Um golpe contra a ditadura (do mercado): o Brasil pede passagem

Rio de Janeiro, 29 de outubro de 2014.

Um golpe contra a ditadura (do mercado): o Brasil pede passagem

Prezados amigos e amigas,

Ao que nos parece, existe um clima propício às discussões políticas neste momento. O texto base traz um balanço das principais correntes historiográficas que aborda com legitimidade os desdobramentos da conjuntura pós-golpe de 1964. De fato, conforme destacou o professor João Marcelo ao abordar um belo texto base “Golpes e Ditaduras na América Latina”, muitas respostas precisam ser dadas à sociedade em que pese as responsabilidades sobre o período em que diversas correntes ideológicas assumiram o risco de se colocarem frontalmente contra o regime ditatorial e de pagarem, não raramente com a própria vida, na defesa de seus ideais. Vivia-se um momento de intranquilidade e angústia, no Brasil e na América Latina.

Nesse sentido, cabe dirigir nossa atenção à rede de relações que projetaram o Brasil ao desfecho que encerrou um dos capítulos mais dramáticos da História recente do Brasil: a ditadura militar que, por 21 anos, silenciaram as nossas vozes e abalaram os alicerces das instituições nacionais, através de uma virulenta e agressiva ação contra os interesses dos que defendiam (e defendem!) o Estado de direito e as liberdades de expressão, opinião e de democracia nas relações sociais.

Aos fatos:

Conforme salientou A. Dreifuss, o complexo IPES/IBAD (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais / Instituto de Ação Democrática) montado por empresários de São Paulo e do Rio de Janeiro, vinculados aos interesses estadodinenses no Brasil, tratou de forjar toda uma atmosfera ideológica concorrente aos que advogavam, por princípio, as “causas populares” e os “comunismos” (fossem lá de quais matrizes e orientações estivessem filiadas). Para isso, patrocinava cursos de formação sobre ciência política e social, como forma de combater as pregações da Reformas de Base, tão em voga durante o período Goulart (Educacional, política, Agrária, etc). Desta forma, a grande imprensa, setores do empresariado, categorias profissionais, Igreja Católica, entre tantos outros segmentos, fizeram parte do esquema.

Também vieram observadores internacionais, que ao detectar o desmantelamento do bloco histórico “populista”, desenvolveram a estratégia de montar, deliberadamente, ações da burguesia nacional e estrangeira para conter a qualquer custo, o avanço de ideias que se contrapusessem a inserção norte-americana e seus consorciados na fundação de novo bloco de poder, apoiados na ideologia de fundação dos militares (ver. positivismo).

Não existem interpretações unívocas a respeito do ideário dos que interpretaram os principais fatos do período de chumbo. Ao contrário, cisões importantes e de significado impactaram ambiência da pesquisa historiográfica, e, por força de tais digressões teóricas, novos desafios batem à nossa porta, exigindo de maior compromisso com “a verdade” em suas nuances e idiossincrasias.

Por exemplo: Considerando os intelectuais orgânicos locais associados ao esquema (brasileiros, sobretudo do RJ e SP) não gozavam de inteira confiança do complexo IPES/IBAD, pelo menos isoladamente. Por isso alguns europeus e americanos também participaram. Da França o IPES trouxe a militante escritora de direita Suzane Labin, que proferiu conferências sobre as ”Táticas de infiltração comunista e a Guerra política”, para as mais variadas plateias em vários lugares do Rio e São Paulo, como a ADESG, a ESG, o Centro de Indústrias do Rio de Janeiro, o Sindicato dos Armadores, o Colégio Santo Inácio, O Teatro Municipal, O Colégio Makenzie, etc. Ou seja cooptação e o aliciamento promovido pela elite orgânica ligado à burguesia era um expediente que motivou os grupos de esquerda a articular ações correspondentes que demarcaram os campos e áreas de ação revolucionária, já que o golpe foi tramado e forjado com boa antecedência (1961, período da conspiração contra Goulart).

