A dialética e o materialismo histórico em Marx

A teoria de Marx se compõe de uma filosofia, o materialismo dialético, e uma teoria científica, o materialismo histórico, do qual tratamos um pouco em outro artigo.

Segundo os materialistas, a longa tradição idealista da história da filosofia culmina em Hegel, no século XIX, para quem é a própria razão que tece o real, assim a ideia não é uma criação subjetiva da pessoa, mas é a própria realidade, de onde tudo procede. Ao contrário disso, na visão materialista, a matéria é o dado primário, a fonte da consciência, que fica sendo um dado secundário, derivado, pois é reflexo da matéria.

O materialismo conforme a ideia de Marx é dialético e, segundo ele, difere do materialismo anterior que ele tem como mecanicista ou “vulgar”. Enquanto o materialismo mecanicista parte da construção de um mundo composto de coisas e de partículas materiais que se combinam de forma inerte, o materialismo dialético considera os fenômenos materiais como processos. Além disso, as pessoas não são uma conseqüência passiva da ação da matéria, mas podem reagir sobre aquilo que as determina. Ou seja, saber que somos determinados não leva a aceitarmos isso passivamente e tentar formular isso em princípios lógicos e imutáveis, mas é uma condição de liberdade, possibilitando nossa ação sobre o mundo, inclusive a revolução.

Nesse sentido, Marx se opõe a filosofia de Hegel, mas aproveita sua concepção de dialética. A dialética é a estrutura contraditória do real, que no seu movimento passa por três fases: a tese, a antítese e a síntese. Ou seja, a realidade se movimenta pelo antagonismo entre essas três fases.

Assim teremos que, num primeiro momento teremos a identidade que corresponderá à fase da tese; depois temos a contradição ou negação dessa identidade, ou tese, que gerará a sua antítese; por fim, tem-se a positividade ou negação da negação daquela tese inicial ou de sua antítese, que é a sua síntese.

Nesse pensamento a contradição não expressa aniquilamento, morte pura e simples, desaparecimento irremediável de algo, mas, antes, significa que a contradição faz com que o ser suprimido se transforme.

Por exemplo, tomemos o plantio de um grão de trigo: se enterramos o grão, ele morre (temos a negação do trigo); desaparecendo como grão para que a planta surja como espiga; produzido o grão, a planta morre. Ou seja, por meio disso, quer-se dizer que, ao invés de como se concebia na forma de materialismo anterior, no materialismo dialético nós temos que as transformações não são algo abstrato, desvinculadas de uma realidade, que consiste no conjunto das relações sociais. Mas são transformações reais e progressivas, que superam a si mesmas de forma dinâmica e contraditória, gerando novas possibilidades de atuação e de realidades.

Mas, além dessa contrariedade dinâmica do real, outra categoria importante para entendermos a dialética é a de totalidade, pela qual o todo predomina sobre as partes que o constituem. Isso quer dizer que todas as coisas estão em constante relação recíproca, e nenhum fenômeno da natureza ou do pensamento pode ser compreendido isoladamente fora dos fenômenos que o rodeiam. Os fatos pertencem a um todo dialético que faz parte de uma estrutura.

Podemos mesmos encontrar três leis na dialética conforme pensada por Marx. A primeira delas é a lei da passagem da quantidade á qualidade, onde o processo de transformação das coisas se dá por saltos, esses saltos são, porém, formados, antes, por alterações mínimas de quantidade que vão se acrescentando e provocam, em determinado momento, uma mudança qualitativa: o ser passa a ser outro. Dentro da história isso pode ser entendido da seguinte forma: as ações dos indivíduos vão se somando até o ponto de ruptura em que a velha ordem é substituída por uma nova ordem. Daí a diferença entre evolução e revolução, enquanto uma é quantitativa a outra é qualitativa.

