Breves notas sobre as cartas de amor da poeta Delmira Agustini _ III

O casamento de Delmira Agustini durou dez meses. A cerimônia ocorreu no dia 14 de agosto de 1913 e, aos 5 de junho de 1914, divorciou-se. No mês de julho seguinte estava morta. A bela e esguia loira de olhos azuis, filha de um uruguaio com uma argentina, e descendente de italianos, tinha a fisionomia de um anjo e assim foi descrita:

"Ella era rubia, de ojos claros, que eran tan pronto azules o celestes, e incluso verdes, según la luz, asombrados, en los que ardía un fuego secreto. No daba la impresión de ser alta, pero sí espigada y flexible'. Medina habla de 'una niña de quince años, rubia y azul, ligera, casi sobrehumana, suave y quebradiza como un ángel encarnado, como un ángel lleno de encanto e inocencia'. La tal niña era realmente una belleza, impresionante".

O anjo foi abatido por dois tiros na cabeça, disparados pelo marido, Enrique Jobs Reys, em um apartamento de hotel, no centro de Montevideu. Enrique, a seguir, cometeu o suicídio. O corpo belo e nu da poeta morta foi fotografado e publicado pela imprensa da época.

"Delmira Agustini (...)se mostra ousada na sua poética da segunda década do século XX. Desenvolve o verso branco, moderno e despojado em O livro branco e Correspondência, ambos influenciados pelo simbolismo hispano-americano (chamado, na literatura hispânica, "Modernismo"), de Julio Herrera Y Reissig, Leopoldo Lugones e Rubén Darío. Porém, envolvendo-se num casamento mal-sucedido e condenado pela família, pois ele era um negociante de cavalos, encontra a morte pelas mãos do próprio ex-marido. O Dicionário de literatura uruguaia insinua que um amante no meio literário pode tê-lo levado a assassiná-la com um tiro e a atirar em si mesmo em seguida, numa tragédia que até hoje marcou a interpretação da vida e da obra da autora, devido ao mistério que a cerca".

A representante da poesia feminina do modernismo hispanoamericano, na opinião de quem analisou criteriosamente parte de seus versos, faz o leitor enveredar por uma ambiência na qual se avista

“un incomprensible desfile de imágenes bíblicas y fetiches sagrados, una procesión de serpientes, odres, cálices vacíos o derramados, cisnes exangües, eróticos rosarios, devotas ofrendas y, sobre todo, vampiros. Que estos vampiros responden al prontuario de cierto avinagrado “romanticismo”, que tal “romanticismo” explota los flujos y subterfugios de una temática de la sangre, es algo que se desprende de esta primera lectura”. (Pueyo, p. 132-133, pdf)

Glenz (2012, data de acesso) examina o epistolário de Delmira dirigido aos poetas que considerou seus mestres e sobre os quais se diz algo além, que ela os amou poeticamente e confessou a sua dor, gerando em torno de si uma aura de mistificação que contribuiu para algumas suposições e geraram equívocos sobre a sua obra. A crítica se encarregou de “despojá-la sistematicamente de sua sexualidade, tornando-a praticamente uma ‘ideia”. Assim, essa jovem ganhou cores de mulher vampiro fatal (imaginário decadentista) e de musa gris, entre outros conceitos que remetiam ao sensual.

Foram 16 as cartas trocadas entre Agustini e Manuel Ugarte, sendo a que mais interessou a Glenz, em seu estudo, a missiva escrita logo após o casamento da poeta, em 1913. Para esse pesquisador, a carta destrona o argumento em torno da inocência de Delmira. Trata-se de um texto inquietante e repleto de lírico queixume; de fatalidade e da exposição de seu drama. Desta carta, frisa-se, neste esboço de estudo, uma breve passagem:

“Você, sem saber, sacudiu minha vida. Eu pude lhe dizer que tudo isso era em mim algo novo, terrível e delicioso. Eu não esperava nada, eu não podia esperar nada que não fosse amargo deste sentimento; e a voluptuosidade mais forte de minha vida foi submergir-me nele. Eu sabia que você vinha para partir, deixando-me a tristeza da lembrança e nada mais”.

A correspondência com outro poeta, já citado neste trabalho, o nicaraguense Rúben Darío, é composta por cinco exemplares que Glenz coloca como importantes documentos para a compreensão da intimidade psicológica da poeta. A Rúben Darío disse a jovem Delmira: “Pense você que nem mesmo me resta a esperança da morte, porque a imagino cheia de horríveis vidas. E o direito do sonho me foi negado desde o nascimento. E a primeira vez que minha loucura transborda é ante você”.

Pode-se observar facilmente que a frase dita por Delmira, em carta dirigida a Manuel Ugarte é bem semelhante em conteúdo, à que disse ao poeta Rúben Darío. Escreveu a Ugarte: "Eu não esperava nada, eu não podia esperar nada que não fosse amargo deste sentimento; e a voluptuosidade mais forte de minha vida foi submergir-me nele". E esta ao Rúben Darío: "E a primeira vez que minha loucura transborda é ante você”. Aos dois, portanto, declara a intensidade de seu amor e desejo.

Este conjunto de 21 (vinte e uma) cartas íntimas forneceu aos estudiosos importante subsídio documental sobre a vida privada de Delmira Agustini. Foi com fundamento nessas cartas de amor que pesquisadores concluíram que a poeta amou carnalmente outros homens. Assim, citado por Glenz, Rodríguez Monegal, asseverou que “a chama que devorava Delmira era real. Dela resta a cinza ardida de seus versos”.

Estes superficiais exame e leitura de exemplos das cartas de Agustini serviram, inclusive, para observar que os seus poemas lhes são incomparavelmente mais belos e de valor literário superior. Sobre o texto epistolar paira a figura de uma mulher que criou um sonho, não foi intensamente correspondida em seus desejos, mas legou ao mundo uma herança de valor, aquela em que fez alçar o canto amoroso feminino a patamares proibidos e, àquela época, altamente reprováveis.

“Delmira Agustini es precursora de la voz de la mujer en América, aunque todavía hoy es poco conocida y reconocida. Su nombre ha sido silenciado o recluido a segundo plano en antologías e historias de la literatura hispanoamericana en la temática correspondiente al Modernismo. Esta exclusión evidencia una marginación genérica-sexual ante el privilegio de un criterio masculino en la construcción del canon literario. Lo demuestra la presencia de escritores hombres, únicos reconocidos como Herrera y Reissig, Horacio Quiroga en el Uruguay, Rubén Darío, Jaimes Freyre, Asunción Silva, José Martí, para citar sólo algunos, mientras que el nombre de Agustini es apenas insinuado junto al de Gabriela Mistral, Alfonsina Storni y Juana de Ibarbourou” (Silvas, 2012, data de acesso, p. 2)

REFERÊNCIAS

http://sopadepoesia.blogspot.com.br/2009/10/delmira-agustini-grande-voz-feminina-do.html

http://www.modernismodigital.org/archivos/0000176.pdf

http://acceda.ulpgc.es/bitstream/10553/4009/1/0234349_00006_0019.pdf

http://www.fazendogenero.ufsc.br/8/sts/ST63/Gleiton_Lentz_63.pdf

http://lfilipe.tripod.com/LLobo.html

http://www.ale.uji.es/agustini.htm

http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-83332009000100011&script=sci_arttext

taniameneses e Roberto Carlos Bastos da Paixão/Vera Lúcia Maia
Enviado por taniameneses em 28/03/2012
Reeditado em 03/09/2012
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