Fragmentos da História de São Gonçalo-PB

Segundo Mariz (1978), o processo de ocupação do sertão paraibano se deu após o ingresso da família Oliveira Ledo na região, entre 1680 e 1690, através da implantação das fazendas de gado e com o advento da cultura algodoeira, em que grande número de colonos requereu terras em todas as ribeiras até o Rio Piranhas.

Inicialmente, a região foi explorada pela Casa da Torre, que se constituiu no grande feudo do sertão nordestino, chegando a possuir cerca de um terço das terras do sertão paraibano, através de invasão ou obtenção de sesmarias. A Casa da Torre se estabeleceu em torno do Rio São Francisco, adentrou pelo sertão e se instalou em grande parte dos Rios Piranhas, Peixe, Piancó, Espinharas e o Sabugi. O português, Teodósio de Oliveira Ledo, arrendou parte dessas terras, expandindo seus domínios, através da expulsão e eliminação da população indígena.

Pela leitura de Seixas (1972), observa-se que em meados do século XVIII já havia numerosos habitantes nas ribeiras do Rio do Peixe e do Rio Piranhas, sendo a maioria, portugueses, colonizadores e exploradores das férteis terras. Dentre eles, destaca-se o capitão português, Bazílio Rodrigues Seixas, que obteve a sesmaria do sítio São Gonçalo, em 1757.

Carvalho (2006) afirma que a antiga sesmaria de São Gonçalo, a qual pertencera ao português, Bazílio Rodrigues Seixas, transformara-se, por sucessão hereditária, em diversas fazendas. Uma destas, a Fazenda Umaitá, pertenceu ao Coronel Basílio Pordeus Silva, nas primeiras décadas do século XX. Na década de 1930, no governo de Getúlio Vargas, a fazenda foi desapropriada, tendo em vista a necessidade de ampliação da área de irrigação e produção de São Gonçalo. A fazenda, que pertencia ao ciclo do gado e onde eram realizadas belas festas e vaquejadas, proporcionadas pelo seu mandatário, se estendia entre as áreas da zootecnia e da medidora.

No Século XIX, parte das terras de São Gonçalo pertencia ao Senhor Luiz Ferreira Rocha (1841-1894), casado com Joanna Marques Guimarães Rocha (30.04.1848-20.03.1899), filha do vigário José Antonio Marques da Silva Guimarães. Outra parte da propriedade também pertencia à família (Marques/Silva), na pessoa do Dr. Antonio Marques da Silva Mariz. Em 1889, pouco antes da Proclamação da República, o império brasileiro efetuou os primeiros estudos para a construção dos açudes de São Gonçalo, em Sousa, na fazenda de Luiz Ferreira Rocha.

Em 1907, o deputado potiguar, Elóy de Souza, idealiza e redige o Regulamento da Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS). Em 1911, apresenta projeto de lei de amplo programa de obras de irrigação, que seria posto em prática apenas em 1919, pelo presidente Epitácio Pessoa.

No ano de 1913, durante a República Velha , o Governo Federal inicia a construção da grande rodovia, atual BR-230, que interligaria o sertão paraibano ao litoral. A rodovia seria concluída no ano de 1926, enquanto que o seu asfaltamento somente se concretizaria no início da década de 1970.

Somente a partir do ano de 1920, é que se pode considerar que São Gonçalo passa a fazer parte da história do Brasil. Até aqueles idos, o sertão era, à noite, o reflexo das chamas tênues de lamparinas corajosas, que enfrentavam uma escuridão que só temia o sol (FORMIGA, 2011).

Tudo começou quando o paraibano, Epitácio Pessoa, assumiu a Presidência da República (28.06.1919 a 15.11.1922), período que coincidiu com a grande seca de 1919. De imediato, Epitácio implantou um ambicioso programa governamental de combate aos efeitos maléficos das secas, irradiando esperança pelo sertão nordestino. Assim, a IOCS passa a denominar-se IFOCS (Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas), criando novas atribuições para a entidade e promovendo forte incentivo às atividades de açudagem na região.

A partir do ano de 1920, ocorre a desapropriação e indenização de algumas propriedades rurais, que pertenciam aos Senhores Dr. Silva Mariz (parte sul ou bacia hidráulica), João Ferreira Rocha (parte central ou vila), José Ferreira Rocha e Donana Ferreira Rocha (parte leste) e Basílio Pordeus Silva (parte norte/oeste ou zootecnia/medidora), pelo Governo Federal, com vistas à construção do açude e do acampamento de São Gonçalo.

No dia 18 de fevereiro de 1921, o governo federal assina contrato com a empresa americana, Dwight P. Robinson & Company Incorporated, responsável pela construção das barragens de São Gonçalo e Piranhas.

