Fundadores de Salesópolis

Trazer Rota Dória ao debate histórico atual é importante na medida em que traz à luz fatos escondidos da nossa história oficial por interesses políticos. Pelos mesmos motivos, entretanto, devemos fazer, com muita atenção, uma leitura subliminar do que realmente possa ter acontecido, independente de nossas convicções políticas ou religiosas.

Pelo que consta nos registros oficiais, da Igreja Católica ou do Governo, temos uma Capela Curada no município desde 1813 e uma Igreja Matriz construída no mesmo local em substituição a ela – obviamente para dar mais destaque ao povoado. A alegação de que o Padre Dória teria que ser reconhecido como fundador apenas pelo assentamento da pedra triangular deste segundo templo não me parece justificável. O fato de ele ter construído a estrada muito menos, já que foi contratado por Alferes José Luiz de Carvalho, considerado documentalmente como um dos Defensores do Bem Público e, portanto, um dos responsáveis pelo desenvolvimento do povoado – motivo pelo qual, inclusive, acolheu Padre Dória e lhe forneceu dinheiro e mantimentos para execução da Obra para a qual fora designado.

O mérito que podemos e realmente devemos atribuir ao Padre Dória foi o de construir a estrada que lhe custou a vida e benzer a construção da Igreja Matriz. Sua passagem por aqui foi rápida e o que lhe aconteceu foi conseqüência da sua atitude ao contrariar interesses locais ou políticos da sua própria região - já que ele era deputado provincial paulista por São Sebastião e se projetara com a realização da obra solicitada pelos cidadãos do município onde era pároco e representante legislativo (*).

Creio que deveríamos valorizar, acima de tudo, a atuação permanente e constante daqueles que dedicaram suas vidas ao município (da mesma forma como Padre Dória fazia, ou viria a fazer se não tivesse morrido prematuramente, em São Sebastião). Sua passagem por aqui foi ocasional e impulsionado mais por interesses dos cidadãos do Porto do Litoral Norte do que nosso.

Defendo, portanto, que nossos fundadores continuem sendo aqueles identificados pelo historiador Antonio Paulino de Miranda Júnior.

Muitos dos verdadeiros atores da História ficam à margem dela por interesse ou desinteresse político.

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Documental:

Em 1832 o Padre Dória, já vereador, fez uma expedição para a Capela Curada de São José do Parahytinga (hoje Salesópolis), devido a esta ser um eixo entre o litoral norte, o Vale do Parahyba e São Paulo de Piratininga. Nesta primeira incursão o Pároco decidiu que a trilha não era tão boa e deveria ser gasto o triplo do que se imaginava.

Ao chegar a São José do Parahytinga foi muito bem acolhido pelo Alferes José Luiz de Carvalho que lhe forneceu mantimentos e dinheiro para que fizesse a estrada por um outro traçado. (alguma dúvida sobre quem foi o empreiteiro contratado (Padre Dória) e quem era de fato o responsável pela obra e, por conseguinte, o defensor dos interesses do nosso município? (Alferes José Luiz de Carvalho – segundo a história anterior, um dos fundadores de Salesópolis, que teria convencido Padre Dória a mudar o traçado da estrada e financiado parte dela).

Padre Dória então volta a São Sebastião e, dois meses depois, retorna pelo outro caminho que descreve como próprio para abertura da estrada, com rios limpos e transitáveis e então começa a logística da obra que tinha como objetivo o transporte, o desenvolvimento da agricultura, do comércio e das povoações.

Em 1833 Padre Dória começa a construir efetivamente a estrada...

...em 1836, Padre Dória instala as barreiras para cobrança da “CISA”...