A segunda lei que podemos encontrar é a lei da interpretação dos contrários na qual, segundo a dialética, a contradição é inerente á realidade das coisas, é a força geradora do seu movimento e da sua transformação. A contradição é a luta, o atrito, que surge entre os contrários que são, no entanto, inseparáveis por causa daquela relação recíproca de que falamos há pouco. Por estarem esses contrários em luta dá-se a geração do novo. Tomemos por exemplo o ovo. O ovo já tem em si, ou seja, lhe é inerente essa unidade de contrários, ou a sua identidade (tese, que é o ovo mesmo) é a sua negação (que é o continuar sendo ovo e ser preparado para alimentação ou o de se tornar um pinto).

Após essas leis temos a lei da negação da negação, que é o fato que da interação dessas forças contraditórias, em que uma nega a outra, derivamos um terceiro momento: a negação da negação, ou seja, a síntese, que é o surgimento de uma coisa nova.

Assim essas três fases: tese, antítese e síntese com suas leis, explicam o movimento do mundo e do pensamento.

O materialismo histórico nada mais será que a aplicação desse materialismo dialético ao campo da história. Ou seja, é a explicação da história por fatores materiais, ou seja, sociais, econômicos e técnicos, em suas mudanças constantes e não de forma estática e definitiva.

Daí para Marx, no lugar das ideias estão os fatos materiais; e no lugar dos heróis, a luta de classes. O que quer dizer que embora possamos compreender o ser humano pela consciência, pela linguagem, pela religião, o que o caracteriza, de forma fundamental, é a maneira pela qual reproduz suas condições de existência. Portanto, para Marx, a sociedade se estrutura em níveis. O primeiro nível é a infraestrutura, que constituí a base econômica e é determinante, segundo a concepção materialista. Esse nível engloba as nossas relações com a natureza no esforço de produzir nossa existência, também as relações das pessoas entre si, ou seja, as relações entre os que são proprietários, os que não o são, e os meios e objetos do trabalho.

O segundo nível é o da superestrutura, que é político-ideológico, é constituído pela estrutura jurídico-política representada pelo Estado e pelo direito. A exploração de classe no nível econômico repercute na relação de dominação política, pois o Estado e as leis estão a serviço da classe dominante.

Também é constituída pela estrutura ideológica que se refere às formas de consciência social, tais como a religião, as leis, a educação, a ciência etc. Também nesse caso a classe dominada se submete á ideologia, pois sua cultura vai refletir as ideias e valores da classe dominante.

Para entendermos como a infra estrutura determina a superestrutura, podemos comparar valores de dois diferentes períodos da história.

Na idade média a moral valorizava a coragem e a ociosidade da nobreza que se ocupava com a guerra, também valorizava a fidelidade, base do sistema de suserania e vassalagem; do ponto de vista do direito, em um mundo cuja riqueza era a posse de terras, o empréstimo a juros seria considerado ilegal e imoral. Já na Idade Moderna, com o surgimento da burguesia, o trabalho é que é valorizado, não a ociosidade; a legalização do sistema bancário, por sua vez, exige a revisão das restrições morais aos empréstimos. A religião protestante confirma os novos valores por meio da doutrina da predestinação, ao considerar o enriquecimento um sinal da escolha divina.

Então, levando-se em conta o exemplo acima, vemos que o que acontece na superestrutura (no caso, moral e direito) é determinado pelas alterações na infraestrutura decorrentes da passagem do sistema feudal para o capitalismo. Por isso é que Marx diz que para estudarmos a sociedade não se deve partir do que as pessoas dizem, imaginam ou pensam, mas sim da forma como produzem os bens materiais necessários a sua vida. Analisando o contato que as pessoas estabelecem com a natureza para transformá-la por meio do trabalho e as relações entre eles é que se descobre como se produzem a sua vida e as suas ideias.

Mas isso não é o fim de tudo, não podemos nos esquecer do caráter dialético de toda determinação que é o fato de que, ao tomarmos conhecimento das contradições nas quais estamos inseridos, podemos agir ativamente sobre aquilo que determina essas condições e sobre elas mesmas.

Thais Paloma
Enviado por Thais Paloma em 29/04/2014
Reeditado em 07/07/2019
Código do texto: T4787876
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