Passado o período exceção, fez-se necessária uma síntese dos acontecimentos. Muito importante destacar a enorme produção literária que nos possibilitou entender melhor as reais circunstâncias porque passaram os que vivenciaram (e militaram!) lado a lado, o mesmo em lados distintos, em que pesem a leitura que os diversos grupos de ativistas políticos fizeram daquele turbulento processo. Caso de Daniel Aarão Reis Filho e Jacob Gorender.

É preciso ainda desmistificar algumas lacunas que ainda persistem ainda nos dias atuais, a saber: Na obra Prisioneiros do Mito (2002), Jorge Ferreira tece comentários acerca da forma como os comunistas históricos (PCB) encaravam a realidade vivenciada e como tratavam os adversários políticos/ideológicos, dentro dos marcadores de suas respectivas orientações doutrinárias. Aqueles não comungassem do suas postulações, eram classificados como “traidores da causa”. Exemplo: “para os revolucionários brasileiros discípulos de Andrei Jdanov, ou o intelectual seguia o modelo exemplar de George Politzer ou, então, ele não era um intelectual consequente e digno de confiança”. (FERREIRA, 2002, p. 190).

Não pretendendo esgotar a complicada “engenharia política” que precisamos nos ater, gostaria de ressaltar que, pelo que estamos vendo, muito pouca coisa mudou daqueles tempos para cá. Haja vista a [histórica] resistência do Congresso Nacional em aprovar Reformas Substantivas na esfera pública, seja a Política, seja a Tributária, sejam as outras tantas que colocaria o Brasil entre os países já civilizados, sem no entanto se submeter ao “efeito demonstração” norte-americano.

Acabamos de eleger uma ex-guerrilheira para o maior posto de nossa República: Dilma Rousseff. Filiada ao trabalhismo brizolista, Dilma é hoje uma das mais importantes lideranças de hoje na América Latina, juntamente com Lula. Noutros tempos, por certo, tivera sido apontada como perigosa terrorista pelos responsáveis pela interrupção do que se convencionou denominar período populista, na visão de um escolado cientista político, ironicamente filiado ao Partido dos Trabalhadores e depois “cooptado” pela escola uspeana dos intelectuais fundadores do Partido Social Democrata Brasileiro, Francisco Weffort.

Complementando...

Quanto a Reforma Política, o vice-Presidente derrotado da chapa do PSDB nas últimas eleições (26/10/2014), o Senador por São Paulo Aloysio Nunes, manifestou-se contrário, em efusivo pronunciamento na Tribuna do Congresso Nacional, ao mesmo tempo em que atribui, tacitamente, ao escrutínio das redes sociais, o fracasso das urnas.

Já um outro intelectual, Emir Sader, em entrevista concedida à Band News, ontem (28/10/2014), afirmou que com a reeleição de Dilma Rousseff, a perspectiva de fortalecimento de uma economia SUL-SUL e uma interface cada vez maior com o BRIC’s, nos tornarão menos vulneráveis aos ataques especulativos dos mercados. Para ele “Ganhou a America Latina, que continuará a ter no Brasil um grande aliado. Ganhou o Sul do mundo, que poderá avançar nos acordos e nas conquistas dos BRICS para a construção de mundo multipolar. Ganhou o Brasil, que segue sua luta para se tornar um país justo, solidário e soberano”.

E nós, o que faremos para entrar na discussão? Apoiamos ou refutamos a proposta enviada ao CN pela presidente eleita? Deveríamos pregar maior empoderamento aos Conselhos, Organizações Sociais e entidades do Terceiro Setor como forma de promover a consulta popular? Plebiscito ou Referendo?

Defendo o plebiscito.

Abisai Leite – professor de História / SOMEC (Campus Campo Grande)

CIEP-075 (Jardim Cabuçu)

Abisai Israel
Enviado por Abisai Israel em 29/10/2014
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