ÍNDIO NÃO QUER APITO... QUER BOLA.

Quando tive acesso ao borderô de bilheteria do jogo do Paissandú contra o águia de Marabá pela série C do brasileirão, não contive a indignação sobre a distribuição da renda. O último beneficiado foi o clube, a famigerada federação levou a parte do leão... digo, do papão, os cartolas criaram taxas incríveis e inexplicáveis que ao contrário da renda do trabalhador, duplica a cada mês. Só pra se ter uma idéia foi retirado do total da arrecadação, segundo o jornalista Rui Guimarães, 14.000,00 só para pagar o aluguel dos rádios usados pela polícia, isso é aluguel de rádio ou de uma emissora? Ou seja, pra que a polícia faça o seu serviço, pelo qual já recebe, fora os impostos, o torcedor pagou essa fortuna em aluguéis de rádios de comunicação para um parco efetivo que compareceu ao estádio. “Sacumé”, com essa grana eu mesmo forneço os rádios sem exigir nem a devolução e ainda ganho um “troco”.

“Essa é uma terra de índios”, dizem os sulistas de forma pejorativa, onde se recebe ordens absurdas e se cumpre sem contestação, onde se briga por ídolos de barro, onde se discute em favor de deuses malandros e se enriquece reis bandidos encastelados em seus palácios burocráticos, essa foi uma terra de índios, diria eu mesmo, quando me dou conta da extinção de nossas tribos mais tradicionais relegadas a terceiro, quarto plano ou até sem plano nenhum, essa terra de índios cabisbaixos que vêem seu patrimônio depredado e seus símbolos atirados ao ostracismo nacional, essa é a terra dos índios que alimentam uma águia sem garras, um leão sem dentes e um bicho papão que não assusta mais ninguém.

Não adianta tentar fugir da pecha que nos é atribuída. Onde está o orgulho de ser índio, ser guerreiro, se nos deixamos dominar? Nem nossos ancestrais se deixaram colonizar com tanta complacência. A verdade é que o termo “índio” atribuído a nós é um demérito a eles que lutam até hoje por seu direito a existir.

É inadmissível que alguém se reúna em boteco de esquina para discutir o futebol paraense, é o mesmo que defender atitudes do Fernandinho Beira-mar, com o agravante que o Fernandinho cuidava ao menos dos seus. Sinto nojo dessa instituição travestida de federação, comandada por mentes bolorentas e lascivas, sanguessugas de nossas tradições, usurpadores de nossos sonhos, aniquiladores de nossas ilusões. Futebol é vida e morte em sentido figurado, torcer por um clube é mais do que uma escolha, talvez seja a maior convicção que alguém possa carregar por toda sua vida, mas como dizia Nietzsche “a convicção é maior inimiga da verdade, que a própria mentira”. Já conheci inúmeras pessoas que trocaram de mulher, muitos que passaram a frequentar outras religiões, vários que migraram para outros partidos políticos e outros que mudaram de sexo, mas time de futebol? Sinceramente, não lembro... mas lembro de estádios lotados, com a maior renda nacional, mesmo estando frequentando divisões inferiores, me lembro do Paissandú ter provocado a destruição dos alambrados do seu estádio, dado o êxtase de sua fiel torcida, lembro do Clube do Remo ter colocado 40.000 espectadores no Mangueirão, num jogo de terceira divisão, da Tuna Luso ter conquistado dois títulos nacionais... me lembro, ...me lembro, é tudo o que eu posso dizer “me lembro”. Ultimamente quando se ouve estouro de fogos em jogos do Remo, certamente é a torcida adversária comemorando sua derrota, e a recíproca se repete. Há anos que comemoramos tragédias e descensos, comemoramos até quando um dirigente alheio é pego em falcatruas, aliás se pensarmos assim, até que temos muitos motivos para comemorar. Sabe, na Europa, os clubes tem seus redutos e seus torcedores como aliados e parceiros, não se vê muitos clubes em uma mesma região, fazendo com que aquele clube possa transformar-se em paixão local e assim consiga o apoio de toda uma região, tornando-se rentável e próspero. Claro que há uma gama de outros fatores que impulsionam em sua ascensão, passando desde incentivos do Estado através das loterias até a gestão de qualidade e comprometida com a instituição. Aqui mesmo no Brasil temos exemplos de clubes que primam por uma gestão transparente e investimentos de base, além de boas condições de trabalho, como o São Paulo e o Atlético do Paraná, por exemplo. Experimente fazer uma lista de jogadores paraenses que hoje se destacam no Brasil, e que foram embora sem se quer serem observados por clubes locais, pela simples falta de interesse em investimento nas bases. Sabe por quê? Porque base não tem empresário, lobista ou patrocinador, e isso só traria lucro ao clube, não aos dirigentes. Experimentem fazer isso e vejam que “puta” time nós teríamos. Jobson, Pará, Ganso, Moisés, só pra citar alguns.

Nosso orgulho de sermos índios, filhos da terra mais rica união, donos soberanos de rios majestosos e florestas encantadoras, esbarra na improbidade administrativa de nossos caudilhos, com a conivência escancarada do torcedor que os apóia incondicionalmente, pisoteando seus próprios brios, criando subterfúgios para manter suas enxovalhadas convicções, legando essa fraqueza às gerações vindouras.

Não se iludam torcedores do Paissandú, achando que no sul do país alguém se lembra de seus feitos, de sua participação na Taça Libertadores, não se iludam torcedores achando que algum feito de quaisquer clube paraense tem alguma relevância, algum peso para a CBF, por que na hora de escolher quem leva a parte que interessa, a decisão é política, e não adianta dizer que aqui se enchem os estádios, por que o que interessa é o que enche os bolsos, ou alguém lembra o nome de algum clube Manaus que tenha expressão nacional? E de Cuiabá, alguém lembra? A média de público do campeonato amazonense foi de 2.000 espectadores, isso não é nem a média do Cametá. O mapa do futebol brasileiro é delineado por cifrões e mordomias pessoais. Enquanto a “ingênua” Governadora do Estado recepcionava o Sr. Ricardo Teixeira com dançinhas típicas e docinhos de cupuaçu, o que só o prendeu em nossa capital por algumas horas, em Manaus um belo hotel de selva e outros “mimos” o aguardavam e o prenderam por alguns dias, inserindo assim os amazonenses no mapa do futebol. Não quero ser leviano em afirmar que houve um afrouxamento proposital por parte dos nossos comandantes, até porque eu teria que enumerar os motivos que os levaram a essa conivência, então deixa quieto. Aqui é o único lugar do mundo onde os leões, os lobos e as águias não estão no topo da cadeia predatória, aqui quem domina são as velhas raposas.

Anderson Du Valle
Enviado por Anderson Du Valle em 11/08/2011
Código do texto: T3153615
Classificação de conteúdo: seguro