A esquerda estava no poder?

Nacib Hetti

Não estava e nunca esteve. A salvo de um eventual comando esquerdista, a sociedade brasileira continua consolidada como uma democracia, com suas instituições políticas e econômicas bem definidas, como a liberdade de expressão e a economia de mercado. Durante os governos do PT sempre pairou no ar um receio de esquerdização do país, que poderia colocar em risco nossas instituições democráticas. Não aconteceu. Os presidentes eleitos, da esquerda virtual, já entraram convertidos nos queridinhos das grandes empreiteiras.

Na distribuição dos ministérios, sobraram para a pretensa esquerda apenas os cargos sem prestígio, sem visibilidade e sem verba. Para os mais espertos da base de sustentação, ficaram os cargos que têm e geram grana. Nos 13 anos de poder o PT cedeu o espaço para o fisiologismo, que navegou no populismo alienante, com 30 milhões de bolsistas na reserva do mercado eleitoral. Já o núcleo forte sempre teve um perfil comprometido com a banca, com o Ministério da Fazenda e o Banco Central nas mãos do capital privado. As liberdades democráticas, conquistadas a duras penas, foram preservadas. As tentativas de alguns bolivarianos, para controlar os meios de comunicação, não prosperaram.

A “extrema esquerda” ficou mais capitalista que o DEM, com o PC do B relatando o Código Florestal e adotando o modelo sugerido pelo agronegócio, contra a versão dos ambientalistas. O mesmo “comunista”, no Ministério dos Esportes, serviu para dar um ar de seriedade às relações do governo com a pior espécie de capitalista que existe, que é o cartola do futebol. A corrupção na Copa correu solta. O PT, de dogmático passou para programático e acabou pragmático. Antes seria impensável alguém dizer que o PT se transformaria em quadrilha. Hoje é dito na rua e nos melhores salões, sem qualquer reação indignada.

Para engambelar a esquerda romântica, o governo do PT “prestigiou” os países antiamericanos, como Venezuela, Equador, Bolívia, Cuba e Coréia do Norte, notórios desrespeitadores dos direitos humanos. Ela se contentou com os caraminguás, esperando o juízo final do capitalismo selvagem. Era estratégico não ferir as susceptibilidades dos ideólogos empedernidos. Por outro lado, para prestigiar o establishment, foi criado o Conselho Econômico e Social, como órgão consultivo do presidente. Quem estava lá?: Banqueiros, grandes corporações, chefes de cartéis, amigos do rei e alguns pelegos, de gravata e de macacão.

Os poucos esquerdistas nomeados para compor o governo foram coadjuvantes de um “déjà vu”. Foram meros serviçais nos atos onde as aparências ideológicas precisavam ser estrategicamente evidenciadas para o desavisado eleitor de esquerda. Com meia dúzia de exceções, o ministério petista foi uma salada ideologicamente amorfa, para satisfazer o estomago faminto dos partidos da base de sustentação. Se não fosse a corrupção, o governo “esquerdista” até que poderia ter sido uma boa.