Delmira Agustini, anjo e mulher - (UM EXTRATO)

Delmira Agustini, anjo e mulher –I

*Roberto Carlos Bastos da Paixão/Tânia Maria da Conceição Meneses Silva/Vera Lúcia Maia

Este artigo é um exercício de literatura elaborado a partir da leitura de textos oferecidos pelo CVC (Centro Virtual Cervantes) e textos de outros estudiosos da obra da poeta Delmira Agustini. O objetivo deste trabalho é o de apresentar aspectos da vida e da obra da poeta uruguaia, representante do Modernismo em seu país e também considerada a primeira voz feminina da poesia hispano-americana responsável pela afirmação da mulher em um cenário onde prevalecia a voz masculina. A poeta ganhou destaque por dois motivos: porque ousou escrever poemas de temática erótico-sensual; e por sua vida amorosa marcada pelo seu assassinato aos 27 anos de idade. Os textos apresentados pelo CVC sobre Delmira Agustini foram organizados por Tania Pleitez.

O panorama mundial europeu do início do século XX é marcado por lutas sociais, tentativas de revolução, e a disseminação de novas ideias políticas e científicas. A agitação social levava a literatura por outros caminhos diversos daqueles representativos da fuga da realidade e do culto do eu reinantes no período do Romantismo. As setas das estradas apontavam para a objetividade, a análise, a compreensão da realidade e a crítica que transforma o social. Daí o encontro entre as tendências que se interinfluenciaram: o Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo.

O início do século XIX viu o surgimento de movimentos de independência por toda a América do Sul, incluindo o Uruguai. Depois do período conturbado pela guerra, cresceram os índices da imigração, sobretudo de pessoas que vinham de Espanha e Itália. As famílias foram se estabelecendo e, à altura do ano de 1860.

A história do Uruguai tem seu marco principal no período em que ocorre em suas terras a chegada dos espanhois. São dessa época as fundações correspondentes às primeiras cidades e, entre elas, Villa Soriano, Sacramento (fundada pelos portugueses) e Montevidéu. José Joaquim de Viana foi nomeado o primeiro Governador de Montevidéu.

Depois os ingleses invadem Montevidéu e Buenos Aires, mas fracassam e o comando que se alongou até 1828 continuou sendo exercido pela Espanha. Nos finais do século XIX, o Uruguai era independente.

Delmira Agustini nasceu três meses depois da fundação do renomado El Ateneo de Montevideo, inaugurado na data de dia el día 3 de Julio de 1886, resultado da fusão de duas importantes instituições: a Sociedad Universitaria e o Ateneo del Uruguay. A escritora viveu 27 anos e morreu antes de ver a independência de seu país.

A poeta não participou como ativista de movimentos sociais, nem de associações feministas, não fez pronunciamentos sobre a condição civil da mulher, não era filiada a partidos políticos e nem consta que tivesse predileções partidárias, mas a sua obra, por si só, tem importante representatividade. Coincidentemente, no ano de 1915, em Montevideu, foi apresentado um projeto de lei que pretendia erradicar o duplo padrão moral relativo ao adultério. Esse projeto não foi adiante, mas a morte trágica de Delmira Agustini repercutiu fortemente na sociedade uruguaia. (Giordano, 2009)

Os anais do Colóquio de Alunos de Pós-graduação em Letras da Faculdade de Ciências e Letras de Assis (SP), realizado de 12 a 14 de junho de 2007, registram que a década de 80 do século XX foi assinalada pela valorização que a crítica literária latino-americana dedicou aos textos de autoria feminina. Foi então que a poeta brasileira, Cecília Meirelles, produziu importante ensaio, súmula de uma conferência que a escritora pronunciou no ano de 1956, na Sala do Conselho da Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro, intitulada “Expressão feminina da poesia na América”. Cecília se refere a 28 (vinte e oito) escritoras de diversos países, como Cuba, Bolívia, Argentina, Uruguai, Colômbia, Peru, México e Chile. A conferencista prestigiou Delmira Agustini e foi a ela que dedicou maior número de páginas (sete) de seu trabalho, demonstrando uma visão que abrangia tanto a vida quanto a importância da obra da poeta uruguaia: “Delmira Agustini foi o primeiro grande caso feminino da Poesia da América, tanto literariamente como pela morte trágica – talvez mesmo a única morte com grandeza suficiente para a estranha paisagem de vida em que o destino a colocou” (Meirelles, 1959, p.69).