Outra grande obra, a casa de força do açude era uma estrutura com máquina a vapor, que se localizava próximo à base externa da barragem. Movida a gás pobre para gerar energia elétrica, era responsável pelo funcionamento dos guindastes, compressores, guinchos gigantescos, betoneiras, motores-bomba, vibradores, locomotivas, marteletes, vagões.... Possuía apito a ar comprimido, com uma corneta grande, que indicava o início e término do expediente.

Até o final do ano de 1921, foram feitos os trabalhos preliminares de limpeza do local da barragem e de escavação até o terreno de fundação. No local, foram descobertas duas grandes pedreiras, exploradas com recursos mecânicos, ou seja, com aparelhamento de perfuração a ar comprimido. Ergueram-se oficinas e depósitos de materiais e instalou-se o serviço provisório de abastecimento d'água filtrada com o auxilio de poços, para uso doméstico e necessidade das obras. Foram construídos barracões para alojamento de setecentos trabalhadores. As oficinas mecânicas foram instaladas com as ferramentas modernas exigidas para os trabalhos de manutenção, bem como a usina da força motriz.

De Lavras da Mangabeira a São Gonçalo, caminhões trafegavam transportando o equipamento maquinário e materiais diversos necessários ao serviço. As poderosas máquinas, oriundas das fábricas norte-americanas, foram embarcadas em Nova York, desembarcadas em Fortaleza e transportadas, por estrada de ferro, até Lavras.

Os norte-americanos chegaram elaborando estratégias e semeando esperanças. Através da construtora Dwight P. Robinson & Cia., cuja instalação em São Gonçalo tem o seu início em setembro de 1921, homens, máquinas e equipamentos de engenharia escavavam e reviravam o solo do sertão. Agitações e barulhos devastaram a fleuma do pequeno lugarejo, recém-federalizado.

São Gonçalo passou a receber gente aos milhares, famílias inteiras fugindo da seca, advindas de todos os recantos do Nordeste.

O ritmo da construção da barragem se inicia de maneira alucinante. A serra, sobre a qual a estrada passa, começa a ser dinamitada. Todos teriam que se afastar do local. Moradores eram impelidos a sair de suas casas, para locais mais seguros. Enormes blocos de rocha se evaporavam pelo espaço distante, tamanho era o poderio e a amplitude dos explosivos.

No primeiro semestre de 1922, as instalações de São Gonçalo estavam devidamente concluídas e o serviço em pleno funcionamento.

São Gonçalo também já possuía linha telefônica, uma revolução para a época, água encanada, telégrafo, saneamento e luz elétrica. Máquinas possantes eram instaladas, casa de força, casa-de-gelo... No lugar, falavam-se inglês e alemão nas calçadas e esquinas, enquanto “doutores” e altas autoridades oficiais discutiam assuntos de extrema relevância para o destino dos sertanejos, nos escritórios e canteiros de obras da Inspetoria, espalhados por toda a extensão do acampamento. Sousa, de perto, assistia a tudo, boquiaberta, regozijada!

Com o término do mandato de Epitácio Pessoa e a posse do novo Presidente, Arthur Bernardes, o sonho do sertanista se transforma em um imenso pesadelo, a partir do início de 1923. Os programas do governo antecessor foram imediatamente interrompidos. Todavia, de janeiro a abril, a escavação na parte mais profunda da barragem não sofreu interrupção e a concretagem, nos paredões da represa, prosseguiu normalmente.

Em 1925, ocorreu a paralisação de todas as obras do Nordeste, inclusive, as obras de construção do açude de São Gonçalo, para desgosto profundo de toda a região. Equipamentos e instalações ficaram abandonados, expostos à ação deletéria do tempo.

Getúlio Vargas assume o poder nacional em 1930 e, sensível à situação calamitosa em que se encontrava o Nordeste, nomeia para o cargo de Ministro da Viação e Obras Públicas o intelectual e político paraibano, José Américo de Almeida, que teria uma participação decisiva para a retomada das obras de combate aos efeitos das secas, dando condições a IFOCS de executar um novo programa de açudagem.

As obras de construção do açude de São Gonçalo foram retomadas no dia 22 de junho de 1932. Desta feita, agora, sob a responsabilidade direta da Inspetoria. No dia 6 de fevereiro de 1936, acontece a sua inauguração oficial, que contou com a presença de Luiz Vieira, (Diretor da IFOCS), Dom João da Mata de Andrade Amaral (Bispo de Cajazeiras), Assis Chateaubriand (jornalista), além de diversas autoridades, jornalistas e representantes dos governos federal e estadual.