DO DISCURSO POLÍTICO...

O discurso político é, por excelência, o lugar de um jogo de máscaras.

Patrick Charaudeau

De maneira geral, usamos máscaras (saudáveis ou não). Suponho, entretanto, que nenhum segmento social representa mais, no que isso tem de pior, do que a classe política. Ora somos impedidos de ver aquilo revelador da coisa mascarada, ora o que vemos é reles imagem do velado. No fundo, temos, nas palavras de Charaudeau, um jogo de ser e parecer em que supostamente a pessoa não é enganada, pois reconhecer a máscara seria denunciar o simulacro.

Há um grau ainda mais gritante: trata-se do indivíduo cujo “brilho” é uma imutabilidade de essência, posto personagem e verdade serem exatamente a mesma coisa. Ou seja, o sujeito é a própria máscara, verdadeiro e falso, destarte, não se opõem. Os sentidos não ultrapassam as imagens adrede construídas. Assim, sua identidade será sempre um outro do qual nunca se tomará conhecimento, é uma patologia que vai ao túmulo.

Nos três casos, o não-dito constitui o nexo estruturante. Nos dois primeiros, somos capazes de arrancar as máscaras, o que se diz e o que não se diz, podemos mostrar as estratégias que nutrem os fingimentos, os simulacros, os embustes. São atores em ações enganosas que, não poucas vezes, não convencem, sequer persuadem.

O fato é que discursos políticos portam elementos que exigem dos recebedores cuidados críticos cada vez mais profundos. Neles, palavras e imagens tecem trilhas visando ao poder e os diversos sentidos, claro, hão de ser interpretados em seus contextos constitutivos. Precisamos, ensina Charaudeau, “tomar posição quanto às relações entre linguagem, ação, poder e verdade”. Há, nesse imbróglio, tentativas de arrastar o outro – forjando princípios de influências -, para o cumprimento de um desejo (o voto). Sem uma consciência dos efeitos embutidos nos silêncios, nas manipulações das máscaras, descambaremos para um vazio do desejável, em termos sociais, tomando lugar a politicalha e esta, na precisão “ruibarboseana”, é o envenenamento crônico dos povos negligentes e viciosos pela contaminação de parasitas inexoráveis.

Não há saída: toda política é lugar de ação. De modo que é imprescindível uma comunicação girando entre debates e convencimentos. Portanto, a Palavra é instrumento fundador. Nosso problema é que as coisas não são homogêneas, os interesses são múltiplos, as canalhices se metamorfoseiam e o público se entrecruza com as paixõezinhas rasteiras. Um caminho? Despertarmos o Olho da Sabedoria e avançarmos para além das aparências. Este olho, numa paráfrase nietzschiana, nos abre, com segurança, o universo do sentir, do ver, do ouvir, do suspeitar, do esperar e do sonhar coisas extraordinárias.