidade para produzir uma bela partida. Tem a capacidade de transformar a profundidade científica do jogo em emoção e apreciação estética. A criação artística deve corporificar o deleite emocional e a satisfação que, de algum modo, cativam a mente humana e culminam em exaltação espiritual.

Há os simples princípios, conselhos que exprimem verdades fundamentais ou doutrinas que quando seguidas servem de auxílio ao enxadrista para atingir o objetivo desejado eficientemente. São eles, a expressão de uma filosofia correta e o resultado de experiências levadas a efeito pelos mestres do xadrez. Os dois jogadores deverão e tentarão empregar esses princípios na partida, porém se um deles se desviar desse caminho, o outro se aproveitará das falhas ou debilidades e tirará proveito disso, podendo até obter a vitória final. Existe grande número de princípios, a segurança do rei, a mobilidade das peças, o princípio da força e muitos outros indicados por grande número de mestres tais como: as peças na abertura devem ser colocadas onde tiverem o mais amplo objetivo, mobilidade e liberdade de movimento. Deve-se desenvolver cavalos antes de bispos, evitar trocar bispos por cavalos especialmente na fase final, deve-se fazer logo o roque, deve-se fazer lances que contenham alguma ameaça, não se deve lançar ataques prematuros, deve-se controlar o centro, deve-se evitar trocas que ajudem a desenvolver outra peças do adversário, não se deve sair logo com a dama... etc.

Os princípios de beleza são: o de verdade, base de toda beleza; o de harmonia de proporções; o de economia; de profundidade quanto ao objetivo visado; e o princípio de satisfação arrebatadora. Uma bela partida demonstra domínio sobre princípios básicos, desenvolve harmonicamente todas as partes e fases da partida, revela precisão na execução dos lances; atinge deleitável culminação e produz exaltação pessoal.

De início, há a ortodoxia do xadrez. Que é o correto e o verdadeiro padrão de processos prescritos nas leis, regras e regulamentos postos em vigor pela Federação Internacional de Xadrez.

No jogo de xadrez, os cálculos matemáticos demonstram entre outras coisas, a magnitude do número de lances possíveis em uma partida. Indica também a profundidade do estudo do xadrez e as oportunidades existentes para o desenvolvimento de novas aberturas e novas combinações. Foi calculado que o número que representa os diferentes caminhos para jogar os primeiros dez lances de cada lado no tabuleiro atinge o astronômico valor de 169.518.829.100.544.000.000.000.000.000. De tal cifra deduziu-se que, se cada homem, mulher e criança sobre a face da terra jogasse xadrez sem cessar à razão de um lance por minuto, levaria 217 bilhões de anos para serem esgotadas todas as combinações possíveis no jogo de Caíssa. Por aí se vê que o negócio não é pequeno.

A predisposição psicológica diante do xadrez, leva o jogador a expressar como sente o jogo. Uns vêem como uma luta entre dois seres humanos, mediante regras estabelecidas, para outros é a oportunidade para encontrar solução para um problema, outros dizem que o xadrez lhe proporciona uma válvula para demonstrar suas qualidades superiores, para outros é simples recreação. A atitude de um jogador perante o xadrez, determina em muitas vezes se conseguirá ou não enfrentar a derrota de boa mente. O estilo de jogo de um enxadrista é equivalente ao seu estilo de vida, a seu temperamento. Uma pessoa expansiva não se contenta com o domínio de apenas uma parte do tabuleiro, um destemido procura ataques mesmo se eles não existem, um egoísta pensa apenas nas suas possibilidades, um cauteloso nunca rechaça uma linha de empate. Pode-se de um modo geral dividir em dois os tipos de enxadristas: os racionais e os intuitivos. Os primeiros tomam suas decisões baseadas e um cálculo minucioso ou uma estratégia refinada. Trata-se de um estilo bem matemático, científico. Os intuitivos não se preocupam em calcular grande número de variantes, seguem seu instinto, seu coração. Há jogadores que executam lances técnicos e outros que jogam lances desagradáveis para combater os nervos do adversário, mas é necessário ter sempre algum plano e objetivo em vista, deve-se organizar cuidadosamente de modo a poder atingir o alvo com rapidez, ser cauteloso e estar alerta às complicações a enfrentar e, que podem surgir de um lapso do adversário, um erro, uma posição enfraquecida ou uma ação ameaçadora. Há planos a longo e curto prazo; um plano inteligente nos torna heróis e a ausência de um, covardes e néscios. A previsão é a habilidade de visualizar mentalmente o número de lances na frente e suas conseqüências antes que hajam sido executados no tabuleiro. Poderá ganhar, aquele que vê um pouco além de seu adversário. O bom mesmo é procurar se executar o melhor lance sempre, já que só se faz um de cada vez. A visualização do tabuleiro se dá na mente e quem se exercitar no jogo às cegas desenvolverá um agudo sentido de registro da imagem deste perante a consciência. É dito que a ameaça é mais forte que a execução! Para se jogar bem é necessário ter imaginação visual, paciência, autocontrole, capacidade de resolução, boa memória e raciocínio adequadamente associativo, previsão, concentração e esportividade. Quanto maior a idade do jogador, mais pode ser o cansaço que sente em uma partida. A cegueira enxadrística é a falha e o erro que freqüentemente é o resultado de fadiga mental e física causada por prolongada concentração.

