V de Vingança e as Mobilizações da Juventude do Século XXI

V de Vingança e as Mobilizações da Juventude do Século XXI

É, por essa ninguém esperava, muito menos os capitalistas: todo o bombardeio midiático, toda alienação, toda ideologia liberal, individualista e consumista e todos os meios em que isso tem se propagado também acabou permitindo uma série de fissuras, de rupturas, de reinterpretações, de apropriações. O fluxo enorme de informações e a divulgação e compartilhamento de tudo que é produzido, de todas as pessoas, celebridades e anônimas, criou uma situação como nunca antes: nunca as pessoas foram tão monitoradas, vigiadas, controladas quanto nos dias de hoje. As ditaduras do passado teriam inveja. Mas esse fluxo imenso de informações também cria uma situação em que não é possível filtrar tudo, nem censurar (de forma velada, é claro). O maior exemplo disso foi a apropriação feita pelos jovens nas manifestações desse ano de 2011, com a máscara do V nos atos e na internet. É simplesmente fantástico: um personagem dos gibis, que virou filme, isto é, que é uma criação artística que é parte da cultura pop, produzida pela indústria cultural, se tornou o símbolo dos novos lutadores. Além disso, o conteúdo altamente subversivo do personagem acabou fundamentando atitudes rebeldes, revolucionárias, radicais no mundo real. Para aqueles que esperavam que os jovens desse milênio ficassem presos na rede, com os olhos fixos na tela do monitor, que ficassem alheios ao mundo real, vivendo num mundo virtual ilusório, está aí o resultado: barreira nenhuma pode conter a força das águas, pode reprimir, represar por um tempo, mas cedo ou tarde a represa arrebenta e o rio invade. De nada adiantou condenar toda uma geração a ficar horas e horas de frente pra TV ou se relacionando com os outros mais pela internet do que pelo contato físico. O homem é um animal social por excelência. Nós somos seres naturais e sociais e toda essa conectividade que se vê nos dias de hoje é consequência disso. Mesmo quando solitários, estamos ligados a outras pessoas. A tendência a se ligar a grupos não pode ser detida. A cada dia surgem novas tribos, novos grupos, novas redes e essas tribos, grupos e redes começam a se encontrar. A globalização financeira e a dominação cultural imperialista começam a se voltar contra os seus criadores pelas mãos de suas vítimas. Essa é a globalização real. A globalização da Revolução Egípcia e da Praça Tahrir, dos Indignados e da Ocupação de Wall Street.

