Justiça dos Homens

O Ministério Público Federal protagonizou um espetáculo midiático ao acusar Lula de ser chefe de uma suposta "propinocracia". Na ausência de provas materiais, apelaram para um discurso moralista, servindo-se de recursos visuais de fácil assimilação para o "telespectador".

Mas que diabos foi aquele slide no qual todas as setas apontavam para o Lula? Queriam enxovalhá-lo apenas. Achei desnecessário, pois o ex-presidente já é cachorro morto.

Assisti à coletiva do procurador Deltan Dallagnol, mas não fiquei convencido. Pelo contrário, fiquei estarrecido. Segundo ele, Lula é o centro do esquema da corrupção, ou, nas palavras dele, o "elo comum e essencial que conecta executivos, funcionários públicos, políticos e agentes financeiros corruptos". Se for verdade que ele foi o grande operador disso tudo, me pergunto, como sobrou tempo para ele governar o país?

Lembram-se daquela cena do filme "Os Bons Companheiros" onde um mafioso cheio de olheiras contabiliza uma montanha de dinheiro sujo na calada da noite? Pois bem, essa é a imagem que eu tenho do Lula agora.

A despeito disso, os argumentos são críveis: a relação de Lula com donos das empreiteiras; o dinheiro enviado ao Instituto Lula pelas empresas denunciadas; as nomeações para diretoria da Petrobras, etc. Porém, carecem de substancialidade. E o mais expressivo dos argumentos, no qual todos os outros se apoiam, foi facilmente refutado pelo deputado Silvio Costa (PTdoB):

“Na interpretação dele, eu poderia dizer que Fernando Henrique Cardoso também foi chefe de quadrilha por todos os atos de corrupção que afloraram em seu governo"

Eu até compreendo a tese do Procurador, afinal, é quase impossível que o Lula não soubesse ou participasse daquele imenso esquema de corrupção. A meu ver, ele foi leniente. Mas não há evidências concretas, pelo menos até agora, que indiquem o seu papel como coordenador central desses esquemas. Ainda nem se provou que aqueles imóveis eram do Lula. E olha que tinha um quadro do "nove dedos" num deles.

É a inversão daquela ideia do Paul Valéry: "Seria preciso o gênio de Newton para ver que a Lua cai, embora toda gente saiba que ela não cai". Neste caso, todos nós vemos que a lua cai, mas não sabemos como explicar isso.

Antes de me acusarem de ser petista, lembrem-se que até o "pitbull da Veja", Reinaldo Azevedo, reconheceu que a coletiva foi um desastre. Agora leio no Globo que o procurador nunca disse a frase "não temos provas, mas temos convicção", tal como foi reproduzida pelas redes sociais. Na verdade trata-se de uma síntese. Ora, o Dostoiévski também não escreveu a famosa frase "se Deus está morto, então tudo é permitido". Mas sabemos que a ideia foi essa.

Eu não sou contra a Operação Lava Jato – aliás, a quem interessa ser contra o combate à corrupção senão aos corruptos? O que me incomoda é o uso político disso. E essa operação, a meu ver, tem uma motivação política. Querem caçar o Lula como se fosse um animal (embora ele não esteja muito longe disso). Acho que levaram a sério o titulo do livro do Mainardi “Lula é minha anta”.

E todo esse empenho no combate à corrupção não me parece tão evidente quando os crimes são anteriores a 2003 (segundo eles, juridicamente inviável) ou quando nomes estranhos ao petismo, como Aécio Neves, são citados por delatores. Parece-me que existem aí dois pesos duas medidas.

Estevão Júnior
Enviado por Estevão Júnior em 16/09/2016
Reeditado em 26/09/2016
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