Cecília Meirelles reconheceu a característica de vanguardismo na obra agustiniana, pois a poeta ousou romper a tradição do verso regular e metrificado e enriqueceu sua poética com figuras de expressão que a colocaram na condição de poeta maldita e transgressora. Souza da Silva (2007, p. 77-90)

Esta pesquisa se debruçou sobre aspetos da vida e da obra de uma poeta que deixou seu nome inscrito na literatura hispano-americana e cujos versos ultrapassam todas as fronteiras. Espera-se com estas abordagens apresentadas contribuir para a construção do conhecimento sobre Delmira Agustini e para manter acesa a chama poética que a abrasou.

A filha de Santiago Agustini y María Murtfeldt, nasceu em Montevideu/Uruguai na data de 24 de outubro de 1886. Os pais a chamavam carinhosamente de “la Nena”. Delmira pertencia a uma família de classe média alta e se educou como as moças desse tipo de sociedade. Teve aulas de francês, piano, pintura e desenho.

Desde menina Delmira demonstrou sua sensibilidade e inteligência e teve todo o apoio de seus pais na formação de sua cultura. Aos cinco anos de idade, Delmira sabia ler e escrever corretamente e, ao completar os dez já compunha versos e executava peças de difíceis partituras ao piano.

A ensimesmada jovem Delmira também pouco contato teve com as moças da mesma faixa etária que ela. Não demonstrava interesse pelas reuniões sociais e as considerava fúteis, vazias. Mais tarde estabeleceu contato com importantes intelectuais do porte de Juan Zorrilla de San Martín, Carlos Vaz Ferreira, Julio Herrera y Reissig, Manuel Ugarte, Samuel Blixen (editor do semanário cultural Rojo y Blanco). Era costume de Delmira passar o tempo livre em companhia dos pais e fazendo longos passeios e caminhadas pelo parque, ou então, com um amigo de infância, André de Badet. “Aurora Curbelo Larrosa, su abogada, dijo haber conocido a Delmira desde niña, y la describió como cariñosa, bella, de carácter melancólico y dueña de una precoz y maravillosa imaginación".

Foi a partir de 1902, quando estava aos dezesseis anos, que Agustini começou a publicar seus primeiros poemas na revista La Alborada. E, quando aos dezessete, a citada revista a convidou a ser colaboradora de uma seção à qual Delmira intitulou “La legión etérea”, assinada pelo nome artístico de Joujou. Neste espaço jornalístico a poeta traçava retratos de senhoras da burguesia de Montevideu e que desfrutavam de proeminência nos setores cultural e social. Entre as suas homenageadas estava a poeta María Eugenia Vaz Ferreira.

No ano de 1907 Delmira publicou seu primeiro livro de poemas, El libro Blanco, que foi bem aceito pela crítica especializada. Junto ao sucesso literário, a fama da escritora também corria em torno de sua beleza física.

O contexto que envolvia a poeta e sua obra era assinalado por contrastes significativos. Se por um lado puritano e conservador, especialmente no que diz respeito à sexualidade e às diferenças entre homens e mulheres, por outro ponto de vista era libertário e progressista, pois, exatamente no período dos governos de Battle y Ordoñez (1903-1907, 1911-1915) foram levadas a efeito importantes reformas como a decretação da primeira lei do divórcio, em (1907) e a criação da Universidad de Mujeres, em 1912.

Tal atmosfera de ambiguidades influenciou na forma como a crítica acolheu a obra de Delmira. Mesmo sendo elogiado o seu trabalho, a temática de erotismo explícito não se adequava aos estereótipos femininos daquela época. Eram modelos diferenciados que propunham um perfil feminino para uma jovem solteira e ainda virgem. A literatura de Delmira surpreendeu e desconcertou a maior parte dos críticos que tentou neutralizar sua voz e passaram esses estudiosos da literatura a dar atenção à pessoa, uma mulher bela fisicamente e que insistia em demonstrar uma aura etérea. . Foi assim que se criou o mito, entre seus contemporâneos, de uma Delmira cuja personalidade intelectual era, simultaneamente, uma espécie de Pitonisa de Eros aliada ao aspecto da menina virginal, pura. Assim tentava a crítica explicar o “milagre” de um texto que era produto do instinto, descartando a sua competência e intelectualidade.

A manifestação da crítica não poupou em preconceitos quanto ao calor da sensualidade na poesia de Delmira, cujo segundo livro, intitulado Cantos de la mañana, foi publicado em 1910. Então é firmado o seu prestígio como poeta e chegou a ser elogiada por Rubén Darío, poeta nicaraguense, expoente máximo do Modernismo em língua espanhola e em companhia de Juan Martí.

