O PREFEITO HUMBERTO E O SINTRAP NA "BOCA DO POVO".

Por Francinaldo Morais ¹

Fui, por volta das 06h00, ao mercado central da minha cidade, Caxias-MA., comprar um tambaqui, desejado pela “patroa” na noite anterior. Após breve regateio, consegui um peixe de quilo e meio, na mão do “irmão” Geovane. Já estava me dirigindo para o boxe do meu amigo Fontenelle ( assim o chamava no Tiro de Guerra, quando “servimos” em 1984) para comprar coco babaçu, legumes e verduras, quando percebi que dois populares debatiam sobre o que se está chamando em Caxias de pagamentos de 14º e 15º salários, realizados pelo prefeito Humberto Coutinho, no final de 2011 e neste início de 2012, em favor dos educadores do município.

Um dos populares, que chamo aqui de “João”, dizia: __ Viu, como o prefeito Humberto além de pagar em dia ainda “deu” 14º e 15º para os professores, sem precisar de greve do sindicato! O outro popular, “Tomé”, retrucou: __Deixa de ser besta! Os professores trabalham em dia. Pagar em dia é obrigação e não favor! Se o sindicato não tivesse feito pressão, “teu” prefeito não teria realizado essa “graça”. O debate continuou com os dois populares apresentando suas visões opostas sobre as relações entre o prefeito Humberto e o SINTRAP. Eu tinha que correr, senão teria dificuldades em casa com a “patroa”, que esperava o tambaqui e os temperos.

Entregue a “encomenda” em casa, sentei-me nas “companhias” do educador-filósofo Dermerval Saviani (1944-) e do folósofo francês Jacques Rancière (1940-) para filosofarmos sobre aquele debate popular ocorrido no mercado central.

O educador-filósofo Saviani trata, na obra Educação: do senso comum a consciência filosófica, do processo de percepção da realidade pelo sujeito cognoscente. Para Saviani, a cultura formal precisa ser incorporada pelo povo através do processo ensino-aprendizagem. Uma das fragilidades verificadas nesse processo é a não radicalidade, ou seja, não considerar as causas mais profundas que permitem forjar e emergir os fenômenos sociais; outra, é a consideração destes, separadamente, isto é, não considerá-los relacionados e agindo uns sobre os outros. Quem analisa sem radicalidade, e de forma estanque, isolada, o faz de forma metafísica; aquele que age de forma diferente desta, opera dialeticamente.

O popular “João” não percebe conexões entre as diversas ações políticas e jurídicas do SINTRAP e os citados pagamentos. Não obstante, tais ações foram consideradas politicamente pelo prefeito, antes de decidir pelos pagamentos referidos. Sem essas ações sindicais, ou melhor, na ausência das suas possíveis conseqüências políticas negativas para sua administração, o político Humberto não precisaria fazer a tal “graça” referida por “Tomé”. O prefeito agiria sem nenhuma pressão contrária a sua gestão, em meio a um almejado consenso, ou seja, “um sono sem sonhos que deve engendrar a paz”, no dizer de Rancière. Sendo assim, não haveria política, considerando esta como “dissenso” que necessariamente a instala, conforme feliz construção teórica do filosofo francês (Vide, O Dissenso In Crise da Razão,1996).

Ao decidir pelos pagamentos dos ditos 14º e 15º salários, o que objetivou o prefeito de Caxias, junto àquela maioria popular que ainda não consegue perceber os fenômenos sociais radical e intrinsecamente relacionados? Que essa maioria popular forme e divulgue uma compreensão que anule a necessidade do SINTRAP e que apresente Humberto como um administrador honesto, bonzinho, atento às necessidades dos seus governados. Uma miragem igual aquela visão distorcida que se tem, após longa sede e fome no deserto africano.

A verdade, na sua inteireza, radicalidade e conexão -- e dita popularmente! -- é que: todo prefeito é igual a uma panela, sem pressão não faz nada!

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¹ Professor de História, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias-IHGC e acadêmico de Direito.

Francinaldo Morais
Enviado por Francinaldo Morais em 05/11/2013
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