ANÁLISE DO CONTO A MENINA DE LÁ” DE GUIMARÃES ROSA

A MENINA DE LÁ, ANÁLISE.

Narrativa de formidável sensibilidade poética, A Menina de lá narra a história de uma garota de quase quatro anos de idade e que surpreendentemente começa a proferir desejos e estes serem da mesma maneira atendidos.

O espaço

A descrição do ambiente no conto é feita de maneira modesta, no momento em que o narrador não se demora, pois apenas nos fornece um pano de fundo da ação (MOISÉS, p.106): “Sua casa ficava para traz da serra do Mim, quase no meio de um brejo de água limpa, chamado o Temor-de-Deus” (ROSA, 1975, p. 20).

As personagens

A narrativa utiliza-se de poucos personagens, sendo suas descrições objetivas e rápidas. Essas descrições não nos deixam de forma alguma confusos diante da construção dessas personagens, pelo contrário, as informações obtidas no conto são fundamentais e suficientes para nos levar a uma única ação no conto: “O Pai, pequeno sitiante, lidava com vacas e arroz; a Mãe urucuiana, nunca tirava o terço da mão, mesmo quando matando galinhas ou passando descompostura em alguém.” (ROSA, 1975, p. 20)

A construção da personagem principal “Nhinhinha” é feita de forma poética: “miúda, cabeçudota e com olhos enormes.” (ROSA, 1975, p. 20) Apesar de parecerem descrições físicas, dois dos adjetivos referentes à menina, revelam características psicológicas fundamentais para entendermos a personagem: “cabeçudota” – pensava demais, “olhos grandes” – notava as coisas que as pessoas não observavam. “não queria bruxas de pano, brinquedo nenhum, sempre sentadinha onde se achasse, pouco se mexia.” (ROSA, 1975, p. 20) A quietude de Nhinhinha era necessária, era preciso descrever uma criança que não se “importava com os acontecimentos”. Essa introspecção da personagem principal traz uma estranheza aos outros personagens e ao próprio leitor. Não que Nhinhinha não se importasse com nada, na verdade, percebemos com a continuidade da leitura que o que chamava a atenção dela era justamente o que não chamava a atenção de ninguém. “─“O passarinho desapareceu de cantar “...” (fala de Nhinhinha ao notar o silêncio do canto do sabiá.) (ROSA, 1975, p. 20).

Estrutura

“A menina de lá” é narrada em terceira e primeira pessoa, dependendo da posição desse narrador na história: “E Nhinhinha gostava de mim,” e “Conversávamos, agora.” Esse dois trechos retirados do conto, revelam a condição de personagem secundário do narrador, portanto narrado em primeira pessoa. Em “Nunca mais vi Nhinhinha” e “Sei, porém, que foi por aí que ela começou a fazer milagres.” (ROSA, 1975, p. 22), neste momento, o narrador se afasta da ação e passa a falar sobre o que ouviu, portanto a narração é transferida para terceira pessoa. É no exato momento do desprendimento do narrador para com a personagem principal que observamos o surgimento da narrativa fantástica, visto que se o narrador presenciasse e confirmasse os milagres, talvez trouxesse ao texto a certeza do que foi relatado, o que acabaria de uma vez com o fantástico. Por sua vez, a realidade não dá lugar ao imaginário, trazendo a verossimilhança para o conto.

Linguagem

A menina de lá, possui como personagem principal uma garota de caráter especial, que se encontra psicologicamente fixada em dois mundos, o que dá cabimento para o deslanchar da linguagem criativa de Guimarães Rosa.

Observamos o uso da linguagem infantil: “Cheiinhas” (ROSA, 1975, p. 21) e “Tudo nascendo!” (ROSA, 1975, p. 21), o uso de uma linguagem confusa que desperta no leitor a capacidade imaginativa de Nhinhinha: “Ele te xurugou?” (ROSA, 1975, p. 20 e 22) “Tatu não vê a lua” (ROSA, 1975, p. 20).

É valido ressaltar o uso de diálogos:

• Discurso direto: Quando o contista põe as personagens para falar diretamente. “─Eu quero ir para lá.” “─Aonde?” “─Não sei.” (ROSA, 1975, p. 21)

• Discurso indireto: Quando o contista resume a fala das personagens em forma narrativa. “Experimentaram pedir a Nhinhinha: que quisesse a chuva.” (ROSA, 1975, p. 22)

Clímax

Sendo seu gênero o conto, o acontecimento da narrativa se dá próximo ao clímax. Em A menina de lá experimentamos um anticlímax, que significa uma quebra nas expectativas formadas diante da leitura narrada: “Pai e Mãe cochichavam, contentes: que quando ela crescesse e tomasse juízo, ia poder ajudar muito eles (...)”(ROSA, 1975, p. 23) “E, vai, Nhinhinha adoeceu e morreu.” (ROSA, 1975, p. 23).

Desfecho

Nem as personagens da narrativa, nem os leitores entenderam o motivo de Tiantônia ralhar com Nhinhinha naquela tarde que admiravelmente a deixava feliz e a fazia pular e cantar como jamais havia feito antes. Só depois de sua morte, é que ficamos sabendo o motivo da bronca: Nhinhinha se agourara. Proferira-a sua própria morte ao desejar um “caixãozinho cor-de-rosa, com enfeites verdes brilhantes.” (ROSA, 1975, p. 23) O final da narrativa não se fecha, Guimarães deixa para nós o fantástico, a hipótese de se cumprir ou não o desejo da menina.

5. REFERÊNCIAS:

ABDALA JUNIOR, Benjamim. Introdução a Análise da Narrativa. São Paulo, Scipione, 1995.

BATTELLA GOTLIB, Nádia. Teoria do Conto. São Paulo, Ática, 1999.

COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas. São Paulo, Ática, Série Princípios, 1987.

ROSA, Guimarães. A menina de lá. Primeiras Histórias, 8º ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1975.

MOISÉS,Massaud. A Criação LiTerária. São Paulo, melhoramento, 1967.

TODOROV, Tsvetan. Introdução à Literatura fantástica. São Paulo, Perspectiva, 2003.

Angela Luiza
Enviado por Angela Luiza em 03/09/2010
Código do texto: T2476515
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