A Pólis Brasileira, uma reflexão.

Prof. Leonardo Lisbôa

Na Antiguidade Clássica, no tempo dos gregos, não havia um país chamado Grécia como hoje existe. Havia um Mundo Grego constituído por diversas cidades-estados, a Pólis.

Trazendo para nossa contemporaneidade:

O Brasil hoje é um país com uma diversidade muito grande. Há Brasis. Permitamos imaginar que esta enorme variedade compõe uma grande cidade. Inversamente à realidade grega – um mundo com diversas pólis – e em nosso caso, a diversidade formando um Todo, uma enorme pólis, uma grande cidade chamada Brasil.

Na pólis se desenvolvia toda uma dinâmica, que serviu de base organizacional e que o mundo ocidental herdaria: a Política, sobretudo.

De tempos em tempos toda sociedade politicamente organizada vive a efervescência das eleições. Período de extrema importância para a democracia se fazer.

A humanidade é política. Quem fala que não gosta de política é, como já disse Bertold Brechet¹, analfabeto político, não tem consciência que isto já é uma atitude política.

Para melhor ação democrática e ser um cidadão politicamente consciente tem de se conhecer os processos históricos e o desenrolar da política.

Sendo assim, no Brasil contemporâneo, o desenvolvimento da situação política partidária, tomando a legislação eleitoral brasileira e a Constituição promulgada, se deu da forma descrita abaixo.

Na época da Ditadura Militar (1964-1985), segundo a Lei Falcão, só podia haver duas facções: Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB – daria origem ao PMDB e ao atual PSDB). A ARENA reunia os políticos favoráveis ao regime militar e o MDB reunia a oposição, que era controlada.

Com o fim da Época do Regime Militar, esse sistema bipartidário deixou de existir, vários partidos políticos foram criados e outros que estavam na clandestinidade votaram a funcionar.

Antes, porém, de prosseguir é salutar conhecer as bases políticas de outros países. Sugerimos dois: Reino Unido, onde funciona uma Monarquia Parlamentar, como o Brasil já foi, e os Estados Unidos da América, que muitas vezes, sobretudo no início de nossa República, nos serviu de parâmetros (inclusive o primeiro nome do Brasil republicano era à moda de nossos amigos da América do Norte, ou seja, Estados Unidos do Brasil).

O rei reina, mas não governa. No Reino Unido, o governo está entregue ao primeiro-ministro que é eleito. Lá tudo se iniciou com o surgimento de dois partidos: Tory e Whig.

Tory é o nome do antigo partido de tendência conservadora e que reunia a aristocracia britânica. A palavra Tory é de origem irlandesa, proveniente dos vocábulos thairide ou tóraighe, que significa bandoleiro, homem armado.

Esta facção foi fundada por Thomas Osborne, conde de Danby e Lord chanceler com Carlos II.

Os Tories sofreram uma transformação fundamental sob a influência de Robert Peel. Este, ao escrever o Manifesto de Tamworth (1834), propôs uma reforma social. O partido mudou dando origem aos atuais Conservadores apesar do termo Tory ser ainda usado na política inglesa.

Se o Partido Tory seguia uma linha conservadora, o Partido Whig reunia as tendências liberais.

Os dois, Tory e Whig, inicialmente tomaram projeção nacional na origem da crise que suscitou a Lei de Exclusão de 1678–1681. Enquanto os Tories apoiavam o rei Jaime II, os Whigs eram favoráveis a sua exclusão dos tronos da Escócia, Inglaterra e Irlanda, uma vez que o rei havia se convertido ao catolicismo.

Tempo antes ainda em 1648, ocorreu a marcha sobre Edimburgo para evitar a tomada de parte dos escoceses pelo rei Carlo I contra as forças do Parlamento Britânico na Guerra Civil inglesa. Esta marcha ficou conhecida como a Marcha dos Whiggamores ou ‘Marcha dos Homens do Leite Amargo’. O vocábulo Whiggamore seria abreviado para Whig.

Whig é uma palavra escocesa derivada de ‘Whigg’, soro do leite. Em tempos idos fazia parte da alimentação dos pobres naquelas cercanias. A expressão foi inicialmente usada pelos calvinistas escoceses que queriam separar a Escócia da Inglaterra do rei Carlos I. Estes calvinistas escoceses eram associados às classes mais baixa da sociedade.

Depois serviu para designar a facção política que lutou a favor de um regime parlamentar protestante, o Partido Libera Whig. Até o final da Primeira Guerra Mundial (1914-18) alternou com os Tories na formação do Sistema Parlamentar Britânico. Depois disto perdeu a importância e é substituído pelo Partido Trabalhista na alternância do poder político no Reino Unido com o Partido Conservador.

