Houve um tempo em que a hipnose era uma ação rejeitada tanto pelas pessoas como pela lei. Mais recentemente, depois dos anos 2000, a hipnose voltou à tona e, dessa vez, de forma muito peculiar, apresentou-se como terapia alternativa e funcionalmente aceita em várias clínicas e hospitais do planeta.

Modernamente, hipnose é um estado alterado da consciência, caracterizado por uma concentração extrema da atenção, relaxamento físico e acesso ao subconsciente da pessoa.
Platão (387 a.C.), em seus escritos, sugeria que o cérebro controlava o processo mental. Já Aristóteles (335 a.C.) dizia que o coração controlava os processo mentais. Ele afirmava que o coração era o órgão do pensamento, do sentimento e das percepções.

Conhecida desde as priscas eras, os maias, os astecas, os persas, os gregos e os egípcios utilizavam a hipnose como meio de cura. Nem sempre praticada abertamente, a hipnose  acontecia em segmentos fechados e, muitas vezes, era praticada escondida do público em geral.

A hipnose revelou-se com esse nome a partir do século XIX, cunhada pelo médico cirurgião e oftalmologista James Braid (1795-1860). Este famoso cirurgião declarou a palavra hipnotismo[1] pela primeira vez em 1843, na cidade de Manchester/UK, que significava o processo de indução ao estado hipnótico. Mais tarde, o médico arrependeu-se de ter colocado esse nome nesse processo de indução, pois descobriu que a hipnose não residia em estado de sono, mas algo parecido com isso, porem muito diferente do dormir. Braid foi influenciado em seus estudos e aplicações por Mesmer, Lafontaine e Esdaile.

Vale esclarecer que o hipnotismo foi antecedido pelo mesmerismo (base do hipnotismo), nome originado de Franz Mesmer[2], médico vienense que morou em Paris e que aplicava o magnetismo animal – esse tópico foi a sua tese de doutoramento.

Tempos depois, o cirurgião escocês James Esdaile (1808-1859) utilizou as técnicas de Mesmer e fez milhares de cirurgias aplicando o sono magnético – na verdade, anestesia hipnótica[3]. A maioria de suas intervenções foram realizadas na Índia, onde morou logo após se formar em medicina, em 1830, na Universidade de Edimburgo/Escócia – UK.

Por não se compreender na época a natureza e dinâmica dos seus fenômenos, a hipnose, durante muitos anos, foi esquecida e mal interpretada. Ela foi resgatada na França por duas importantes escolas de pensamento que possuíam visões muito distintas desse fenômeno: a escola de Salpêtrière, liderada por Jean-Martin Charcot (1835-1893) e a escola de Nancy, orientada por Auguste A. Liebeault (1823-1904) e Hipolyte Bernheim (1840-1917).

Bernheim recusou a teoria de um fluido magnético (Mesmer) e considerava a sugestão, a ideia, como a ação que hipnotizava. Para Liebeault, o sono hipnótico era idêntico ao sono natural. O grande mérito dessa teoria foi despojar o hipnotismo de seu mistério, correlacionando-o com fenômenos conhecidos da vida psicológica normal e do sono

Charcot, o neurologista mais conceituado da época, era o grande líder da escola de Salpêtrière, que estudava os estados hipnóticos para tratamento de pacientes histéricos. Ele considerava a hipnose[4] como um estado patológico de dissociação, comparando o transe ao processo histérico e a anormalidades no sistema nervoso. A relação entre hipnose e doença repercutiu fortemente nas áreas médica e científica e chegou a influenciar vários pesquisadores da época. Freud foi um deles.

A discussão técnica e científica entre essas duas escolas, diferentes e distintas na forma de apreciar a hipnose, novamente fez eclodir o interesse pelo estudo e pesquisa em relação ao tema. Desse embate, organizado por Charcot, aconteceu o I Congresso Internacional de Hipnotismo Experimental e Terapêutico, que contou com a presença do psicólogo americano William James, o criminalista italiano Lombroso e o jovem psiquiatra Sigmund Freud. A partir daí, artigos científicos, livros e revistas especializadas foram publicados sobre o assunto. Vale lembrar que Wilhelm Wundt, considerado o pai da Psicologia como Ciência, escreveu um livro reportando-se hipnose nesse período.

Em linhas gerais, esses foram os fundamentos que sustentaram a evolução da hipnose no século XX.
 
[1] A palavra tem origem no grego, Hypnos, deus do sono.
[2] Mesmer (1734-1815) foi contemporâneo de Mozart, que o homenageou em sua ópera COSI FAN TUTTE. Mesmer, nos jardins de sua mansão em Landstrasse/Viena, foi quem concedeu a primeira oportunidade de Mozart apresentar uma ópera com apenas 12 anos de idade. Franz Mesmer também era músico, advogado e linguista. Isaac Newton foi seu orientador de doutorado.
[3] Vale lembrar que como anestesia, o éter foi introduzido somente em 1846 e o clorofórmio em 1847.
[4] Em um trabalho apresentado em 1882, na Academia Francesa de Ciências, deixou clara a sua posição em relação ao que entendia por hipnose: um estado patológico de dissociação.