PARE DE TOCAR TAMBOR PARA MALUCO DANÇAR

* Heráclito Ney Suiter

Em 2008, ao perceber os rumos que a política brasileira caminhava, produzi um texto com o título ‘Dividir para dominar’, na ocasião com a esquerda já dominando o espaço da educação no país, o panorama indicava este caminho sem volta, que fora aberto pelo governo do PSDB.

Uma década se passou e o sectarismo político teve seu caminho facilitado pelo uso das instituições de ensino como fomentadora da divisão de gênero e raça, não que estes temas não sejam assuntos a serem debatidos em sala de aula, mas com a devida vênia, isto deve ser conduzido em fase apropriada, na realidade, tema de cátedra e não de ensino primário, ginasial ou secundário, sendo que nesta última fase deve-se começar a sinalizar que temáticas complexas serão discutidas em fase do ensino superior, fase esta em que a capacidade de abstração do jovem está mais consolidada.

A divisão da sociedade em burguesia e proletariado já não é capaz de colocar em prática o domínio por meio da luta de classes, necessário se faz dividir mais, quando mais dividido, mais esparramado, mais difícil em aglutinar idéias e ideais. E, a partir daí, a mudança no comportamento da população, o fenômeno da infantilização, é um prato cheio.

Segundo o jornalista e filosofo alemão Schirrmacher [1], a infantilização da sociedade tem a forte influência do rápido envelhecimento da população no mundo. E vou mais além, pois aliado a esta tendência natural de comportamento social, a dinâmica do mercado, com sua política consumista e sempre alerta as tendências, por intermédio dos meios de comunicação - sua principal alavanca propulsora – como a grande fomentadora do status quo, agravou o quadro, é só observar as características dos produtos lançados e principalmente as mensagens de apelo publicitário.

Homens e mulheres (o ser humano) são “fins” em si mesmos, e não podem ser utilizados como “meios” de quem quer que seja. Todos têm o direito de lutar para atingir sua própria felicidade e não podem ser usados como ‘meios’ para a felicidade de determinados grupos políticos.

Conforme as lições do jusfilósofo britânico Oakeshott [2], são dois tipos de políticas (não só as políticas partidárias), a política do ceticismo e a política da fé (não se trata aqui de fé religiosa), a primeira é conservadora e a segunda alicerçada na crença da possibilidade de que se é capaz de criar um mundo melhor.

Segundo o professor inglês o ponto de curva (ele denomina Nêmesis) mais perigoso destes dois tipos de política é na cética a acomodação ou a inércia, e na política da fé a vaidade da certeza de que se tem a capacidade de transformar a realidade.

Outra influência do atual quadro societal em que nosso país se encontra, também tem a forte influência das chamadas mídias sociais, pois naturalmente são fomentadoras do populismo e da desconstrução das instituições, uma verdadeira destilaria do ódio.

A perversidade em separar o ser humano em grupos distintos e opostos, de um lado os ‘bons’ e de outro os ‘maus’ são alimentados pela tentação maniqueísta em transformar em ‘time dos exploradores’ X ‘time dos explorados’, um ponto de vista bastante perigoso, pois é uma divisão falsa.

Essa divisão é o que os historiadores Burke e Ornstein [3], denominam de corte-controle. Uma deformação ideológica perigosa porque tira das pessoas a capacidade de pensar racionalmente, é uma ferramenta inconsciente de dominação. Utilizar a ‘psicologia da torcida de futebol’ em política é desastre na certa.

Para compreensão do que venha a ser esta ‘psicologia da torcida de futebol’, desafio o amigo leitor sendo corintiano, convencer a um flamenguista a deixar de torcer pelo rubro-negro, ou vice versa.

Classe social justa é utopia. Dentro de todos os grupos humanos há pessoas boas e pessoas más. Dentro de todas as pessoas, moram os mesmos anjos e os mesmos demônios.

Analisando o cenário brasileiro e, pegando como exemplo as duas últimas eleições que ocorreram na Inglaterra e França, pode-se aprender bastante, devido a algumas semelhanças.

Na ilha, os jovens não foram para urnas para votar no plebiscito da retirada do país do Mercado Comum Europeu (Brexit), acreditavam que a proposta não seria aprovada, em seguida Teresa Mai (conservadores) perdeu a maioria do parlamento para Jeremy Corbyn (trabalhistas) captando a maioria dos votos dos jovens com propostas populistas, para suprir o ‘tiro no pé’ que deram com a abstenção no plebiscito.

Já no continente, os franceses tiveram mais sorte, enquanto engrossava a digladiação entre François Fillon (centro-direita) e Benoît Hamon (centro-esquerda), surgiu Emmanuel Macron com uma boa proposta e gestão de campanha moderna e venceu as eleições.

Neste momento que nos aproximamos das eleições (talvez a mais confusa da história do país devido à grande divisão dos partidos de centro para tentativa de manutenção do status quo), o eleitor brasileiro, mais tendente a política do ceticismo (gato escaldado tem medo de água fria) se aproximou do seu Nêmesis, o que é preocupante, pois as últimas eleições inglesas e francesas que utilizei como exemplo, são as duas opções do que pode ocorrer nas urnas no próximo domingo.

É necessário que o eleitorado brasileiro abra seus olhos e ‘parem de tocar tambor para maluco dançar’, se faz urgente uma análise aprofundada dos planos de governo apresentados pelos candidatos, e escolher aquele que realmente poderá fazer as mudanças necessárias que nosso país tem que passar, afinal de contas, política não é partida de futebol, a razão deve se sobrepor as emoções... nosso país não alcançará as devidas reformas estruturais necessárias com medidas simplórias e/ou populista.

[1] SCHIRRMACHER, Frank. Das Methusalem-Komplott: Die Menschheit altert in unvorstellbarem Ausmaß, Wir müssen das Problem unseres eigenen Alterns lösen, um das Problem der Welt zu lösen. Karl Blessing Verlag; Auflage: 6. Auflage, 2004. O filósofo e jornalista foi entrevistado pela revista VEJA, edição de 18 de agosto de 2004 (p.11).

[2] OAKESHOTT, Michael Joseph. The politics of faith and the politics of skepticism. New Haven: Yale University. EUA: 1996.

[3] BURKE, J. e ORNSTEIN, R..O Presente do Fazedor de Machados. Bertrand Brasil: RJ,1998. A obra é uma primorosa pesquisa antropológica, sociológica e histórica que fala sobre os ‘fazedores de machado’, homens que nos deram o mundo em troca de nossas mentes.

* Advogado, Jornalista e escritor. OAB/TO 7523; OAB/SC 51075; ABI 0151.