Os Whigs também está na origem da formação do Partido Democrata Liberal.

No Império Brasileiro (1824-1889) também houve a Monarquia Parlamentar onde dois partidos se alternavam: Os Liberais e os Conservadores; coincidentemente.

À guisa de curiosidade vejamos o cenário monárquico sob o governo de D. Pedro II, que foi o mais longo (1840-1889) . Em teoria os liberais defendiam maior autonomia para as províncias, separação entre Igreja e o Estado, ampliação do direito de voto, diminuição das barreiras alfandegárias. Entretanto, os liberais quando participavam de algum governo, agiam de forma semelhante aos conservadores que acabaram se sobrepondo.

Já este grupo preponderante, os conservadores, trazia consigo os ideais de submissão ao Estado, o voto censitário, o respeito incontestável ao imperador, o escravismo, o poder centralizado, a inferioridade da mulher e dos filhos, a autoridade do proprietário, o desprezo pelos não brancos, a religião católica e a busca de títulos de nobreza.

Uma vez que a Constituição Monárquica estabelecia o voto censitário, ser Conservador ou Liberal era pertencer a uma elite masculina (não havia a participação política da mulher no processo partidário).

Buscou-se um clima de Conciliação Nacional entre esta elite, sob a influência dos cafeicultores do Sudeste, os grupos dominantes chegaram a um consenso. Decidiram que o Parlamentarismo seria a chave da harmonia que buscavam.

Primeiramente em virtude de as decisões políticas passarem a ser tomadas em acordo entre os grupos desta elite, que tinham que conservar e fazer concessões. E depois, a mudança de governo seria tranquila, pois mesmo sendo, o chanceler, Liberal ou Conservador, era sempre a mesma elite sob a tutela do Imperador.

No início do governo de D. Pedro II houve muita agitação envolvendo as duas facções políticas (Liberais e Conservadores). Por isto os dois partidos representados pelos deputados e pelo Senado vitalício, formando a Assembléia Geral do Império, alteraram a Constituição e instituíram a chave da conciliação, ou seja, estabeleceram a Monarquia Parlamentar (1847).

Este Parlamentarismo foi diferente do clássico que havia na Inglaterra.

Lá, conforme se sabe, o rei reina e o premiê é o chefe de governo. Em nosso país a Constituição de 1824 estabelecia o Poder Moderador que era exercido pelo Imperador. Com isto, ele reinava, governava e administrava.

Na Inglaterra, o eleitor votava no parlamento (deputados e senadores). O partido mais votado escolhia a quem seria o primeiro-ministro.

No Brasil, o imperador apontava o chanceler, chamado de Presidente do Conselho de Ministros. Uma vez que possuía poderes quase ilimitados (devido ao Poder Moderado, conforme vimos) e como os Liberais e conservadores optaram pela conciliação, D. Pedro II comandava a alternância entre as duas facções.

Resta dizer que no final do Segundo Reinado, por diversos motivos, uma nova facção política abalou este bipartidarismo. Surgiram os republicanos como afirmamos em parágrafos anteriores, quando apareceu a idéia de República no Brasil, os olhares se dirigiram para os Estados Unidos da América.

Nesta nação da América do Norte também dois partidos se tornaram notáveis: o Partido Republicano e o Partido Democrata.

O Partido Republicano dos Estados Unidos da América é considerado o mais conservador. Entretanto, neste país não se aplica o viés esquerdo-direito.

O presidente mais famoso eleito por este partido, no Século XIX, sem dúvida foi Abraham Lincoln (1861-65). O partido foi organizado em Ripon, Wisconsin em 28 de fevereiro de 1854 para combater à expansão da escravatura.

Os principais opositores do Partido Republicano são os políticos do Partido Democrata.

O Partido Republicano tem outros oponentes com nomes semelhantes e por isto quando mencionados confundem-se. Estes são o Partido Republicano Nacional de Henry Clay e o Partido Democrata-Republicano de Thomas Jefferson.

O partido é gerido pelo Comitê Nacional Republicano, que promove a plataforma política e coordena as atividades eleitorais e de angariação de fundos.

O Século XXI estreou com o governo deste partido na figura de George W. Bush (2001-2009) na presidência da grande potência.

Saído do Partido Democrata-Republicano, fundado por Thomas Jefferson, em 1793, formou-se o Partido Democrata (1836).

Este partido sofreu uma evolução, pois nasceu como partido conservador, uma vez que era a favor da escravidão e desponta no Século XX enquadrando-se em uma esquerda liberal. Ele é apoiado pelos trabalhadores, sindicatos, a maioria dos profissionais intelectuais, minorias étnicas e religiosas. Seu principal oponente, o Partido Republicano, é apoiado pela população branca-protestante, profissionais liberais e empreendedores.

