O fim da História

O FIM DA HISTÓRIA

A emergência do mercado

O que mais assusta a grande parcela lúcida da população é o exacerbado culto que os capitalistas neoliberais tributam ao mercado, autêntico deus Mámon de suas constantes celebrações. O Talmude fala nessa divindade, de origem fenícia, entidade da riqueza, a quem as pessoas, na ambição de ter mais, rendiam adoração, chegando ao ponto de sacrificar seus próprios filhos.

Dessa verdadeira adoração pelo mercado ressalta-se a condição de fâmulo fiel desempenhada pelo consumidor. A ideologia consumista, composta pelo comércio, pela indústria e pelo marketing, dá ênfasel ao consumidor, creditando-lhe um status de pessoa de destaque, inteligente, alguém que sabe o que quer. É o subliminar da pessoa que é manipulado. De um lado cria-se a dependência às compras, ao footing, às lojas e ao shopping. De outro, passam a imagem de que o consumidor compra porque é livre, esclarecido e tem posses. Enfim, liga-se a idéia do consumo ao sucesso.

Antes do desenvolvimento das questões axiológicas, um breve aposto para um esclarecimento técnico sobre alguns termos da área. Assim, vemos o mercado como um grupo de pessoas que querem comprar o que os outros produziram. Os vendedores fazem a intermediação entre a indústria e o público consumidor. Simplificando, poderíamos dizer que mercado é aquela relação estabelecida entre a oferta e a procura de bens, serviços ou capitais. Academicamente consta que mercado é um conjunto de instituições em que são realizadas transações comerciais, como feiras, lojas, bolsas de valores, de mercadorias, etc.

No mercado pode ocorrer o monopólio (único produtor determina toda a oferta. Ex.: a Petrobrás) e o oligopólio (pequeno número de vendedores que controla todo um mercado. Exemplo: as montadoras de carros). A ciência da Microeconomia estuda o funcionamento do mercado em suas minúcias. Já a Macroeconomia estuda os aspectos globais de uma economia, especialmente o seu nível geral de produção e renda, e as inter-relações entre os seus diferentes setores. Em paralelo, a Mercadologia (a Ciência do Marketing) contempla, através da análise de seus especialistas (os marqueteiros) a demanda do mercado e as maneiras de influenciar, o impulso de compra dos consumidores, através de estratégias, táticas e cria-ção de novos canais de distribuição.

Antes de ingressarmos no terreno do debate, é bom ainda que se revise outro mecanismo, conhecido como economia de mercado. Trata-se de um modelo, segundo o qual, todas as atividades e transações econômicas dependem da livre iniciativa das pessoas, para alcançar seus objetivos. Nesse contexto econômico, os indivíduos decidem, livremente, questões relativas a emprego, utilização de seus recursos.

A economia de mercado, com suas leis próprias, como doutrina teórica é algo fabuloso para manter exeqüíveis as relações comerciais e estimular a produção. O que vicia a instituição são os acordos, cartéis, dumping e outros desmazelos, todos voltados para o lucro selvagem. Isso, porém, não quer dizer que o mercado deva se transformar – como querem fazer – em uma ideologia, um autêntico “fim de história” (depois dele, nada mais tem importância), a perfeição total. A prática, vista a seguir, nos mostra que não é bem assim.

Consumidores extasiados pelo marketing

No grande contexto ideológico do mercado, a condição, precípua, para al-guém ser consumidor, é ter dinheiro para consumir. O mercado, assim, torna-se o paraíso para os consumidores. Curiosamente, tudo contribui para o consumo. Assim, os shoppings se transformam nos grandes templos dessa celebração, em cujo local se agregam estacionamento, cinemas, ambiente confortável e locais de alimentação. A primeira chamada não é para as compras, mas para visitar, conhecer, ir ao cinema, usufruir da “praça de alimentação”.

O consumo é uma conseqüência desse deslumbramento. Em certos casos, tem-se visto no corolário de alguma terapia psicológica, o conselho do analista, para que o jovem (também o adulto), para espairecer, freqüente um shopping. Tal atitude pode ajudar de um lado mas cria a dependência ao consumo, de outro. Com isso está criada e em fase de consolidação aquilo que se chama “geração shopping center”. Existem jovens, adolescentes, patricinhas ou mesmo adultos que só compram no shopping que, mesmo sendo mais caro, dá o impacto que deslumbra. Esse impacto foi planejado pelos marqueteiros, num gabinete.