Foi em 1912, quando Darío visitou Montevideu que Delmira o conheceu, tendo este encontro motivado entre eles uma troca de cartas. Em sua casa, a poeta recebia visitas de vários escritores e intelectuais que eram atraídos por seu talento e, entre esses visitantes, está incluído Manuel Ugarte, compositor de músicas e diretor do Teatro Cólon, em Buenos Aires, intelectual engajado em causas sociais.

O terceiro livro, Los cálices vacíos, veio a lume em fevereiro de 1913 contendo poemas ainda mais fortemente caracterizados pelo tom de erotismo. Isto provocou escândalo social e o murmúrio aumentava incessantemente em torno da jovem poeta e seu atrevimento. Tal estado de coisas provocado por uma moça solteira e virgem chamava particularmente a atenção porque a mulher daquela época deveria ser objeto de desejo e lhe era vedado desejar. Eis o excepcional da obra de Delmira, a sua subversão ao tentar criar um novo e complexo sujeito feminino de erotismo pessoal diferente do que era imposto pela tradição literária masculina.

Delmira Agustini na apreciação de alguns estudiosos: erotismo e tragédia - II

Delmira Agustini (Montevideo, 1886-1914) é, sem dúvida, uma das poetas mais representativas da poesia hispano-americana do século XX. Tornou-se admirada pelo seu talento, espírito de vanguarda e pela sensualidade dos versos que escreveu. A morte trágica e prematura vem a compor a cena de sua vida e carreira intelectual que a tornou uma lenda no universo da poesia.

O poeta nicaraguense, Rubén Darío, prefaciou a obra Los cálices vazios (1913). Os elogios que fez à obra de Delmira se encarregaram de frisar a sua retórica modernista que cria uma original linguagem erótica na qual se expressa o desejo feminino.

O fato de haver sido assassinada pelo marido criou, segundo (Oviedo e Tudela, 2012), em torno da poeta, a relação com o maldito decadentista evidenciado por seus críticos.

O erotismo pontua toda a obra da poeta uruguaia, em verso ou em prosa. Uma espécie de erotismo entre o velado e o explícito, o que ela conseguiu equilibrar magistralmente, pois seus versos se vestem de sensualidade e desejo e de tal maneira são arquitetados a ponto de neles ser possível sentir o seu hálito, a sua sede emanando em música e ritmo _ a exemplo do soneto Explosión. Há, incontestavelmente, nestes versos, uma explosão do sentimento de ardência em desejos. O eu poético se mostra na volúpia e sofreguidão de um beijo; nas delícias advindas de amar:

Explosión

Si la vida es amor, ¡bendita sea!

¡Quiero más vida para amar! Hoy siento

Que no valen mil años de la idea

Lo que un minuto azul de sentimiento.

Mi corazón moría triste y lento...

Hoy abre en luz como una flor febea;

¡La vida brota como un mar violento

Donde la mano del amor golpea!

Hoy partió hacia la noche, triste, fría,

Rotas las alas, mi melancolía;

Como una vieja mancha de dolor

En la sombra lejana se deslíe...

¡Mi vida toda canta, besa, ríe!

¡Mi vida toda es una boca en flor!

(De El libro blanco (Frágil), 1907)

Enfim, entre essas e outras emoções a poeta criou e perenizou uma obra que imprime na literatura, não apenas hispano-americana, mas em âmbito universal, um desenho importante da mulher em busca da liberdade de expressão poética.

Na palavra de Vazquez (2012), o estilo de Delmira Agustini é o de uma personalidade multifacetada e que oscila desde o cuidado formal até a mais trivial e infantil linguagem. O estudioso ressalta a poética da exaltação do amor e da sexualidade em uma alma insatisfeita, até aquele momento em que viveu a poeta, impensável e jamais presente na poesia feminina: “El objeto central es el amor y su gran vacío, el hombre, aunque delinea su aureola a lo largo del texto, pero el sometimiento de los sentidos provoca el uso constante de la metonimia para objetivar unas sensaciones que no puede expresar directamente”.

Breves notas sobre as cartas de amor da poeta Delmira Agustini _ III

O casamento de Delmira Agustini durou dez meses. A cerimônia ocorreu no dia 14 de agosto de 1913 e, aos 5 de junho de 1914, divorciou-se. No mês de julho seguinte estava morta. A bela e esguia loira de olhos azuis, filha de um uruguaio com uma argentina, e descendente de italianos, tinha a fisionomia de um anjo e assim foi descrita: “Ella era rubia, de ojos claros, que eran tan pronto azules o celestes, e incluso verdes, según la luz, asombrados, en los que ardía un fuego secreto. No daba la impresión de ser alta, pero sí espigada y flexible'.