No passado, teve como destaque na presidência os seguintes nomes: Andrew Jackson (1829-37), que o criou; Woodrow Wilson (1913-21), que propôs os seus famosos ‘14 Pontos’ para solucionar os problemas advindos com o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-18); Harry S. Truman (1945-53), que propôs a Doutrina Truman para a recuperação da Europa após a Segunda Guerra Mundial (1939-45); e John F. Kennedy (1961-63).

No atual século, este partido fez presidente um negro, o quê causou comoção internacional, Barak Obama.

Voltemos ao Brasil. Pela linha de raciocínio, nosso estudo se dirige para a República.

Como no início falávamos do período pós-Ditadura Militar (1964-85), é para atual República Brasileira que nossa atenção aponta, especificamente para o início de século.

O Século XXI surge no Brasil sob o governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), o FHC, como ficou conhecido, e prossegue com Luís Inácio Lula da Silva (2002-2010); Com isto o cenário político, nestes novos tempos, é liderado por dois partidos o PSDB e o PT.

O Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB) surgiu com políticos dissidentes do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Discordavam dos rumos que o partido original estava tomando na elaboração da Constituição de 1988. O grupo formador do PSDB era composto por Mário Covas, Fernando Henrique Cardoso, José Serra e Ciro Gomes. Eles defendiam o parlamentarismo na época e sua plataforma é o desenvolvimento do país com justiça social.

O Partido dos Trabalhadores (PT) foi fruto das greves e do movimento sindical dos anos de 1980, na região do ABC Paulista. Por isto representa uma grande força dos trabalhadores e das classes populares. O partido defende a reforma agrária e a justiça social.

Além destes dois partidos de liderança nacional, há mais de 20 outros partidos políticos. Esta enorme diversidade partidária significa uma grande abertura que o país vive. Se há este lado positivo, pergunta-se: o cidadão brasileiro compreende as propostas políticas de todas estas possibilidades? Até que ponto este enorme leque político aberto vai de encontro às necessidades populares e representam os anseios dos diversos Brasis que é o país, a nossa enorme Pólis.

Pelo transcorrer do atual século, o PSDB e o PT tem ganhado as preferências do eleitorado definindo-se como partidos majoritários. Que seus políticos saibam governar e tenham a lucidez de colocar o interesse público à frente de interesses particulares. E que o eleitorado tenha sabedoria e se aposse do raciocínio histórico para evitar transtornos políticos como foram em épocas totalitárias, quando somente um grupo governava fazendo a maioria se calar.

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Bibliografia:

1- ANDRADA, Bonifácio de - Ciência Política e seus aspectos atuais – Centro de Documentação e Informação. Coordenação de Publicações – Brasília, 2000.

2- ______________________ - Ciência Política, ciência do Poder. LTr Editora Ltda, São Paulo, SP, 1998.

3- BARRACIOUGH, Geoffrey - Introdução à História Contemporânea, Círculo do Livro.

4- BOBBIO, Norberto e outros – Dicionário de Política – Editora UNB, 9ª edição.

5- CANÊDO, Letícia Bicalho – A Revolução Industrial, discutindo a história – Editora da UNICAMP e Atual Editora, 1987.

6- HOBSBAWN, Eric – Era dos Extremos, O breve século XX, 1914-1991, Companhia das Letras, 1996.

7- ____________________ - A Era das Revoluções, 1789-1848, Paz e Terra, 200.

8- IGLESIAS, Francisco – Trajetória Política do Brasil – 1500-1964, Companhia das Letras, 1995.

9- MICELI, Paulo – As Revoluções Burguesas, discutindo a história – Atual Editora 1987.

10- PAIM, Antônio – Evolução Histórica do Liberalismo Editora Itatiaia Limitada, Belo Horizonte, 1987.

Nota:

1-O ANALFABETO POLÍTICO

"O pior analfabeto é o analfabeto político.

Ele não ouve, não fala, não participa dos acontecimentos políticos.

Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha,do aluguel, do sapato e do remédio dependem de decisões políticas.

O analfabeto político é tão burro, que se orgulha e estufa o peito, dizendo que odeia política.

Não sabe que da sua ignorância nasce a prostituta, o menor abandonado, o assaltante e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista,pilantra, o corrupto e o explorador das empresas nacionais e multinacionais".

Berthold Brecht, 1889 – 1956

LL, Bcena, 26/09/2010

TEXTO 03 - CADERNO: VOLTANDO PARA CASA

Leonardo Lisbôa
Enviado por Leonardo Lisbôa em 26/09/2010
Reeditado em 31/08/2012
Código do texto: T2522460
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