Nesse aspecto, o psicológico atua como poderosa ferramenta que alavanca o consumo. O simples dizer “eu só compro no shopping tal...” dá um destaque especial ao jovem, fazendo parecer, junto à “turma” que ele(a) é moderno, livre e pertence ao grupo das pessoas bem situadas na vida. Muitos gostam de circular, na rua, na escola ou mesmo no ambiente de trabalho com a sacola do shopping, para que todos, ao vê-lo, conheçam sua “classe” e seu poder aquisitivo. É assim que ocorre.

Em função de uma demanda, excitada pela carência de afirmação de cada um, cada vez mais surgem novos produtos, ou mesmo aos antigos são atribuídos novos usos ou utilidades. O negócio é vender cada vez mais. Dentro desse objetivo, o mercado estabelece o que se chama de “ciclo de vida do produto”, que enseja que os produtos, primeiro não tenham muita durabilidade para serem comprados mais de uma vez, e depois, que entrem em caducidade e obsolescência, criando assim novas necessidades.

O marketing e a psicologia unidos descobriram que o número de bens é infe-rior ao desejo humano. As pessoas têm um desejo ilimitado, nunca saciado. A gen-te compra um carro, último tipo, agora, e em seguidas sai à rua e já deseja um outro que viu, mais bonito, mais moderno ou com algum componente a mais.

O desejo de consumo – cientificamente despertado pelos marqueteiros – cria sempre novas necessidades de produtos, existentes ou ainda por vir. A aceleração da tecnologia é tamanha, a sucessão de novos modelos e novas idéias é tanta, que grandes corporações atribuem atualidade de minutos a seus produtos.

Há anos atrás, repetia-se uma afirmação da Boeing, que dizia que, um avião novo ao deco-lar, já era obsoleto. Isso se usa hoje para carros, computadores e equipamentos de precisão. Uma pesquisa recente, feita no Japão, uma das mecas do consumo, concluiu que 76% dos produtos a serem consumidos em 2030 ainda não foram inven-tados.

Necessidades e supérfluo

Ao subordinar as necessidades sociais ao mercado, as corporações remodelam pessoas, famílias, a moral e a própria sociedade, a fim de que sirvam às necessidades sempre crescentes levantadas pelos donos do capital. Ainda não foi suficientemente estudada a forma como o capitalismo transformou, de uma hora para outra, a humanidade em um imenso mercado, onde todos se mantêm reféns das promoções, das ofertas e de tantas estratégias de vendas. Uma análise desse quilate pode servir de chave ao estudo da moderna história social. As técnicas de vendas mostram o que é necessário em pé de igualdade com o supérfluo.

Com a “idolatria do mercado”, surge o "abundancionismo", teoria defendida por J. K. Galbraith († 1989), onde o alto estágio de tecnologia, produção e distribu-ição de bens de consumo tornaria possível a superação das precárias condições econômicas em que vivem as camadas mais pobres da população.

Ressalta-se, no entanto, a necessidade de alteração de certas regras do regime capitalista, entre eles a insensibilidade quanto às desigualdades. Entretanto, no regime do “vale tudo” o que se vê é o patrão mais rico, o Estado mais voraz na tributação e o proletário cada vez mais miserável.

Como a necessidade é insaciável, ocorre um círculo vicioso, em cima do lucro, que acaba gerando uma mais-valia no salário do proletário. A empresa dá um lucro fabuloso e o dono, ao invés de melhorar as condições de seu público externo (consumidores), baixando os preços, por exemplo, não o faz. O lucro continua as-cendente.

Também o público interno (empregados) não usufrui da prosperidade da empresa. Seus salários continuam ínfimos. Na contra partida, usando o plus do preço que podia ser abaixado e não foi, do salário que devia ser mais digno e não é, o capitalista engorda sua conta bancária, investindo em paraísos fiscais e patrimônio.

Mercado: ideologia e fetiche

Assim que as coisas começam a melhorar, ele compra carro importado, cobertura com piscina, casa na praia e na serra, arruma uma amante, e viaja aos quatro cantos do mundo, aparecendo sorridente (igual à rainha Maria Antonieta, desdenhando do povo, antes de perder a cabeça na guilhotina).

Disso tudo se conclui – sem que se queira ser pessimista – que a lógica do mercado é elitista, cruel e, como tal, excludente. A idolatria do mercado é chamada por W. Benjamim (†1940) de “fetichização do consumo”, fiel à idéia do espetáculo, de Guy Debord.