O anjo foi abatido por dois tiros na cabeça, disparados pelo marido, Enrique Jobs Reys, em um apartamento de hotel, no centro de Montevideu. Enrique, a seguir, cometeu o suicídio. O corpo belo e nu da poeta morta foi fotografado e publicado pela imprensa da época.

Glenz (2012, data de acesso) examina o epistolário de Delmira dirigido aos poetas que considerou seus mestres e sobre os quais se diz algo além, que ela os amou poeticamente e confessou a sua dor, gerando em torno de si uma aura de mistificação que contribuiu para algumas suposições e geraram equívocos sobre a sua obra. A crítica se encarregou de “despojá-la sistematicamente de sua sexualidade, tornando-a praticamente uma ‘ideia”. Assim, essa jovem ganhou cores de mulher vampiro fatal (imaginário decadentista) e de musa gris, entre outros conceitos que remetiam ao sensual.

Foram 16 as cartas trocadas entre Agustini e Manuel Ugarte, sendo a que mais interessou a Glenz, em seu estudo, a missiva escrita logo após o casamento da poeta, em 1913. Para esse pesquisador, a carta destrona o argumento em torno da inocência de Delmira. Trata-se de um texto inquietante e repleto de lírico queixume; de fatalidade e da exposição de seu drama. Desta carta, frisa-se, neste esboço de estudo, uma breve passagem: “Você, sem saber, sacudiu minha vida. Eu pude lhe dizer que tudo isso era em mim algo novo, terrível e delicioso. Eu não esperava nada, eu não podia esperar nada que não fosse amargo deste sentimento; e a voluptuosidade mais forte de minha vida foi submergir-me nele. Eu sabia que você vinha para partir, deixando-me a tristeza da lembrança e nada mais”.

A correspondência com outro poeta, já citado neste trabalho, o nicaraguense Rúben Darío, é composta por cinco exemplares que Glenz coloca como importantes documentos para a compreensão da intimidade psicológica da poeta. A Rúben Darío disse a jovem Delmira: “Pense você que nem mesmo me resta a esperança da morte, porque a imagino cheia de horríveis vidas. E o direito do sonho me foi negado desde o nascimento. E a primeira vez que minha loucura transborda é ante você”.

Pode-se observar facilmente que a frase dita por Delmira, em carta dirigida a Manuel Ugarte é bem semelhante em conteúdo, à que disse ao poeta Rúben Darío. Escreveu a Ugarte: "Eu não esperava nada, eu não podia esperar nada que não fosse amargo deste sentimento; e a voluptuosidade mais forte de minha vida foi submergir-me nele". E esta ao Rúben Darío: "E a primeira vez que minha loucura transborda é ante você”. Aos dois, portanto, declara a intensidade de seu amor e desejo.

Este conjunto de 21 (vinte e uma) cartas íntimas forneceu aos estudiosos importante subsídio documental sobre a vida privada de Delmira Agustini. Foi com fundamento nessas cartas de amor que pesquisadores concluíram que a poeta amou carnalmente outros homens. Assim, citado por Glenz, Rodríguez Monegal, asseverou que “a chama que devorava Delmira era real. Dela resta a cinza ardida de seus versos”.

Estes superficiais exame e leitura de exemplos das cartas de Agustini serviram, inclusive, para observar que os seus poemas lhes são incomparavelmente mais belos e de valor literário superior. Sobre o texto epistolar paira a figura de uma mulher que criou um sonho, não foi intensamente correspondida em seus desejos, mas legou ao mundo uma herança de valor, aquela em que fez alçar o canto amoroso feminino a patamares proibidos e, àquela época, altamente reprováveis. “Delmira Agustini es precursora de la voz de la mujer en América, aunque todavía hoy es poco conocida y reconocida”. (Silvas, 2012, data de acesso, p. 2)

Um olhar diferenciado sobre a poesia de Delmira Agustini _ IV_

Para a finalização deste exercício foram selecionados 51 textos poéticos da autoria de Delmira Agustini com o objetivo de, sobre esta amostra aleatória, lançar um olhar curioso e não, especificamente, levar a cabo um estudo dentro de moldes rigorosamente científicos.