A Geração do Milênio, a Juventude do Egito, da Espanha, dos Estados Unidos e do Chile na vanguarda, na linha de frente, em luta em 2011, ressignificou os produtos da dominação cultural e ideológica neoliberal. Democracia. Uma palavra bonita. Mas que na boca dos capitalistas sempre significou democracia liberal, indireta, representativa e a serviço do capital financeiro. Por isso, os jovens querem Democracia Real. Não aceitam mais o discurso do fim da História, da morte do Socialismo e de que tudo que pode existir é o que está aí. Nós queremos mais. Yes, we can. But without you, Obama! Essa é a Vingança da juventude desempregada. Nunca houve uma geração de jovens com tamanha educação formal e tamanho nível de desemprego e falta de perspectivas. Mas é claro, prometeram-nos desde que éramos crianças que se estudássemos bastante teríamos um bom emprego. Daí então, fizemos curso técnico, curso de inglês, curso de espanhol, faculdade, pós-graduação, mestrado, doutorado, enchemos o nosso currículo para.. para nada! Essa é a realidade. Portanto, nenhum herói e nenhum símbolo mais apropriado para a juventude de hoje do que o V. Fomos educados pela mídia. Eles só não esperavam que aprendessemos tão bem. Fizeram tanta campanha contra as ditaduras stalinistas que quando tiveram que defender os seus próprios burocratas, não conseguiram. O governo estadunidense foi contra Kadafi, mas não foi contra Mubarak de cara. Precisou a resistência da Praça Tahrir e o apoio internacional de trabalhadores e jovens contrários aos regimes ditatoriais para que os EUA abandonassem os seus ditadores à sua própria sorte. O imperialismo mudou de cara, tirou de cena a figura triste de Bush, um presidente estúpido e sanguinário, e colocou no lugar Obama, eleito pela juventude, os mesmos jovens que agora ocupam as praças e as ruas dos Estados Unidos contra o governo, contra os banqueiros e o grande empresariado. Democratas e Republicanos, todos iguais: mantendo tropas no Iraque, atacando a Líbia, ameaçando o Irã e deixando em funcionamento Guantánamo. Representantes eleitos para governar contra o povo. O discurso do V era de que o poder devia ser do POVO e propõe explodir tudo (no filme ele explode o Parlamento) para restituir o poder ao povo, derrubando o regime e o governo totalitários/autoritários e é essa a máscara que cobre os rostos e ao mesmo tempo forja uma identidade e um programa. As ameaças de hackers ao Facebook, serviço de monitoramento dos gostos e dos pensamentos ("No que você está pensando?") de governos e de empresas, e a rejeição aos partidos que participam do poder e atuam por dentro da institucionalidade burguesa (mesmo que acabem com isso rejeitando todo tipo de partidos, organizações e lideranças muitas vezes, o que é um equívoco, tomando como exemplo o próprio Egito, onde os manifestantes da praça rechaçaram todas as direções tradicionais e corrompidas e seguiram sendo governados pelos militares e votando majoritariamente na Irmandade Muçulmana, que recentemente estabeleceu um acordo com os militares em nome das disputas das migalhas do poder pós-Mubarak. Conclusão lógica: num jogo alguém sempre ganha. Não adianta dizer: Não quero participar! Porque você vai ser arrastado e será dominado. É como a internet, embora os delírios de alguns sugiram que a internet é um espaço livre, uma mídia alternativa, que as redes sociais são a alternativa à grande mídia, no capitalismo tudo é apropriado e controlado. Também a internet pertence ao capital e está a seu serviço. Isso não nos impede de atuar nela, certo? De usá-la! É isso que se deve ser e fazer, deve-se ser um Cavalo de Tróia, um Vírus, destruir por dentro e por fora para construir (criar) algo verdadeiramente novo e livre!). Esse é um ambiente, a mistura, o clima da rebelião presente e futura.

As figuras políticas que inspiram os jovens não são mais Stálin, Fidel, Mao, todos velhos burocratas! Não, os jovens de hoje admiram Che Guevara, está aí em todas as camisas, e é um pouco ingênuo achar que as pessoas não conhecem minimamente aquilo que estão usando. Isso não quer dizer que sejam todos revolucionários, mas só de manifestar simpatias por um revolucionário, jovem como todos que estampam seu rosto nas blusas e fazem "propaganda" dele pelas ruas, já tem um significado importante. Nesse sentido, o capitalismo que se apropria de uma figura heróica do movimento para vender, também acaba servindo para que em momentos de crise e de rebelião o seu exemplo seja conhecido, mesmo que superficialmente (ao estilo Google!). Os jovens de hoje não crescem aprendendo que Trotsky era um traidor, agente da CIA, nem é esquecido ou negado o seu papel histórico. Pelo contrário, está aí, para quem quiser ver, em qualquer livro didático do ensino fundamental. O radicalismo da juventude que auta nas lutas nos dias de hoje leva quase que naturalmente ao guevarismo, ao trotskismo, ao anarquismo, pelo menos aqueles que não pretendem desde jovens já fazer uma carreira política (parece que hoje todo líder estudantil acha que vais er o Lindbergh e todo líder sindical acha que vai ser o Lula!). É claro que existe uma parcela importante da juventude atuando em ONG´s, mas também guarda a sua importância ter pessoas que talvez não militassem num partido ou num sindicato e, portanto, não militariam em lugar nenhum, atuando em causas humanitárias e ambientalistas. Vivemos num mundo de diversidade e de conexão e o fundamental é saber combinar forças e dirigir as baterias contra o inimigo comum: o explorador dos trabalhadores, o assassino fascista, o opressor machista, racista, homofóbico, antissemita, islamofóbico, o destruidor do meio ambiente! Essa é a juventude que ama o Che e seu voluntarismo e heroísmo e também ama o V e, portanto, a subversão. Um grande obrigado aos nossos pais pelas horas em frente da TV!