A partir da ideologia de mercado, que privilegia apenas aquele que pode con-sumir, do outro lado do raciocínio começa a surgir uma nova classe social: os ex-cluídos. Em 1999, antes da "era Lula", o IBGE, através de uma pesquisa nacional, avaliou que 71% da população brasileira, por desemprego, subemprego ou indigência, está alijada do processo de consumo.

Mesmo assim se vê, amiúde, jovens das classes mais po-bres, passeando nos shoppings. Apenas passeando num templo no qual, pela condição social, eles não são benvindos. Garanto que num futuro próximo vão fazer aqui como vi fazerem no Canadá: quem entra no Eaton, de Toronto, por exemplo, e não compra nada, tem que pagar para sair.

Na década de 80 muito se falou na figura do oprimido, como alguém da classe média ou pobre, que trabalhava para consumir, e seu consumo ajudava a sustentar as elites. A classe média, que sempre foi um pára-choques entre a indignação dos miseráveis e a insensibilidade dos abastados, praticamente desapareceu. Essa classe que pagou a conta social, hoje está empobrecida, revoltada e sem me-lhores horizontes. O perigo é que as grandes convulsões da história sempre tiveram início a partir da indignação da classe média achatada.

O excluído é alguém jogado fora, como o bagaço da laranja que se chupou e, por inservível, foi atirado ao lixo. Infelizmente, é assim que as elites brasileiras ainda pensam e agem com relação às miríades de despossuídos que perambulam por nosso país. Eu chego a ficar arrepiado quando vejo, jovens, madames e dondocas, nas colunas sociais dos jornais, bem vestidas, de copo na mão, rindo. Eu costumo perguntar, elas riem de quê? Será que sabem quanto custa um quilo de feijão? Ou o preço de uma mensalidade escolar? Ou, talvez, o custo de um plano de saúde, para fugir aos caos do SUS? E geralmente concluo que elas riem de nós...

Pobreza não dá Ibope

O pouco interesse que o governo, as elites econômicas e intelectuais têm com relação aos miseráveis, está diretamente ligado à perversa política de exclusão. Para poderosos e abastados, considerando que o mercado tornou-se o centro nervoso, ideológico e regenerador de suas vidas, mercado tornou-se sinônimo de vida. Ora, só contribui para a vida (o mercado) quem pode consumir.

Logo, quem não consome (o empobrecido, o expropriado) em nada concorre para a vida, e assim, torna-se dispensável, excluível (esse neologismo é meu), sem importância se morre ou não. Vamos à prática?

Quem é que morre por falta de assistência nas filas do SUS? É a mulher do banqueiro? A filha do deputado? A amante do magistrado? Não! Essa calamidade chamada indevidamente de “previdência” devasta os mais miseráveis, aqueles que cometeram o crime (contra o mercado) de não poder pagar um plano de saúde! Devia chamar-se “providência”, onde as elites estão providenciando para que eles desapareçam mais depressa. O que na década de 80 era chamado de “capitalismo selvagem”, hoje pode obter a sinonímia simples de neoliberalismo.

As campanhas de limitação de natalidade visam evitar que nasçam filhos de pobres. É mais criança na rua a pedir “tio, me dá um troquinho!”. Os massacres e as chacinas só “contemplam” os filhos de pobre, de negros, nordestinos, à saída dos bailes funk. Nunca vi uma chacina à saída do baile das debs do Clube Comercial, ou uma matança às portas do Country.

Essa exclusão é fruto, basicamente das políticas neoliberais de nossos governos conservadores, sistemas financeiros, poderes da República e das elites. Todos criminosamente omissos.

A insegurança social que assusta a todos, deixa os ricos (garanti-dos por seguranças armados, carros blindados, moradias herméticas) menos expostos, enquanto que as classes menos favorecidas, enfrentam no dia-a-dia o problema de frente, totalmente desprotegidos.

O neoliberalismo previu um “fim da história” onde a opulência e a satisfação seriam as tônicas dominantes. Só esqueceram de dizer o preço desse desvario. Tal política mascara a realidade com meias verdades e um moralismo canalha. Como ideologia é parcial, mas pretende abarcar a posse absoluta da verdade (e do poder). É de grupos de interesses, mas quer fazer a cabeça de todos. Para tanto, usa a mídia como veículo de sua implantação colonialista. Antônio Gramsci afirmou que um sistema hegemônico, para que seja universal, deve fundar-se num forte simbolismo ético político e também numa economia socialmente orientada.

