“ E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: "Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez, e tu com ela, poeirinha da poeira!”
                                                                                                               Friedrich Nietzsche
                                                                                                                
Alguém já disse, se não me engano foi Jorge Santayana, que quem esquece o passado está condenado a repeti-lo. Quando me lembrei dessa frase imediatamente me veio á memória o estranho e insensato monólogo de Nietszche sobre a ideia do eterno retorno. Acho que nem o esquizofrênico pensador alemão, nem o chatonildo do Santayana, quando disseram isso, estavam pensando em uma eterna repetição de eventos, como se a História fosse uma roda de carroça girando eternamente no mesmo lugar, mostrando sempre o mesmo aro e os mesmos raios convergentes para o mesmo centro. Na verdade eles estavam apenas repetindo, cada um a seu modo, uma visão cabalista que diz que o universo é o mesmo em toda parte e tudo que acontece nele repercute eternamente no infinito cósmico. Quer dizer: cada evento só acontece uma vez.  Mas como o universo é como uma célula que se multiplica por um processo semelhante á mitose orgânica (cada célula subvidindo-se em duas), conclui-se que cada evento se repete infinitamente em cada estirão universal.  E o que estamos fazendo neste momento, continuaremos fazendo pela eternidade toda. 
Essa visão do universo sendo construído por um processo de mitose é muito intrigante e já foi objeto de pesquisas científicas. A principal delas foi feita pelo físico teórico Max Tegmark em 1997 (atualmente ele ensina física teórica no MIT - Instituto Tecnológico de Massachusetts). Baseando-se na teoria da multiplicidade de universos(cada célula, ou átomo que se divide é um universo em si mesmo e gera outros dois universos), proposta por Hugh Everett em 1957, ele pressupôs que uma partícula de energia (um feixe de fótons), a cada vez que é acionada, apresenta duas possibilidades de ocorrência, conforme o giro do seu spin (o movimento giratório dos fótons) esteja em sentido horário ou anti-horário. Cada possibilidade tem 50% de chance (matemática) de ocorrência. Mas cada ocorrência, uma vez efetivada, continua se repetindo eternamente, porque a cada vez que ela ocorre, sempre gera duas possibilidades possíveis. Assim, imagina-se um homem sentado em frente á uma arma apontada para sua cabeça. A arma pode disparar ou não. Se disparar e ele morrer, essa possibilidade se repetirá eternamente. A mesma coisa acontecerá se não disparar. O não disparo continuará a ocorrer eternamente, não importa quantas vezes o gatilho for acionado. Teoricamente, o homem poderá estar morto e vivo concomitantemente, e assim continuará pela eternidade toda. Assim, no mundo das realidades quânticas, a imortalidade, tanto quanto a morte, são fenômenos matematicamente possíveis e consentâneos, aos quais estamos igualmente sujeitos.
Esse experimento corrobora, pelo menos teoricamente, o mito do eterno retorno e o aborrecido axioma de Santayana. O eterno retorno e a eterna repetição dos erros passados. A única diferença entre os dois filósofos é que o espanhol (Santayana) nos oferece uma chance de fugir desse estranho carma. Basta se lembrar do passado para que a gente possa evitar a sua recorrência.
Ledo engano. A verdade, pelo menos em política, parece ser o oposto, pelo menos aqui no Brasil. O nosso cérebro se apega ao passado como corais nas pedras da praia. E assim, quanto mais nos lembramos do passado mais corremos o risco de repeti-lo. Paulo Maluf está aí para não nos deixar mentir sozinho. Lula também, já que foi eleito duas vezes e fez uma sucessora. E se tivesse eleição hoje era bem capaz de ganhar de novo. Por essa mesma visão se pode entender porque Renan Calheiros, Jader Barbalho, José Sarney, Edson Lobão, O casal Garotinho e até o Sérgio Cabral, que foi eleito duas vezes pelos cariocas, dominaram a cena política brasileira nas últimas décadas. ( O Pezão não será uma mitose do Sérgio Cabral?)
O povo brasileiro lembra o arquétipo da mulher do malandro que fazia sucesso nos sambas antigos: “Bate-me nego, que eu gosto de apanhar.” Ou então é o pesadelo nietzsiano do eterno retorno que está tão impregnado na mente inconsciente do nosso povo que ele já o assumiu como realidade inexorável, da qual não consegue se libertar.
É pena. Morto ou vivo eternamente, eu gostaria de poder viver um outro sonho. Um sonho no qual cada acontecimento trouxesse novas expectativas e novas experiências e não uma eterna repetição dos mesmos enganos.