Se dá o nome de brilhante a uma série de lances capazes de originar um sentimento de profunda admiração para com a perícia e a capacidade intelectual de um enxadrista. Numa partida brilhante deve haver economia, sacrifícios espetaculares e surpreendentes. Para a maioria dos jogadores a partida perfeita ainda não foi jogada. Teoricamente, uma partida isenta de falhas deverá terminar empatada. O vencedor é o que faz o penúltimo erro. Uma partida é uma batalha em que se produzem falhas e imperfeições de ambos os lados. Não há enxadrista que não perca grande número de partidas, e é um absurdo não se encarar as derrotas com esportividade.

Aniquilamento é quando se ganha uma partida pelo extermínio de todas as forças do adversário, exceto o rei, é quando o rei é despojado de seu exército, tornando-se indefeso. Depois da idade média a vitória por xeque-mate é considerada mais meritória que por aniquilamento. No xadrez também aparecem os principiantes prodígios, que exibem extraordinária habilidade como jogador. Houve garotos que aprenderam o jogo aos 3, 4 anos e aos oito já apresentaram força de mestre. Alguns campeões mundiais foram jovens prodígios.

Especialistas em xadrez, fazem inúmeras referencias ás muitas razões por que são levados a considerar o xadrez como um dos mais importantes, senão o mais importante dos passatempos, que é o mais cosmopolita de todos os jogos e também o mais democrático. É uma forma de produção intelectual e uma das maiores alegrias, senão a maior da existência humana. Nem todas as pessoas podem escrever ma obra, fazer uma ponte, ou mesmo contar uma boa piada. No xadrez, qualquer um pode, e deve ser, intelectualmente produtivo, partilhando assim de seu particular encanto. Um grande mestre de xadrez falou que “sempre teve um delicado sentimento de piedade pelo homem que não conhece o xadrez, da mesma forma com quem permaneceu ignorante no amor”. Outro entusiasta disse que o xadrez tende a afastar o tédio, a aguçar os sentidos e exaltar o espírito. Pra outro, o jogo real traz ricos dividendos – mente aguda e alerta, superior apreciação de valores, senso de proporção e compreensão mais madura da própria vida e de nossos companheiros. Outro diz que aprendeu como ser paciente, como suportar as coisas, como compreender o ponto de vista dos outros, como persistir em caminhos não comprometedores e como tirar lições dos próprios erros.

A sociologia enxadrística lida com as relações humanas manifestadas através da atividade da atividade enxadrística. O sociólogo estuda o comportamento existente nos praticantes a fim de encontrar um padrão representativo de comportamento que se possa dizer característico de determinado grupo unificado de jogadores. Foi constatado que os jovens são mais ousados que os mais velhos.

Quanto à universalidade do jogo sabe-se que serve para qualquer idade, estação, sexo, clima, para tardes de verão e noites de inverno, em terra, no mar e no ar. É a própria água do Letes para penas ou desapontamentos, pois não há esquecimento mais profundo do que o que ele oferece para nosso alívio. O xadrez teve e tem seus patronos, são personalidades influentes, muito interessadas no jogo, a ponto de dar seu apoio moral e material para promover maior interesse e entusiasmo para essa prática.