Os mecanismos da exclusão

Existe no Brasil neoliberal da década de 90 um grande esforço no sentido de acabar com a Justiça do Trabalho. Seria o ápice do fim da história... Afinal, ela é uma das poucas instâncias judiciárias em que o pobre, o miserável, o excluído é justiçado, tendo seus pleitos acolhidos. A classe empresarial, parte por culpa da própria incom-petência e parte pela voragem tributária, está caindo pelas tabelas. O desejo do empresário é lógico: ganhar mais e desembolsar menos.

De outro lado, os empregados anelam, primeiro a manutenção do emprego e, em segundo lugar, o recebimento de um salário que lhes permita condições mínimas de uma digna sobrevivência. Como a demanda por empregos - pelo menos até 2006 - era maior que a oferta, ocorria a lei de oferta-e-procura que, não raro, gerava uma situação de exploração, quase de semi-escravidão.

O ilícito começa pelos “estágios remunerados”, que não geram nenhum direito e – em alguns casos – não há nem remuneração, apenas a oportunidade de adquirir “experiência”. É um traço clássico de um imoral “fim-da-história”.

Em certas lojas, algumas moças, às vezes têm que se submeter as “exigências” do patrão ou do gerente, a fim de manter o emprego. Em muitas empresas, além dos salários baixos, o empregado tem que trabalhar mais horas que o regulamentar, não ganha hora-extra, insalubridade ou periculosidade e, em muitos casos, trabalha seis (ou sete) dias e ganha só cinco ticket-alimentação e vale transporte.

Como o empresário está com a faca e o queijo na mão, quem reclamar ou testemunhar esses descaminhos está automaticamente na rua. Lá por 1987, época da ilusão da “constituinte”, a sociedade encaminhou ao Congresso milhares de emendas-populares. Praticamente nenhuma delas teve acolhida na Carta Magna de 1988, chamada de “Constituição cidadã”.

Uma das proposituras populares daquele período foi a ampliação das condenações trabalhistas onde, por exploração de empregado, o patrão seria punido com multas, indenizações, reembolsos e até pena de cadeia. Na justificativa do projeto, foi dito que explorar o trabalhador gera indignação, revolta, fere a dignidade e acarreta perda de auto-estima. No antigo Israel histórico, diz a Torá que, explorar e negar salário digno era semelhante a matar, passível de castigos humanos e divinos. É desnecessário dizer que, pressionada por lobbies diversos, a emenda-popular nem saiu das comissões de análise.

Fiz menção, por diversas vezes, no decorrer desta conferência, da expressão “fim de história”, referindo-me a um marco final da história político-econômica da humanidade, pelo menos a ocidental, que talvez não tenha ficado suficientemente esclarecida. O primeiro a utilizar essa expressão, pelo menos com essa conotação, foi, provavel-mente, G. W. F. Hegel († 1831), ao afirmar que “... no final da história de nossa sociedade ocidental estaria a liberdade absoluta do indivíduo e da sociedade”. Que ilusão "seu" Hegel!

Quando uma sociedade decai

Todo o processo social, toda a civilização experimenta fases de início, equilíbrio e – posteriormente – de declínio ou decadência. Assim ocorreu com os sumérios, persas, gregos e romanos. A história vem em ondas, que se repetem, alternam e substituem. Cada período de civilização tem início, meio e fim.

O que o filósofo Hegel sonhou, em pleno século XIX, em sua dialética idealista, foi a decadência, natural e irreversível, da civiliza-ção ocidental, chamada judaico-cristã. Fiel às idéias do mestre, seu seguidor L. Feuerbach, superando as idéias de Marx e Engels, afirmou que o “fim da história” ocorreria com a ascensão do proletariado ao poder, levando à perfeição todo o mo-delo social. Passaríamos de uma fase – superada, segundo ele – para outra, plena, perfeita. Outra utopia!

Na década de 80, Leonardo Boff falou em um “fim de história” quando ocorresse a transformação da utopia em topia, ou seja, quando a sociedade se transformasse em algo perfeito, justo e igualitário, prenúncio, na terra, do Reino dos céus. O neologismo topia que Boff emprega em suas obras, é o inverso de utopia. Se, de um lado, utopia refere-se a algo idealizado porém irreal (fora de um vetor lógico), a topia é a realização de todas as esperanças oníricas do socialismo filosó-fico e romântico.