Quanto aos estudos recentes da crítica especializada, a tendência é a de reconsiderar e reestudar a obra de Agustini que,

"Because of the tragic circumstances of her death, Agustini has been analyzed and psychoanalyzed by a number of Latin American literary critics who have tried to link the female energy and eroticism of her poetry to the events of her life and death. Unfortunately, the focus on her personality, rather than on her remarkable talent, meant an unfortunate neglect of the poetry itself. In recent years, more enlightened critics (such as Magdalena García Pinto) have begun to address her work more appropriately."

Com a intenção de perceber nuances componentes da substância dessa poesia e, baseando-se nos estudos consultados sobre a temática agustiniana, foi levantada a incidência relativa a um montante de 21 palavras. O resultado desta apuração, abaixo demonstrado, aponta cada palavra acompanhada da respectiva quantidade de vezes em que aparece em toda a extensão dos textos selecionados: Amor (24); mar (12); fogo (24); loucura (3); vida, ora escrita com inicial minúscula, ora com maiúscula, (73); morte, ora escrita com inicial maiúscula e ora escrita com inicial minúscula (18); sol (19); a palavra sensualidade e seus derivados não constam dos 51 poemas. A palavra sexo aparece somente uma vez; e a palavra homem, vez alguma. A palavra noite, 33 vezes; boca, 27 vezes; lábios, 14; alma, 66; 9 vezes a palavra triste; sangue, 10; vinho, 5; mãos, 54; flor, 42; 9 vezes a palavra voo; 167 vezes o pronome tu; 77 vezes o pronome eu.

Dessa forma, e pelo resultado apresentado, torna-se possível uma leitura livre e mínima da poesia de Delmira:

Uma poesia que dirige sua mensagem lírico-amorosa para uma segunda pessoa, um receptor (tu). Portanto uma linguagem predominantemente poética e emotiva. O Amor é descrito pela poeta entre as figuras de uma antítese construída com os termos água/fogo: “Lo soñé impetuoso, formidable y ardiente;/hablaba el impreciso lenguaje del torrente;/era un mar desbordado de locura y de fuego,/rodando por la vida como un eterno Riego”.

O eu poético revela ao amado, objeto de sua paixão e delírio, o motivo desse amor: “Porque tu cuerpo es la raíz, el lazo/esencial de los troncos discordantes/del placer y el dolor, plantas gigantes”.

A expressão lírica do sujeito dos poemas evidencia-se nas 77 repetições do pronome eu e, nestes versos, inserido em uma paisagem cinzenta e gótica que se transformará em luz com a chegada do amado: “Yo sé que volverás, que brillará otra aurora/en mi horizonte grave como un sueño sombrío;/revivirá en mis bosques tu gran risa sonora/que los cruzaba alegre como el cristal de un rio”.

Os versos clamam 73 vezes por vida, um viver que no ser amado se resume: “-Yo no quiero más vida que tu vida,/son en ti los supremos elementos;/déjame bajo el cielo de tu alma,/en la cálida tierra de tu cuerpo!”, contra apenas 18 vezes a que se referem à morte: “Tan triste que he llorado hasta quedar inerte... /¡ Yo sé que estás tan lejos que nunca volverás! /No hay lágrimas que laven los besos de la Muerte...”

Trata-se de uma nesga de poesia que apresenta características voltadas para o íntimo da escritora, nuances estas demonstradas na incidência da palavra alma por 66 vezes. Nos versos destacados, a alma da poeta se confunde em contemplação da alma do ser amado: “Mi alma es, frente a tu alma, como el mar frente al cielo:/pasarán entre ellas, cual la sombra de un vuelo,/la Tormenta y el Tiempo y la Vida y la Muerte!”

Mãos é um vocábulo que se repete 54 vezes e proporciona ao leitor a sensação de toque, de suavidade e de sensualidade. Nos versos desta exemplificação, a entrega de amor da poeta é irrestrita, pois “Un día, al encontrarnos tristes en el camino/yo puse entre tus manos mi pálido destino./¡Y nada más hermoso jamás han de ofrecerte!”

O vocábulo flor representa na poesia de Delmira uma metáfora na qual, na maior parte das vezes, a poeta ampara a simbologia do sexo feminino. Neste exemplo ela convida o amado para doar-se mais voluptuosamente: “Vamos más lejos en la noche, vamos/donde ni un eco repercuta en mí,/como una flor nocturna allá en la sombra/me abriré dulcemente para ti.”