Há registros de ocorrências estranhas que parecem inacreditáveis sobre o efeito do xadrez, uma delas é que em 1850, um cidadão considerado demente, depois de ter jogado de dez a doze horas seguida com um estudante pobre, este enlouqueceu, enquanto o louco se tornou são.

Em xadrez há também o analista que é o observador imparcial e aponta o que julga ser os melhores lances, tanto para as pretas como para as brancas. Mas, como a autópsia nunca poderá trazer um cadáver à vida, também a análise no xadrez por mais bela que se revele, jamais conseguirá anular as mortais palavras “xeque-mate” e “abandonam”.

Benjamim Franklin, tinha o xadrez como um dos passatempos preferidos, chegava a jogar doze horas seguidas e disse num ensaio que escreveu: o jogo de xadrez é tão interessante por si mesmo que não necessita da perspectiva do ganho para induzir a jogá-lo; e por isso nunca é jogado por dinheiro. Aqueles, pois que têm tempo para tal diversão, não poderão encontrar outra mais inocente...

Disse mais: o jogo de xadrez não é meramente uma diversão ideal; diversas qualidades muito aproveitáveis da mente, úteis no curso da vida humana, podem ser adquiridas e reforçadas por ele, de modo a tornarem-se habituais para todas as ocasiões, porque a vida é uma espécie de xadrez, na qual temos pontos a ganhar e competidores ou adversários a enfrentar, e na qual há uma vasta variedade de bons e maus eventos, que são, em certo grau, os efeitos da prudência, ou de sua falta. Jogando xadrez, pois, adquirimos: primeiro, previsão, que antevê alguma coisa do futuro, e considera as conseqüências que pode trazer uma ação; porque ocorre continuamente a um jogador; “ se eu jogar esta peça, qual será a vantagem e a desvantagem da minha nova situação? Que outras jogadas poderei fazer para apoiá-la, e para defender-me dos ataques?”

“Segundo, circunspecção, que supervisiona todo o tabuleiro, ou cena das ações – a relação entre as diversas peças e suas situações; os perigos a que estão repetidamente expostas; as várias possibilidades de se ajudarem umas às outras; as probabilidades de que o adversário faça esta ou aquela jogada e ataque esta ou aquela peça, e quais os diversos meios que podem ser usados para neutralizar seu golpe, ou voltar suas conseqüências contra ele.

“Terceiro, cautela, para não fazermos nossos lances apressadamente. Este hábito é melhor adquirido observando estritamente as regras do jogo; por exemplo, se tocarmos em uma peça, devemos jogá-la a algum lugar; se a pousamos, devemos largá-la...

“E por fim, aprendemos com o xadrez o hábito de não sermos desencorajados pelas más aparências presentes na situação dos nossos assuntos; o hábito de esperar por uma mudança melhor e de perseverar na busca de recursos. A partida é tão cheia de acontecimentos, há nela tal variedade de reviravoltas, sua fortuna é tão prenhe de vicissitudes, e frequentemente, após contemplação, descobrem-se meios de desembaraçar-se de alguma dificuldade supostamente insuperável, que se é encorajado até o fim, na esperança de êxito para nossa habilidade; ou pelo menos pela negligência de nosso adversário; e quem quer que considere, como frequentemente verá exemplos no xadrez, que o sucesso está pronto a produzir presunção e sua conseqüente inatenção, pela qual a derrota possa ser recuperada, aprenderá a não se deixar desencorajar demasiado por qualquer êxito presente de seu adversário, nem desesperar da boa fortuna final por qualquer xeque insignificante que receber durante sua busca.

Sou grande admirador do proeminente mestre de xadrez Aron Ninzovit, que foi grande teórico e jogador, além do xadrez, estudou filosofia em Munique e viveu muito tempo na Dinamarca. Era enxadrista de vigoroso estilo. Em suas obras enfatizava o que praticava no tabuleiro, especialmente a importância de ter algum objetivo para cada lance. Por isso, recomendava repetidamente não jogar “estupidamente”. Desenvolveu teorias de super- proteção, bloqueio centralização e muitas outras que deram novo rumo ao xadrez em direção à escola hiper-moderna, ele era muito original.

Estou com vídeos no http://www.youtube.com/user/agamenonvioleiro?feature=mhee

Agamenon violeiro
Enviado por Agamenon violeiro em 27/06/2011
Reeditado em 12/09/2013
Código do texto: T3060786
Classificação de conteúdo: seguro