A utopia – afirma Boff – é como as estrelas. Nós nunca as tocamos, mas o que seria da noite se não existissem as estrelas? Vivemos na utopia mobilizadora de Jesus e de São Francisco.

Em 1989, no auge da instauração do neoliberalismo no mundo, surge o nipo-americano Fukuyama , um neoconservador, considerado à época o guru máximo dos neoliberais, afirmando que "o mercado é o climax da atividade social, política e econômica da sociedade humana, algo non plus ultra; depois dela não há mais nada".

Em todo o mundo, independente do bloco ideológico, o mercado, sob o signo do (neo) liberalismo ocidental, assume a homogeneização democrática do mundo. Como é que não se descobriu isto antes?

Nem tudo saiu como o script

Dez anos depois, o mesmo Fukuyama, quando sentiu o “tiro no pé”, declarou que a história não segue sempre os trilhos que se imagina. Era a primeira grande crise da globalização, em face de problemas nas bolsas da Ásia, desemprego nos Estados Unidos e quebradeira de empresas na Europa.

Em um entrevista, ele afirmou que o grande problema é que os Estados Unidos intervém excessivamente nos mercados internacionais, e, por conta disto, estes não são tão livres quanto se apregoou, funcionando a economia americana como um suprapoder regulador. O que não se queria, disse, em termos de Estado regulador, foi feito pelos Estados Unidos. A quebradeira americana de 2010 atesta essa realidade.

O fim da história, segundo Fukuyama, ocorreria com a derrocada do marxismo e conseqüente emergência do (novo) capitalismo como a única via. Para ele, o mercado – em uma de suas tantas premissas discutíveis – vence o socialismo. Quer dizer, descobrir o mercado como segredo, fim último e ponto de realização de todas as sociadades, livra a humanidade do que ele chama de “perigo vermelho”. No retruque, a revista New Republic questiona: “A história chegou ao fim? Falem disso na Bolívia ou na África Central!”.

Na verdade, a antiga proposta neoliberal de Fukuyama – típica do pensamento americano da “guerra fria” – uma década depois, diante os resultados controversos, começa a fazer água. Por sua vinculação ao Departamento de Estado Americano, fica-se com a dúvida, se o texto é convicção ou “matéria paga” do Departamento de Estado americano. O mercado, mais que econômico torna-se um estamento ideológico. A queda-livre do dólar atesta que “há algo de podre no Reino da Casa Branca”.

Mudando o discurso, os economistas e postulantes neoliberais já não falam de forma dogmática, mas pedem voto de confiança, pedem para acreditar, quase ter fé, na capacidade “salvífica” do mercado. Tanto assim que, preocupados com o rumo das coisas, um instituto de empresários jovens, do Rio Grande do Sul, realizou nos albores do novo século um seminário com o sintomático tema: “Onde vai nos levar a história?”.

Há uma evidência clara que o grande elefante branco da ideologia neoliberal globalizada está fora dos trilhos. E investe na direção de todos. Principalmente, contra os jovens empresários, alguns neófitos, parcamente capita-lizados, inexperientes e deslumbrados. O mercado, do jeito que foi desenhado pelos neoliberais, demonstrou-se um giugante com pés de vidro.

A “guerra do Golfo” (1990), tida como o ápice da tecnologia ocidental, ocorreu mais contra os cuidados reducionistas do Iraque (nacionalização do petróleo) do que contra a política externa de Saddan Hussein. Um país rico, populoso e estratégico como o Iraque, contrário à globalização, era uma pedra no sapato do capital. A improvável existência de armas químicas foi o pretexto para uma invasão covarde. O mesmo, guardadas as proporções, ocorre com relação a Cuba. Mais do que componentes ideológicos, as guerras têm motivações econômicas.

Como se viu, hoje passados tantos anos, em que o chamado neoliberalismo foi absorvido pelo social-capitalismo, e os efeitos da globalização atenuados pelos acordos comerciais, o propalado “fim da história”, fruto do desvario de Fukuyama e do macartismo norte-americano se revelou pífio. O que existe são etapas da história, que, normalmente se renovam e se alternam.

O autor é Doutor em Teologia Moral, Administrador de Empresas com Mestrado em Marketing. Professor universutário e Escritor. Escreveu mais de cem livros, entre ele “A crise da ética”, Ed. Vozes, 1998, 4ª edi-ção.