A luz que ilumina a atmosfera dos poemas é tênue e esfumaça-se na penumbra que se espraia harmonicamente pelas 19 vezes em que cita o sol: “Luego soñélo triste, como un gran sol poniente/que dobla ante la noche la cabeza de fuego;/después rió, y en su boca tan tierna como un ruego,soñaba sus cristales el alma de la fuente.”

Tal sombra é totalmente escurecida pela repetição da palavra noite 33 vezes, como em “-El triunfo de la noche. -De tus manos, más bellas, /fluyen todas las sombras y todas las estrellas, /y mi cuerpo se vuelve profundo como un cielo!”

Entretanto, nem sempre há sombras pairando sobre o cenário da poesia de Agustini. Agora o sol se avista em sua plenitude à presença do ser amado: “ -Pleno sol. Llueve fuego. -Tu amor tienta, es la gruta /afelpada de musgo,/el arroyo, la fruta, /la deleitosa fruta madura a toda miel.”

Delmira soube usar a arte poética para esconder a sua paixão, o que se observa em única referência ao vocábulo sexo e na contagem zero (0) para a palavra homem: “Sexo de un alma triste de gloriosa;/el placer unges de dolor; tu beso,/puñal de fuego en vaina de embeleso,/me come en sueños como un cáncer rosa...”

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este sucinto esboço elaborado a partir da leitura de estudiosos da vida e da obra de Delmira Agustini oferece importantes subsídios para uma reflexão sobre a voz poética feminina, não apenas da época e do contexto em que viveu e escreveu Delmira, mas sua obra se torna, neste sentido, atemporal e reconhecível em toda parte onde houver uma mulher e, de forma mais contundente, se essa mulher escreve.

Apesar das ventanias da modernidade sobre a figura feminina, impossível seria negar duas realidades: 1. O contexto do início do século XX, quando Delmira Agustini escreveu sua obra e enfrentou a sanha da crítica e o policiamento sobre sua expressão poética e sua vida íntima. Vítima da violência secular contra a mulher, assim mesmo ela deixou registradas em versos a sua sede de amor e a sua paixão pela poesia; 2. O contexto da atualidade no qual ainda se tenta calar a voz feminina. As cartas de amor de Agustini revelam o seu grito desesperado e o seu destemor perante a sociedade. Essas cartas aí estão, testemunhas de sua alma em conflito. Os seus poemas expõem a sensualidade feminina ainda sob as sombras e as presilhas das metáforas da castidade.

Inúmeras e infindáveis leituras da obra poética de Delmira Agustini podem ser realizadas. Outros estudos continuarão a revelar a importância, também social, do papel de uma mulher que pagou com a vida o seu sonho e deixou a herança de sua poesia de amor. Sinto-a reviver ante meus olhos e, em homenagem à poeta, incluo a este texto o poema de um beijo que tanto desejou.

Boca a boca

Copa de vino donde quiero y sueño

beber la muerte con fruición sombría,

surco de fuego donde logra Ensueño

fuertes semillas de melancolía.

Boca que besas a distancia y llamas

en silencio, pastilla de locura,

color de sed y húmeda de llamas...

¡Verja de abismos es tu dentadura!

Sexo de un alma triste de gloriosa;

el placer unges de dolor; tu beso,

puñal de fuego en vaina de embeleso,

me come en sueños como un cáncer rosa...

Joya de sangre y luna, vaso pleno

de rosas de silencio y de armonía,

nectario de su miel y su veneno,

vampiro vuelto mariposa al día.

Tijera ardiente de glaciales lirios,

panal de besos, ánfora viviente

donde brindan delicias y delirios

fresas de aurora en vino de poniente...

Estuche de encendidos terciopelos

en que su voz es fúlgida presea,

alas del verbo amenazando vuelos,

cáliz en donde el corazón flamea.

Pico rojo del buitre del deseo

que hubiste sangre y alma entre mi boca,

de tu largo y sonante picoteo

brotó una llaga como flor de roca.

Inaccesible... Si otra vez mi vida

cruzas, dando a la tierra removida

siembra de oro tu verbo fecundo,

tú curarás la misteriosa herida:

lirio de muerte, cóndor de vida,

¡flor de tu beso que perfuma al mundo!

REFERÊNCIAS

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http://sopadepoesia.blogspot.com.br/2009/10/delmira-agustini-grande-voz-feminina-do.html

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t

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taniameneses e Roberto Carlos Bastos da Paixão e Vera Lúcia Maia
Enviado por taniameneses em 29/03/2012
Reeditado em 03/09/2012
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