A Assembléia Legislativa Provincial de São Paulo, pela Lei Nº 17, de

28 de fevereiro de 1.838, impressa, publicada e posta a correr pelo Governo da Província

em 1º de março de 1.838, erigiu a Capela Curada em Freguesia de São José do Paraitinga, marcando-se-lhe distrito. Para a oficial instalação do Distrito de São José do Paraitinga, os cidadãos: Domingos Freire de Almeida, Alferes José Luiz de Carvalho, Aleixo de Miranda e Francisco Gonçalves de Melo adquiriram de Antônio Martins de Macedo Aranha e outros, por escritura lavrada a folhas 32 a 34, do livro nº 1, do Cartório da Freguesia de São José do Paraitinga, em 14 de abril de 1.838, uma parte de terras, onde já se achava o povoado-sede da Freguesia, e doaram-na para a servidão pública, constando de tal título aquisitivo que as terras foram “vendidas aos compradores como Protetores do Bem Público”. Daí, os quatro adquirentes propiciarem a efetivação da existência da Freguesia e Distrito. (fica claro, aqui, quem foram, de fato, os verdadeiros fundadores)

Em 1838 Antônio Macedo Aranha, morador da Capela de São José do Parahytinga, doa uma parte de suas terras para “São José”, a fim de que nela fosse construída a igreja matriz da Capela Curada de São José do Parahytinga, capela essa que já existia em suas terras desde o começo do povoado (a pedra fundamental teria sido assentada, portanto, em 1813) enquanto pertencente a Mogi das Cruzes. No ano seguinte, em 09 de março de 1839, o Padre Manoel de Faria Dória assentou a “primeira pedra triangular fundamental” no alicerce da igreja matriz, tornando-se assim oficialmente o “fundador” da “Villa de São José do Parahitynga” pelos vereadores da época em 15 de julho de 1866. (esta era, na verdade, a segunda pedra fundamental e a afirmativa "tornando-se assim oficialmente o fundador da Vila de São José do Parahitynga" faz parte da tese defendida pelo vereador Raul Wuo em 26/05/1992, com base nos documentos assinados pelos vereadores da época. Vereadores estes, provavelmente, do Partido Liberal - dos padres e pessoas com idéias liberais, oposicionistas e adversários dos partidos conservadores (dos fazendeiros). Tudo indica, portanto, que a nomeação do padre Dória como fundador seria mais uma resposta ou provocação aos adversários políticos - entre eles, inclusive, o Padre Pinto (do partido Conservador **) que havia fechado a estrada.

(*) Muitos argumentos foram utilizados pelos adversários para tirar o Padre Dória da coordenação dos trabalhos durante vários anos, contudo o Pároco, sempre muito bem documentado, não se deixava expor perante o Presidente da Província (Governador do Estado) que nada tinha a criticá-lo ou a dizer-lhe, exceto cobrar respostas às questões que a ele formulava e acatar as atitudes do Padre. (os fazendeiros eram adversários do Padre Dória? Provavelmente não, pois forneceram até escravos para a construção da estrada. Os adversários aqui citados provavelmente eram os políticos da sua região - São Sebastião.)

Adendo:

...com as arruelas (no Brasão de armas de São Sebastião) fazendo referência ao padre Manuel de Faria Dória, nascido em São Sebastião, eleito deputado provincial paulista e responsável, entre outras coisas pela abertura, em 1832, da antiga “Estrada Dória”, ligando São Sebastião a São José do Paraitinga (hoje Salesópolis). http://www.jornalcanalaberto.com.br/index.php?pagina=materias&cod_editoria=26&cod_materia=3505

(**) A estrada que objetivava avivar o comércio entre o Porto de São Sebastião, o Vale do Paraíba e a Capital Bandeirante, foi oficializada em 1832, e é ligada à figura do Padre Manuel de Faria Dória, de São Sebastião, o responsável pela sua abertura oficial. No entanto, com a morte do Padre Dória, a estrada foi fechada em 1842 por ordem do Padre Pinto, seu sucessor e adversário político. Mesmo com o fechamento oficial a estrada continuou a ser usada com a finalidade do tráfico de negros, devido ao grande isolamento que o Litoral Norte Paulista tinha até então e também ao fato da Estrada Dória passar a ser uma estrada sub-utilizada. http://www.salesopolis.sp.gov.br/site/index.php?option=com_content&view=article&id=105:rotadoriagildabrasileiro&catid=18:noticiasdacidade&Itemid=35

As perguntas que fazemos, então, é:

1) quem era adversário político do Padre Dória;

2) a quem interessava a morte do Padre Dória;

3) por que os vereadores de São José do Paraitinga (provavelmente do Partido Liberal) prestaram homenagem a ele (após sua morte) nomeando-o como fundador do povoado, sabendo que os verdadeiros fundadores eram outros? Imagino que por interesses partidários e não históricos. Difícil acreditar nisso?